Emagrecimento saudável: quais os pilares e estratégias necessários para montar um planejamento? | Colunista

1. Introdução 

Para começarmos a falar sobre este tema, vamos conceituar o emagrecimento: é a diminuição ou eliminação do peso decorrente de gordura corporal, a partir do ato voluntário de um indivíduo (BARBANTI, 2011)

Então…Como calculamos dietas para emagrecimento? 

Costumo chamar de princípio básico o déficit calórico que nada mais é do que calcular uma dieta com restrição de calorias. Para minimizar perda de eletrólitos e massa magra e que não causa tanto estresse metabólico para o corpo, o déficit deve ser leve a moderado, sendo considerado nesta faixa uma restrição de 500 à 1000 Kcal (AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE, 1997) ou um valor energético total (VET), segundo a OMS, entre 20 e 25 Kcal/kg/dia (KRAUSE, 2018)

Dietas restritas demais, que fornecem menos do que 1200 Kcal/dia, aumentam a perda de massa magra, reduzem a taxa metabólica basal e são deficientes em nutrientes, podendo causar má nutrição, além de estar associada a episódios de excesso alimentar e recuperação do peso por serem insustentáveis a longo prazo e não levarem a criação de hábitos saudáveis (AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE, 1997; WILLHELM, 2014)

Visto que 1kg de gordura possui aproximadamente 7700 Kcal, considera-se uma perda de peso saudável entre 1 a 4 kg/mês de peso gordura, ou seja, vale frisar que o peso da balança reflete redução de água também, portanto, é comum a redução ser acima de 4kg, no primeiro mês, por redução da retenção hídrica causada pela inflamação corporal ou estoque de glicogênio (MACHADO, 2015).

Toda e qualquer dieta é composta por macro e micronutrientes, em que cada um deles apresenta uma função. A seguir, vamos conceituar os macronutrientes e abordar suas recomendações para adultos saudáveis de maneira geral (lembre-se que cada caso deverá ser avaliado individualmente):  

  1. Carboidratos: fornecem a maior parte da energia, com ingestão de 45 a 60% do VET. Pode ser armazenada no tecido adiposo – quando em excesso – e no tecido muscular, na forma de glicogênio – neste caso, cada molécula de carboidrato retém moléculas de água para ser estocada no músculo, dando impressão de tônus muscular. 

    Além disso, se divide em refinado – formado por açúcares simples ou uma dupla deles, como glicose, frutose, sacarose e lactose – e complexo – formado por cadeia mais longas -, consequentemente, a velocidade de absorção das duas formas é diferente – quanto mais complexa, mais demorada -, mas, ainda assim, é o nutriente absorvido de forma mais rápida. O metabolismo da glicose envolve a insulina. 
  1. Proteínas: correspondem a 15 a 20% do VET ou 0,8 a 1g/kg/dia e atuam no processo de crescimento e manutenção de todos os tecidos do corpo. 

    São formados por aminoácidos, dentre eles os essenciais – não produzidos pelo corpo, apenas ingeridos através da alimentação – e os não essenciais – produzidos pelo corpo, mas que também são consumidos – totalizando 20 tipos. 
  1. Gorduras: a recomendação varia de 20 a 30%, também possuem função energética, atuam na produção hormonal e são transportadores de vitaminas lipossolúveis. 

    A classificação divide as fontes de lipídeos em gordura insaturada – mono ou poli insaturada, que atua de forma mais benéfica, principalmente no controle ou manutenção do perfil de colesterol – e a saturada – envolvida com aumento da glicemia, triglicerídeos e colesterol LDL e, portanto, deve ser consumido com moderação.

2. Estratégias nutricionais mais utilizadas: 

Estudos apontam que a restrição calórica é a estratégia mais eficiente para perda de peso. Somada a isso, a distribuição de macronutrientes também pode influenciar, apesar de não ter o mecanismo elucidado de forma clara (ALMEIDA, 2009)

A divisão de macronutrientes é o que chamamos de estratégias nutricionais e, atualmente, as mais conhecidas são classificadas como: 

  • Low carb: estratégia que reduz a quantidade de carboidrato da dieta (abaixo de 40% do VET ou 130g/dia de carboidratos), principalmente os refinados. O objetivo é não estimular picos de glicemia, diminuindo a produção de insulina – hormônio que, quando alterado, favorece a lipogênese por alterar os hormônios leptina e grelina, responsáveis pela sensação de saciedade e fome, respectivamente. 

    Dessa forma, indivíduos com resistência à insulina, hiperinsulinemia e/ou hemoglobina glicada alta são os mais beneficiados. Além disso, estudos mostram que há mudanças no perfil lipídico, triglicérides, glicemia e perda de gordura visceral e subcutânea (GILBERTO, 2018) – vale frisar que a perda de peso maior inicial se dá pela depleção mais rápida do glicogênio muscular, ou seja, o indivíduo consegue desinchar mais rápido, não necessariamente perde mais gordura quando comparado à outras estratégias (AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICIN, 1997).

    Percebam que a qualidade do carboidrato importa (fibras reduzem a velocidade de absorção) e a quantidade permitida não necessariamente é uma redução tão brusca a ponto de cortar grupos alimentares como está sendo difundida e feita pela maioria das pessoas, por conta própria. Cortar leguminosas, cereais integrais e frutas não é o caminho indicado, visto que todos esses grupos alimentares são fontes de fibras, vitaminas e minerais – nutrientes essenciais para o bom funcionamento do organismo (KRAUSE, 2018). 

    Ainda, a estratégia pode ou não estar associada a um aumento do consumo de gorduras. Muitas vezes, tornar a dieta hiperproteica já garante o aporte calórico necessário, uma boa saciedade, previne a perda de massa muscular e as refeições seguem volumosas – o que muitas vezes não acontece com uma dieta rica em gordura (GILBERTO, 2018)

    Não costuma ser indicada em período de competição para atletas ou pessoas que tenham gasto energético alto e em desenvolvimento como grávidas, crianças e adolescentes, já que o carboidrato se comporta como fonte primordial de geração de energia (KRAUSE, 2018)
  • Cetogênica: estratégia parecida com a low carb: reduz carboidratos – só que de forma mais significativa, ficando no máximo com 20g/dia deste nutriente -, normoproteica e elevação do consumo de gorduras – pode chegar a 90% do VET-, mas atenção: fontes de gordura insaturada devem ser priorizadas, a exemplo do azeite, oleaginosas, gema de ovo, abacate, consumindo o mínimo possível de saturadas (bacon, manteiga, banha de porco, gordura de proteínas e laticínios em geral) (SAMPAIO, 2016), ou seja, o contrário do que vemos bastante na prática clínica quando pacientes decidem fazer dieta por conta própria. 

    Dentre os benefícios, há melhora do perfil lipídico (colesterol total e frações) e no perfil glicêmico (resistência à insulina, glicose em jejum) (ALMEIDA, 2009), pois a produção de energia ocorre pela oxidação hepática de ácidos graxos, tornando baixa a utilização de insulina – apenas o suficiente para evitar perda de massa magra e garantir saciedade. Em relação a perda de peso, há a perda rápida de glicogênio, como na low carb, e por manter níveis altos de corpos cetônicos (GOMES, 2016)

    Não costuma ser indicada para muitas pessoas pois há perda ou involução no treinamento (exercícios aeróbicos sofrem menos impacto) e o período de cetose pode causar mal-estar como enjoo e tontura. Por ser restrita, também pode desencadear episódios de exagero alimentar após o término da dieta (STRINGHINI, 2007).

    Vale frisar também, que as refeições não são tão volumosas, visto que 1g de gordura tem 9 Kcal, enquanto carboidrato e proteína possuem apenas 4Kcal/g. 
  • Mediterrânea: baseada no consumo de alimentos de origem vegetal (cereais integrais, leguminosas, frutas e hortaliças em geral), fontes de gorduras boas e/ou desnatados e redução de carne vermelha e aves diariamente. É uma estratégia caracterizada por ser anti-inflamatória e tem benefícios na prevenção e tratamento de doenças crônicas não transmissíveis (BERTOLANI, 2014).

    Como não se caracteriza restritiva, gosto de utilizar como estratégia inicial – os pacientes relatam melhora de inchaço e facilidade em seguir, o que gera confiança, empolgação e fidelização dos pacientes em consultório – ou como estratégia de manutenção do peso (fase final). 

    Apenas em algumas doenças neuropatológicas, como autismo e epilepsia, este tipo de dieta não é indicada – há estudos mostrando melhora da função cerebral com o uso de corpos cetônicos e melhora no desenvolvimento com a retirada do glúten e caseína (PEREIRA, 2010; KRAUSE, 2008).
  • Jejum intermitente: estratégia caracterizada por períodos sem alimentação com janela de alimentação, variando de acordo com o protocolo: 12/12h, 16h/8h, 20h/4h e 24/24h, respectivamente. O objetivo é potencializar a autofagia de células, sendo efetivo na prevenção ou conduta de doenças crônicas degenerativas.

    Em relação a perda de peso e composição corporal, não há diferenças significativas em relação a restrição calórica tradicional (RIBEIRO, 2020), portanto, costumo usar como dieta de transição para cetogênica, por exemplo, que demanda de um melhor funcionamento de células para oxidar gordura, mas ainda é necessário avaliar o perfil de cada paciente e sua rotina – alguns podem se sentir ansiosos e descompensar, outros podem se beneficiar e entender melhor as sensações de fome e saciedade já que na privação de alimentação não há produção insulinêmica e melhor controle de leptina e grelina (ASBRAN, 2019; AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICIN, 1997)

    Como a janela de alimentação é menor, contraindico para pessoas com gasto energético muito alto, como grávidas e crianças e adolescentes, pois as refeições ficam muito volumosas – dificultando a adesão – e para pessoas com transtornos alimentares – se privar por longos períodos pode desencadear novos episódios de compulsão alimentar ou recaídas em caso de anorexia e bulimia (ALVARENGA, 2015)

3. Então, como devo calcular o planejamento de uma dieta? 

Vou mostrar por aqui como eu costumo calcular: 

  1. Comece escolhendo que estratégia você vai aplicar com seu paciente, de acordo com a consulta: quais são as principais queixas? Como estão os exames bioquímicos? Qual perfil do seu paciente – já faz dieta, tem algum indício de transtorno alimentar? 
  2. A partir disto, calcule o Gasto Energético basal (TMB) e total (VET ou GET), através de fórmulas como a fórmula de bolso e as fornecidas pela OMS ( encontramos neste link http://www.cescage.edu.br/new/arquivos/Man_aten_amb.pdf ou em livros de nutrição), e depois, caso seja uma dieta para emagrecimento ou hipertrofia, calcule o déficit ou superávit calórico, respectivamente. 
  3. Agora é hora de distribuir os macronutrientes: comece pela proteína, calculando g/kg de peso. O restante do VET deve ser distribuído entre carboidrato e lipídio. 

    OBS: Para transformar as calorias em gramas e vice-versa, lembre-se: 1g carboidrato equivale a 4 Kcal, 1g de proteína equivale, também a 4 Kcal e 1g de lipídio equivale a 9 Kcal (KRAUSE, 2018)

Pronto! Agora é só escolher os alimentos e montar o cardápio. e lembre-se:  leve em consideração a adesão do paciente – às vezes precisamos fazer o que é possível no momento e não a “prescrição perfeita” pois de nada adianta ele não conseguir seguir e, neste caso, possivelmente, nem voltará para as próximas consultas por ter ficado insatisfeito e não ter visto nem uma mudança estética ou na qualidade de vida. 

Além disso, vale lembrar que as estratégias nutricionais são pontuais, ou seja, devem ser utilizadas por um tempo determinado – lembre-se que é um processo estressante e contra fisiológico – e devem ser alternadas (a cada 60 dias, por exemplo) para que o corpo não entre em termogênese adaptativa. 

Matérias relacionadas:

Referências: 

AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICIN. Programas adequados e inadequados para redução de peso. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, [S.L.], v. 3, n. 4, p. 125-130, dez. 1997. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1517-86921997000400008.

BARBANTI,V.J.Dicionário de educação física e esporte.3.ed.Barueri,SP: Manole, 2011.p. 480.

MACHADO, O.A.S. Emagrecer é fácil : Use a ciência a seu favor. São Paulo,SP: 2015.

WILLHELM, Fernanda Franz. Composição nutricional de dietas para emagrecimento publicadas em revistas científicas: comparação com as recomendações dietéticas atuais de macronutrientes. Nutrire, Porto Alegre, v. 2, n. 39, p. 179-186, ago. 2014. Disponível em: http://sban.cloudpainel.com.br/files/revistas_publicacoes/422.pdf. Acesso em: 14 jun. 2021.

MAHAN, L. K.; ESCOTT-STUMP, S. ; RAYMOND, J.L. Krause: Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 14ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018. 

GILBERTO, Samara Lígia Madruga Cavalcante. ESTRATÉGIA LOW CARB COMO FACILITADORA DO PROCESSO DE EMAGRECIMENTO: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA. Diálogos em Saúde, Cabedelo, v. 1, n. 1, p. 146-168, jan. 2018.

RIBEIRO, João Lucas da Costa et al. Jejum intermitente é melhor que simples restrição calórica? Uma revisão. Brazilian Journal Of Health Review, Curitiba, v. 4, n. 3, p. 9340-9343, jul. 2020. Disponível em: https://www.brazilianjournals.com/index.php/BJHR/article/view/13958/11671. Acesso em: 15 jun. 2021.

ASBRAN. PARECER TÉCNICO Nº 01/2019. Brasília: Associação Brasileira de Nutrição – Asbran, 2019. 3 p. Disponível em: https://www.asbran.org.br/storage/downloads/files/2019/08/parecer-jejum-intermitente-1567189454.pdf. Acesso em: 15 jun. 2021.

SAMPAIO, L. P. de B. Ketogenic diet for epilepsy treatment. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, São Paulo, v. 74, n. 10, p. 842-848, 2016.

Gomes, Laís Polyane Assis. Dieta cetogênica para o emagrecimento: uma revisão da literatura, Vitória de Santo Antão, 2016. 35 folhas.

STRINGHINI, Maria Luiza Ferreira, et al. Vantagens e desvantagens da dieta Atkins  no tratamento da obesidade. Salusvita, Bauru-SP, v. 26, n. 2, p. 257-268, 2007.

BERTOLANI, Karina Cabral. BENEFÍCIOS DA DIETA MEDITERRÂNEA. Revista Multidisciplinar da Saúde, Jundiaí, v. 10, n. 6, p. 01-18, 2014.

ALMEIDA, Jussara C. de. Revisão sistemática de dietas de emagrecimento: papel dos componentes dietéticos. Arquivo Brasileiro de Endocrinologia e Metab., Porto Alegre, v. 5, n. 53, p. 673-687, 2009.

NUTRIÇÃO, Faculdades Integradas dos Campos Gerais Colegiado do Curso de. MANUAL DE ATENDIMENTO AMBULATORIAL CLÍNICA DE NUTRIÇÃO. Manual para Atendimento clínico – ambulatorial. Ponta Grossa, 2014. p. 01-83. Disponível em: http://www.cescage.edu.br/new/arquivos/Man_aten_amb.pdf. Acesso em: 16 jun. 2021.

PEREIRA, Érica. Dieta cetogênica: como o uso de uma dieta pode interferir em mecanismos neuropatológicos. Revista de Ciências Médicas e Biológicas, Salvador, v. 1, n. 9, p. 78-82, maio 2010. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/1535/1/3510.pdf. Acesso em: 22 jul. 2021.

ALVARENGA, Marle et al. Atitude e comportamento alimentar – determinantes de escolhas é consumo. In: ALVARENGA, M. et al. Nutrição Comportamental. Barueri, SP: Manole, 2015.

Por Sanar

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