O avanço tecnológico no setor alimentício proporcionou o aumento da produção e do consumo de alimentos ultraprocessados, associados frequentemente ao investimento crescente de publicidades e marketing dos produtos alimentícios de forma a alcançar mais consumidores.
Paralelo a esta situação, há a busca de informações pelo novo perfil de consumidor, mais consciente sobre a relação de uma alimentação saudável com a saúde, o bem-estar e a longevidade, e geralmente busca praticidade, equilíbrio nutricional e boa qualidade sensorial.
A partir daí, os rótulos nutricionais surgem como um veículo de comunicação entre o produto e o consumidor, de forma a auxiliar os indivíduos sobre algumas informações referentes ao que os mesmos estão adquirindo e servem de apoio na decisão de compra e escolha dos alimentos.
Além disso, o rótulo é uma das estratégias implantada da Política Nacional de Alimentação e regulamentada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), por meio das RDC nº 39 e 40 (Tabela de Valores de Referência para Porções de Alimentos e Bebidas Embalados para Fins de Rotulagem Nutricional e Regulamento Técnico para Rotulagem Nutricional Obrigatória de Alimentos e Bebidas Embalados, respectivamente) para promoção, proteção da saúde e diminuir o índice de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT).
No entanto, há duas condições que podem ser obstáculos para tais finalidades: o desafio em ser mais claro na forma de apresentar os dados nos rótulos para que o consumidor não tenha dificuldade em interpretar as informações e a influência da publicidade e alegações nutricionais de produtos alimentícios.
Sabe-se que há vários fatores que podem influenciar nas escolhas alimentares, porém, este último tem forte impacto no comportamento alimentar e na decisão de compra dos consumidores, visto que frequentemente apresentam apelo ao consumo mediante publicidades enganosas e dados que muitas vezes causam confusão.
Algumas informações são complementares e possuem regulamento, como por exemplo “baixo teor”, “sem adição”, “não contém” “fortificado”. No entanto, caso as informações não condizerem de forma parcial ou total sobre aspectos relacionados ao alimento, o que pode levar o consumidor ao erro, não são regulamentadas e são consideradas alegações falsas.
Essas estratégias podem vir acompanhadas de uso de termos que geralmente vem destacados nas embalagens, tais como: cereal integral, fonte de nutriente específico, rico em vitaminas e minerais, entre outros, de forma que pode induzir que o produto é nutricionalmente melhor e mais saudável.
Além disso, as informações propagadas podem ser compreendidas de várias formas conforme a idade dos consumidores, considerando que as crianças e os jovens são mais vulneráveis aos conteúdos publicitários.
Em relação as crianças, elementos como formatos, cores, figuras e personagens nas embalagens dos produtos alimentícios podem fazer com que pareçam mais animados, palatáveis e até mesmo mais saudáveis. Quanto aos jovens, geralmente são cercados de informações voltadas as mudanças imediatas e por modismos, especialmente pela influência de publicidade em redes sociais.
Um estudo randomizado e controlado realizado com crianças de 2 a 6 anos mostra que expor um conteúdo publicitário por cerca de 10 a 30 segundos é o suficiente para influenciar na preferência alimentar e escolha de determinado produto alimentício.
Em vista disso, ter consciência das escolhas alimentares mais saudáveis é um direito da cidadania, sendo portanto, imprescindível cada vez mais ações em saúde que possam instruir a população enquanto consumidores. Uma estratégia inicial, pode ser por meio das orientações do Guia Alimentar para a População Brasileira, onde estabelece uma classificação dos alimentos de acordo com o grau de processamento, sendo recomendado a base da alimentação os alimentos in natura ou minimamente processados.
Os alimentos processados devem ser consumidos em menores quantidades e combinados com os in natura ou minimamente processados e os ultraprocessados devem ser evitados, sendo este último o que frequentemente trazem alegações nutricionais nas embalagens com forte apelo ao consumo.
As informações sobre alimentação divulgadas pela mídia devem ser frequentemente discutidas e regulamentadas, visto que sabe-se da influência do marketing na mudança de comportamento alimentar e do estilo de vida. Dessa forma, algumas das medidas que poderiam amenizar tal situação e estimular a busca por melhores escolhas alimentares podem ser no campo individual e coletivo e das políticas públicas, levando em consideração que não se trata apenas de responsabilidade individual, mas o contexto o qual o indivíduo está inserido.
A educação nutricional e alimentar precoce pode ser uma estratégia que promove a ampliação de discussões, valoriza o conhecimento e estimula o senso crítico, de forma a induzir a autonomia alimentar de indivíduos para melhores escolhas e hábitos de vida. O rótulo pode ser também um instrumento de educação alimentar.
No âmbito das políticas públicas, é fundamental a constante implementação de medidas de intervenção, baseados em dados científicos sem conflitos de interesse, que ainda são escassos na literatura, por meio de regulamentação da publicidade e rotulagem nutricional de alimentos ultraprocessados que são veiculadas em diversos meios de comunicação.
Assim como o apoio de órgãos, a exemplo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e os de defesa do consumidor para garantir no cumprimento da fidedignidade na transmissão das informações aos consumidores.
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Referências
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