Caminhos alternativos para prevenir e reverter a obesidade infantil | Colunista

Atualmente, os números relacionados à obesidade e sobrepeso tem aumentado gradativamente. Quando se fala em obesidade infantil o cenário não é diferente, de acordo com dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (VIGITEL, 2019), essa patologia acomete cerca de 9,38% das crianças brasileiras entre 5 e 10 anos, sendo que o sobrepeso nessa faixa etária representa 16,33% e a obesidade grave já se faz presente na vida de 5,22% das crianças.

Já com relação aos adolescentes, 9,53% apresentam a classificação de obesidade, 18% sobrepeso e, ainda, 3,98% se enquadram em obesidade grave. 

Quando se analisa esse cenário no contexto da atual pandemia em que o país vem enfrentando, é importante destacar que o isolamento social tem contribuído para agravos nutricionais como a obesidade infantil.

Esse fato pode ser explicado pela redução na busca por atividades que gastem mais energia, aliado à alimentação muitas vezes inadequada dessas crianças. É importante frisar que, em momentos de estresse, como o que vem sendo enfrentado, as pessoas tendem a se alimentar de forma modificada do habitual e isso não é diferente quando falamos no público infantil.

Assim, é possível que haja um aumento na quantidade consumida, bem como alterações na composição das refeições, o que está diretamente associado ao desenvolvimento de sobrepeso e obesidade.  

A obesidade é uma doença crônica não transmissível (DCNT), que possui como principal característica o acúmulo de gordura corporal e acomete indivíduos em todas as fases da vida. Além disso, as consequências dessa patologia na infância permeiam até a vida adulta, justificando assim, a importância de uma intervenção eficaz logo quando o problema surge, bem como ações que auxiliem na prevenção da doença.

Mas afinal, o que causa a obesidade infantil?

Sabe-se que durante a infância, as crianças estão mais suscetíveis ao ganho de peso, visto que nessa faixa etária fatores como alimentação inadequada, sedentarismo, genética e distúrbios psicológicos podem auxiliar nesse processo. Ademais, cabe destacar que além dos fatores condicionantes já citados, o alto consumo de alimentos ultraprocessados também tem uma grande influência nos casos de obesidade infantil. 

É possível observar que o consumo de alimentos ultraprocessados vem ocorrendo cada vez mais cedo. Em estudos realizados por Lopes e colaboradores (2020), foi possível notar que 60% das crianças com mais de um ano de idade residentes do Norte de Minas Gerais, consumiam doces e guloseimas e 40% tinham por hábito consumir biscoitos e salgadinhos. Esses dados corroboram com inúmeros estudos que apontam que há um grande consumo de alimentos classificados como ultraprocessados por crianças.

Em dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS, 2013), 60,8% das crianças menores de dois anos consumiam biscoitos, bolachas ou bolo em alguma de suas refeições e 32,3% bebiam refrigerante ou algum tipo de suco industrializado.

Com relação ao sedentarismo, de acordo com estudos realizados por Cureau e seus colaboradores (2016), tanto as crianças do sexo masculino, quanto as do sexo feminino realizavam atividade física em quantidades inferiores a 300 minutos semanais. Esse fato evidencia a estreita relação existente entre a inatividade física e o aparecimento da obesidade.

Em concordância à questão do sedentarismo, pode-se notar o aumento de tempo em que os pequenos passam em frente a meios eletrônicos como computadores, televisão e celular, diminuindo a prática de brincadeiras ao ar livre.

Consequências da obesidade infantil:

Como visto anteriormente, as consequências da obesidade podem persistir também na vida adulta. De acordo com alguns estudos, a chance de uma criança continuar obesa quando adulta é de 25% e essa estimativa tende aumentar quando a patologia ocorre na adolescência, chegando a cerca de 80% dos casos. 

Somado a isso, as principais comorbidades relacionadas à obesidade são as dislipidemias, a hipertensão arterial, diabetes, problemas cardiovasculares e, ainda, problemas psicológicos que podem estar presentes no quadro clínico da criança.

Dessa maneira, é possível observar a importância do controle da obesidade, afim de que seja possível manter e/ou reestabelecer o bem estar e a saúde dos indivíduos acometidos.

Formas de prevenção e tratamento da obesidade infantil:

A prevenção da obesidade infantil, irá envolver principalmente a mudança no estilo de vida dos indivíduos, levando em consideração aspectos importantes para que seja possível garantir e auxiliar no processo de educação nutricional.

Dentre tais aspectos, podemos destacar a adoção de hábitos de vida mais saudáveis como principal eixo norteador da prevenção da obesidade. Mas quais hábitos devem ser adotados?

  • Alimentação adequada e saudável: manter uma alimentação adequada a partir da busca por alimentos de qualidade e um menor consumo de industrializados como ultraprocessados; uma importante forma de se manter atualizado quanto a meios de uma alimentação saudável, é o Guia Alimentar, tanto sua versão voltada para a população em geral, quanto a específica para crianças menores de dois anos, que pode ser utilizada pelos pais e/ou cuidadores na busca por conhecimento sobre que alimentos disponibilizar aos pequenos;
  • Atividade física: praticar atividade física regularmente e sempre que possível e de acordo com as recomendações de um profissional adequado;
  • Brincadeiras ao ar livre: no caso das crianças é importante incentivar que sejam realizadas brincadeiras ao ar livre e diminuir o tempo em frente a televisão e meios eletrônicos.
  • Programar a alimentação: tirar um tempo para considerar as necessidades alimentares é de extrema importância na busca por um hábito alimentar mais saudável. Sendo assim, é recomendado que sejam analisadas as possibilidades de cada indivíduo, buscando o planejamento das refeições e das compras semanais, avaliando a alimentação conjunta dos pais e filhos; 
  • Comer com atenção: ter atenção durante o processo da alimentação ajuda a reconhecer quando estamos saciados, bem como na escolha do que estamos ingerindo, auxiliando, assim, em escolhas mais saudáveis; uma sugestão de leitura para esse tema, é a apostila desenvolvida pela Universidade Federal de Santa Catarina, onde no capítulo 2 e 3 há diversas informações sobre comportamento alimentar e o comer com atenção plena. Esse material pode ser utilizado para que profissionais da saúde e até mesmo indivíduos interessados no assunto obtenham mais conhecimento sobre essa perspectiva.

    A apostila está disponível a partir do link: https://ares.unasus.gov.br/acervo/html/ARES/14888/1/Apostila_Aten%C3%A7%C3%A3oPlenaNutri%C3%A7%C3%A3o_N%C3%BAcleo%20Telessa%C3%BAde%20SC%20UFSC.pdf 
  • Ações de educação nutricional: a partir do desenvolvimento de ações de educação nutricional, é possível mostrar formas e meios de se atingir um modo alimentar mais saudável e, ainda, expor possibilidades de que as crianças conheçam o que estão consumindo, garantindo autonomia nas escolhas e respeito pelas preferências, cultura e aspectos econômicos de tais indivíduos; assim, ações lúdicas podem ser utilizadas com o intuito de ensinar às crianças a importância de se alimentar corretamente;

    Existem alguns matérias disponíveis que podem ser utilizadas e/ou adaptados para se ter como base. Esses materiais podem ser acessados a partir dos links abaixo:

    O Guia Alimentar para Crianças Brasileiras menores de 2 anos: http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_da_crianca_2019.pdf

    As sugestões de atividades de educação nutricional da Secretário do Estado da Saúde, Governo de Goiás: http://www.sgc.goias.gov.br/upload/arquivos/2015-09/cartilha-de-atividades-de-ean.pdf 

    Caderno de atividades para a promoção da alimentação adequada e saudável:

    http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/promocao_alimentacao_saudavel_ensino_fundamental_II.pdf 
  • Ajuda profissional: quando a criança já apresenta obesidade, é importante que os pais ou responsáveis busquem auxílio de um profissional adequado, visando encontrar a melhor estratégia para reverter a patologia. É importante destacar que, o tratamento deve ser multidisciplinar, ou seja, deve contar com a participação de médicos, psicólogos, nutricionistas e educador físico, afim de apoiar e auxiliar a criança em cada passo e, ainda, colaborar com uma rede de apoio entre pais e filhos;
  • A visão dos pais e responsáveis no contexto da obesidade infantil: a forma como os pais ou responsáveis apresentam os alimentos às crianças é de tamanha importância para que tal apresentação seja realizada de forma adequada. De acordo com dados da pesquisa do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC, 2019), 45% dos pais ou responsáveis não possuem como hábito analisar o rótulo dos alimentos antes compra-los, sendo que os principais lanches fornecidos às crianças são biscoitos, salgadinhos, sucos industrializados, achocolatados e iogurtes ultraprocessados.

    Nesse sentindo, é importante voltar a atenção também para a educação nutricional dos familiares, incentivando a leitura dos rótulos e utilização de lanches mais saudáveis como frutas por exemplo. Cabe, ainda, aos pais, que incentivem seus filhos a praticar atividades e brincadeiras que demandem mais gasto energético e diminuam o tempo em que os pequenos passam em frente às telas, o que irá auxiliar positivamente na saúde e bem estar dos mesmos;
  • Programas e políticas públicas: existem, ainda, as políticas públicas que auxiliam na busca por uma alimentação adequada e saudável. Dessa forma, como método de minimização do problema, destaca-se a criação da Promoção da Alimentação Adequada e Saudável (PAAS) que é um apoio fundamental à garantia da Segurança Alimentar e Nutricional, garantindo uma alimentação mais adequada e sustentável.

    Há, ainda, a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) que visa ações relacionadas ao acesso a alimentos em quantidade e qualidade adequadas, e o monitoramento da situação nutricional da população beneficiada. E o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que também é uma ferramenta essencial na busca pela garantia da saúde das crianças, visto que passam boa parte do tempo no ambiente escolar; essas políticas públicas são extremamente relevantes e importantes para a garantia da efetividade dos direitos à uma alimentação adequada e saudável e precisam estar sempre de acordo com a atual situação da sociedade para que sejam atendidas às necessidades de cada um;

É possível observar, portanto, que manter um acompanhamento nutricional adequado desde cedo ajuda a garantir benefícios tanto a curto, quanto a longo prazo. É necessário que desde a alimentação complementar, logo após os 6 meses de vida, as refeições sejam feitas de maneira adequada e saudável afim de instigar o gosto dos pequenos a conhecer novos alimentos. Além disso, é notória a importância de políticas públicas e ações que valorizem a educação nutricional e o fomento ao Direito Humano a Alimentação Adequada, garantindo o desenvolvimento físico e biopsicossocial das crianças. 

Ademais, para o enfrentamento desse cenário, deve-se buscar uma alternativa multidisciplinar que envolva, além do ato alimentar, as variáveis que que cercam cada indivíduo como suas preferências, cultura, condições socioeconômicas e hábitos de vida.

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Referências:

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Por Sanar

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