Como realizar o manejo nutricional da intolerância a lactose | Colunista

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A lactose conhecida como o açúcar do leite, é um dissacarídeo e a sua digestão é realizada na presença de uma enzima produzida no intestino delgado chamada β-galactosidase ou lactase, que realiza a hidrólise da lactose formando dois monossacarídeos, a galactose e a glicose, que são absorvidos ativamente no intestino delgado.

Alguns indivíduos apresentam redução da capacidade de hidrolisar a lactose devido a diminuição desta enzima na borda em escova da mucosa do intestino delgado, esta condição é denominada Intolerância à lactose.

De acordo com Arroyo (2010) e Associação Nacional de Atenção ao Diabetes (2020) aproximadamente 70% da população mundial e 40% da população brasileira apresenta intolerância à lactose primária.

A atividade da enzima lactase é variável, sendo mais alta no período neonato e de lactância, com declínio progressivo durante infância e adolescência, com taxas de absorção menor com o avançar da idade. 

É de suma importância que a intolerância à lactose seja diagnosticada e tratada adequadamente para evitar consequências no metabolismo do indivíduo, como redução da densidade mineral óssea, que pode gerar predisposição à osteopenia e osteoporose.

No tratamento nutricional é comum a adoção de uma dieta com exclusão da ingestão de leite e seus derivados com o objetivo de diminuir os sintomas apresentados, entretanto estes produtos tem grande valor nutricional, com composição rica em proteínas, vitaminas e minerais, não sendo indicado a exclusão total da lactose na dieta, mas optar por um manejo nutricional que favoreça o consumo e ingestão de laticínios, com o devido controle das alterações gastrintestinais.

SINTOMAS GASTRINTESTINAIS

Na ausência da enzima lactase, a lactose não absorvida se acumula e se torna fonte de energia para os microrganismos do colón e é fermentada levando a formação de ácido láctico, gás hidrogênio, metano, dióxido de carbono, causando manifestações clínicas gastrointestinais, como dor e distensão abdominal, diarreia e flatulência, desconforto abdominal, náusea, vômito e constipação, além da produção de ácido acético, propiônico e butírico que acidificam o pH do meio.

Estes sintomas se manifestam, de modo geral, de 30 minutos a 2 horas após a ingestão de alimentos que contêm lactose.

A quantidade de lactose ingerida pode ocasionar diferentes sintomas de pessoa para pessoa, por dependerem da porção de lactose consumida, o grau de deficiência de lactase e a forma de alimento ingerido.

CLASSIFICAÇÃO DA INTOLERÂNCIA À GLICOSE

A deficiência de lactase pode ser classificada em três categorias: 

-Primária: é a perda progressiva da capacidade de produzir lactase parcial ou total, que se inicia na infância ou em diferentes idades, sendo esta a categoria mais prevalente.

-Secundária: é resultante de lesões causadas na mucosa intestinal, seja por radiação ou medicamentos para o tratamento do câncer, doenças inflamatórias intestinais, doença celíaca entre outras. Com a cura das lesões a atividade da lactase retorna ao normal.

-Congênita: é rara e hereditária, herança autossômica recessiva, e se manifesta em recém-nascidos, a quantidade de lactase é muito baixa ou ausente e é uma condição permanente por toda a vida. 

DIAGNÓSTICO DA INTOLERÂNCIA À GLICOSE

O diagnóstico da Intolerância à lactose é clinico, pela sintomatologia e a descrição da relação com a ingesta de lactose, sendo confirmado por meio de alguns exames:

Biópsia jejunal: neste exame uma amostra do duodeno é incubada com lactose em uma placa de testes, sendo um diagnóstico de fácil interpretação visual.

Testes de acidez fecal: no exame de fezes é utilizada a porção líquida das fezes recém emitidas e separada da urina, para mensuração da medida de pH.

Curva de Intolerância à lactose:  neste exame são realizadas dosagens seriadas do nível de glicose em jejum, 30 e 60 minutos após receber uma sobrecarga oral de lactose. O aumento da glicemia menor de 20 mg/dl sugere má digestão de lactose.

Hidrogênio expirado: considerado padrão ouro, é baseado na produção de hidrogênio através da lactose não absorvida pela flora intestinal, parte desse hidrogênio é eliminada pelos pulmões e pode ser detectado no ar expirado.

Testes genéticos: são utilizados mediante técnicas de biologia molecular, apresentam resultados consideráveis, principalmente pelas descobertas de polimorfismos relacionados à intolerância á lactose

MANEJO NUTRICIONAL DA INTOLERÂNCIA À LACTOSE

O manejo nutricional em indivíduos com intolerância à lactose pode ser realizado com o uso de diferentes estratégias, que serão apresentadas a seguir.

• DIMINUIÇÃO NO CONSUMO DE ALIMENTOS LÁCTEOS

No tratamento da intolerância à lactose recomenda-se a redução da ingestão de lactose em vez de sua eliminação completa da dieta. A dosagem de 12g de lactose geralmente é bem tolerada, sem causar sintomas ou com a presença de manifestações clínicas mínimas na maioria dos portadores adolescentes e adultos.

A tabela a seguir demonstra o teor de lactose de leites e alguns produtos lácteos.

Para garantir a densidade mineral óssea outras fontes alimentares de cálcio podem ser incluídas na alimentação, como por exemplo sardinha enlatada, amêndoas, brócolis, couve flor, figos frescos e secos, tofu processado com sal de cálcio e folha de beterraba.

Alguns laticínios como iogurtes e coalhadas, e alguns queijos seriam opção para o consumo de intolerantes à lactose. 

Os iogurtes e coalhadas são fermentados no processo de fabricação e por isso apresentam uma redução de 25 a 50% do teor de lactose na composição e os queijos maturados como brick, brie, camembert, cheddar, reino, emental, gorgonzola, parmesão, prato, provolone, roquefort e suíço contém apenas traços de lactose, sendo bem tolerados.

• CONSUMO DE LEITE COM BAIXO TEOR OU SEM LACTOSE

A oferta de leite com baixo teor de lactose (1 g de lactose por porção) ou sem lactose (menos de 1 g de lactose por porção) também são alternativas interessantes para este grupo, pois estes produtos passam por um processo de deslactosação, que consiste na adição de lactase e repouso do leite já embalado, para hidrólise do dissacarídeo, sem alterar o conteúdo nutricional do produto.

• DIETA POBRE EM FODMAPS

Por considerar que a intolerância à lactose pode ser parte de um tipo de intolerância mais ampla a  oligossacarídeos, dissacarídeos, monossacarídeos e polióis fermentáveis (FODMAPS), outra estratégia que pode trazer alívio as manifestações gastrointestinais seria a redução no consumo de FODMAPs Exemplos de alimentos ricos em FODMAPs: 

– Alimentos como excesso de frutose: frutas (maçã, pêra, manga, melancia, cereja, figo, tomate-japonês), verduras (aspargo, alcachofra, ervilha), mel, xarope de milho rico em frutose, néctar de agave, frutose e concentrado de suco de fruta.

– Produtos lácteos: leite (vaca, cabra e ovelha), sorvete cremoso, queijos moles (p. ex., ricota, queijo cottage, cream cheese). 

– Oligossacarídeos (frutanos e galacto-oligossacarídeos): frutas (nectarina, caqui, melancia, pêssego, tomate-japonês), verduras (alcachofra, alho, alho-poró, cebola, parte branca da cebolinha), cereais (trigo, cevada e produtos à base de centeio em grandes quantidades), algumas leguminosas (feijão, lentilha e grão de bico e fava) e algumas oleaginosas (pistache e castanha-de-caju).

-Polióis: frutas (maçã, pêra, nectarina, pêssego, ameixa, ameixa seca, melancia, amora preta), verduras (couve-flor, cogumelos, ervilha forrageira) e adoçantes (sorbitol, manitol, maltitol, xilitol, polidextrose, isomalte).

• SUPLEMENTAÇÃO DA ENZIMA LACTASE

A reposição enzimática de lactase é outra abordagem terapêutica no caso dos pacientes com intolerância à lactose que desejam consumir laticínios.

O suplemento de lactase é encontrado na forma de tablete ou sachê e é uma boa alternativa para adultos e crianças intolerantes à lactose manter o consumo diário de laticínios sem a ocorrência de sintomas gastrointestinais. 

Pode ser usado como complemento de alimentos que contém lactose ou ingeridos durante as refeições que contenham lactose, entretanto ele não é capaz de hidrolisar completamente a lactose ingerida no dia, sendo que cada paciente apresenta diferentes resultados. 

A lactase sintética é produzida através de leveduras, plantas ou organismos animais e de acordo com a legislação brasileira a lactase sintética deve ser de origem microbiana, sendo proveniente da levedura Kluyveromyces lactis.

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REFERENCIAS

ARROYO M, A, S. Perspectivas para triagem genética da intolerância á lactose: Rastreamento do polimorfismo – 13910 C/T, no gene MCM6, em neonatos. [tese]. São José do Rio Preto: Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto; 2010.

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ATENÇÃO AO DIABETES. Intolerância à lactose, 20 de janeiro de 2020. Disponível em: https://www.anad.org.br/intolerancia-a-lactose/ Acesso em: 20de maio de 2021.

BARBOSA, N.E.A. et al. Intolerância a lactose: revisão sistemática. Pará Research Medical Journal. v.4, n.33, 2020.

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FAN, M. Intolerância à lactose e produtos lácteos com baixo teor de lactose. Revista Aditivos & Ingredientes. n. 66, p.31-37, fevereiro, 2010.

MATHIÚS, L. et al. Aspectos atuais da intolerância à lactose. Revista Odontológica de Araçatuba, v.37, n.1, p. 46-52, janeiro/abril, 2016.

NASCIMENTO, A.J.P. Carboidratos. IN: NASCIMENTO, A.J.P. et al. Introdução à nutrição: conceitos básicos. São Paulo: Martinari, p.15-34, 2016.

OLIVEIRA, J.F. et al. Diagnóstico e manejo da intolerância à lactose. Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research. v.29, n.1, p.111-15, dezembro de 2019 – Fevereiro de 2020.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO. Declaração de Posicionamento da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição sobre Consumo de Leite e de Produtos Lácteos e Intolerância à Lactose, 13/02/2017. Disponível em: https://www.sban.org.br/uploads/Posicionamentos20200710102354.pdf., Acesso em: 13 de maio de 2021.

Por Sanar

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