Bom, se você ainda não ouviu falar em Psicologia Baseada em Evidências, esse artigo pode te ajudar a entender melhor sobre o tema que está no foco das discussões científicas internacionais.
A abordagem Psicologia Baseada em Evidências (PBE) é relativamente recente e propõe, através do acesso ao conhecimento científico, o aperfeiçoamento dos profissionais da psicologia e de outras áreas da saúde. Para tanto, PBE se debruça na análise e meta-análise de produções científicas, que são revisadas sistematicamente em busca de melhores evidências, práticas eficazes e direcionamentos mais assertivos nas práticas de saúde pública (MELNIK; SOUZA; CARVALHO, 2014).
Para gerar um entendimento mais claro, é necessário considerar a diferença entre revisão sistemática (metodologia utilizada pela PBE) e revisão narrativa. A revisão sistemática consiste em estabelecer uma pergunta específica e usar métodos com rigor científico na busca pela resposta. Já a revisão narrativa, busca informações científicas, de forma não sistemática, a fim de fazer com que a opinião inicial do pesquisador pareça autêntica. De acordo com Melnik, Souza e Carvalho (2014), a revisão narrativa ainda é muito presente em livros-textos.
A PBE apresenta 3 componentes importantes:
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A busca pela melhor evidência científica possível considerando a eficiência, a eficácia e a segurança na prática terapêutica;
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Considera a expertise do profissional como algo relevante para análise, escolha e eficiência dos métodos aplicados;
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Participação ativa do cliente em suas preferências e valores, para a definição das intervenções. Importante ressaltar que, o profissional faz a análise final da conduta que será eficaz, tomando como base as melhores evidências científicas para a intervenção.
Um resgate histórico
Quando pensamos na história da PBE, não há como não citar o psicólogo alemão Hans Eysenck (1952), que divulgou uma revisão de 19 estudos em psicoterapia, publicados a partir de registros de terapeutas de sua época. Como resultado, pôde inferir que em termos de evolução do paciente, as intervenções terapêuticas não eram mais eficazes do que a simples passagem do tempo.
A publicação de teor inquietante, abalou os profissionais de psicologia da época. Alguns terapeutas ignoraram Eysenck, considerando para isso um único argumento: “todos sabem que terapia funciona”. Outros pesquisadores, na busca pela confrontação da publicação de Eysenck, passaram a revisar estudos e pesquisas publicadas em psicoterapia. Eis o grande legado da pesquisa de Eysenck (1952), provocar um novo movimento por busca de evidências científicas eficazes em psicoterapia.
Novas revisões sistemáticas passaram a ser publicadas nas décadas de 50, 60 e 70, muitas delas, realizando interessantes comparativos entre as diversas modalidades de psicoterapia. Em 1993, a American Psychological Association (APA) instituiu uma força tarefa formada por profissionais de psicologia, fundamentados nas diversas modalidades de psicoterapia, com a missão de determinar e identificar tratamentos psicoterápicos sustentados empiricamente, divulgá-los à população, estabelecer diretrizes para formação de novos terapeutas e garantir também a formação continuada dos profissionais já em exercício (LEONARDI; MEYER, 2015).
Discussões acaloradas a respeito do que seria realmente validado na pesquisa em psicoterapias surgiram nos anos seguintes, levando a APA a criar em 2005, uma nova força tarefa também composta por profissionais de Psicologia de diversas abordagens para construção de um novo paradigma que representasse os vários pontos de vista referentes às práticas, aos conceitos, métodos e a teoria (LEONARDI; MEYER, 2015).
Dessa forma, a APA reforçou a relevância da pesquisa científica, o uso de manuais de tratamento e técnicas específicas norteadoras.
A Psicologia Baseada em Evidências (PBE) e seus desafios atuais
A aceitação da Psicologia Baseada em Evidências, sobretudo no que diz respeito a prática, enfrenta resistências relevantes citadas pelos autores Melnik, Souza e Carvalho (2014):
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Em diversos estudos, identificou-se que os psicólogos confiam mais em suas experiências clínicas e na opinião de colegas do que na literatura científica;
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Profissionais mais velhos costumam ter uma visão mais negativa da PBE do que os mais jovens;
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Por considerarem a própria prática mais relevante do que os estudos controlados, os profissionais manifestam um viés de disponibilidade que se define pela preferência por informações que lhes são familiares, o que faz com que os indivíduos valorizem ou corroborem informações de acordo com opiniões pessoais e visões de mundo próprias.
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Mesmo os profissionais mais simpáticos à PBE, tendem a escolher somente as estratégias recomendadas que se sentem mais confortáveis e familiarizados para utilizar.
Segundo os autores Leonardi e Meyer (2015), ao contrário de áreas como medicina e enfermagem, concentradas no desenvolvimento de um conjunto de práticas, as publicações em PBE, em sua maioria, focam mais nas discordâncias do tema do que no ensino das habilidades de sua aplicação. Os autores consideram ainda que:
“Certamente, o desenvolvimento da Psicologia como ciência e profissão depende da aprendizagem de competências que permitam a aplicação da PBE, tais como o uso efetivo das bases de dados que indexam artigos, avaliação crítica das pesquisas clínicas e revisões de literatura, domínio das técnicas terapêuticas, etc (LEONARDI; MEYER, 2015 p. 1149)”.
Os autores são enfáticos em reforçar a necessidade da Psicologia se posicionar de maneira diferente, para que efetivamente possa evoluir como ciência. Um dos grandes desafios que a área enfrenta é a conscientização de que, antes de tudo, é fundamental entender que não se trata da superioridade de uma determinada abordagem ou técnicas psicoterapêuticas, mas da urgência em se fazer ciência embasada em evidências robustas, que possam nortear a prática de seus profissionais, caso contrário, corre o sério risco de ser futuramente engolida por áreas que as faça.
É, deu para perceber que a PBE ainda tem um interessante caminho pela frente e sem dúvida, é um campo fértil para profissionais interessados em seus estudos e práticas. O estudo da PBE passa a ser ainda mais convidativo se considerarmos que ainda há poucas produções brasileiras sobre essa abordagem (MELNIK; SOUZA; CARVALHO, 2014).
Bom, o convite está feito!
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Referências
LEONARDI, Jan Luiz; MEYER, Sonia Beatriz. Prática Baseada em Evidências em Psicologia e a História da Busca pelas Provas Empíricas da Eficácia das Psicoterapias. Psicol. cienc. prof., Brasília , v. 35, n. 4, p. 1139-1156, Dec. 2015 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932015000401139&lng=en&nrm=iso>. access on 04 Apr. 2021. http://dx.doi.org/10.1590/1982-3703001552014.
MELNIK, Tamara ; SOUZA , Wanderson; CARVALHO, Marcele Carvalho. A importância da prática da psicologia baseada em evidências: aspectos conceituais, níveis de evidência, mitos e resistências. Revista Costarricense de Psicología, Costa Rica, v. 33, n. 2, p. 79-92, 2014. Disponível em: http://oaji.net/articles/2016/3238-1464132737.pdf. Acesso em: 4 abr. 2021.
SILVA, Gabriela Andrade da; OTTA, Emma y (2013), “Psicologia Baseada em Evidências: uma abordagem promissora a ser descoberta pelos psicólogos.” Boletim Academia Paulista de Psicologia, Vol. 33, núm.84, pp.20-29 [Consultado: 4 de Abril de 2021]. ISSN: 1415-711X. Disponible en : https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=94632386003