O envelhecimento tem se tornado um tema de destaque nas últimas décadas, pois, apesar do Brasil ainda não ser considerado um país idoso, a expectativa é que no ano 2050 a população idosa represente 20% da população nacional. Essa tendência traz bastante preocupação aos estudiosos do tema, já que – diferente de outros países que enfrentam a mesma situação –, nossas legislações não estão fortemente estabelecidas para a proteção dessa parcela da população.
A transição demográfica brasileira iniciou-se de uma forma desequilibrada, inicialmente com redução de mortalidade, seguida de uma redução de natalidade mais tardia, resultando em diminuição da taxa de crescimento populacional. Além disso, vivemos também uma transição epidemiológica, culminando em padrões de saúde e doença diferentes do que tínhamos antes.
As doenças infectocontagiosas estão menos frequentes devido ao desenvolvimento de novos tratamentos, melhores condições de higiene e campanhas de vacinação, enquanto as chamadas doenças crônicas não transmissíveis, como a hipertensão arterial, diabetes e doenças coronarianas, ganham destaque acometendo a população.
Com o predomínio das doenças crônicas, outro padrão que se estabeleceu foi o uso de polifarmácia, definido pela OMS como o uso concomitante de quatro ou mais medicamentos. Como já sabemos, quanto maior a exposição ao uso de medicamentos, maior a chance de desenvolvermos reações adversas a eles.
No caso dos idosos, precisamos redobrar a atenção. A senescência, processo natural do envelhecimento, traz diversas alterações metabólicas ao nosso organismo que, inclusive, alteram a forma como nosso corpo recebe o medicamento, reage a ele e, também, o modo como o elimina.
Assim, vamos ficar atentos às principais dificuldades relacionadas ao uso de medicamentos por idosos:
- Redução no número de filhos: cada vez mais o número de filhos por família tem sido menor devido às dificuldades financeiras e à inserção das mulheres no mercado de trabalho. Considerando que a maior parte dos cuidadores de idosos são familiares, esse é um ponto importante que traz muita dificuldade no cuidado ao idoso. Ou o familiar sente-se sobrecarregado no cuidar, ou – em muitos casos – o idoso mora sozinho e não tem ninguém para lhe ajudar na gestão de seus medicamentos.
- Esquecimento: quem nunca se esqueceu de tomar aquele antibiótico? Se algumas vezes nós nos esquecemos de tomar alguma dose ou nos atrasamos quanto ao horário, o mesmo pode acontecer com o idoso, que pode ainda ter esse esquecimento agravado por doenças, como as demências, por exemplo.
- Confusão: quando não se conhece o tratamento que faz e para que serve cada medicamento, também pode acontecer de se confundir e tomar um medicamento no lugar do outro, tomar duas vezes o mesmo medicamento e deixar de tomar outros. Por isso é essencial que os medicamentos estejam sempre corretamente identificados e, sempre que possível, que o paciente conheça seu tratamento e saiba identificar cada medicamento.
- Déficit visual: as embalagens de medicamentos (caixas e blísteres) não são desenvolvidos de forma que facilite a nossa leitura. Agora imagine a dificuldade apresentada por um idoso, já que a idade pode vir acompanhada de perdas visuais, como degeneração macular e as tão comuns hipermetropia e “vista cansada”.
- Dificuldades físicas: durante o envelhecimento é muito comum a perda de força muscular e redução dos movimentos finos, tornando-se mais difícil o simples ato de retirar o medicamento do blíster e abrir o frasco rosqueado. Assim, essa pode ser uma barreira para o correto uso de medicamentos.
- Dificuldades de deglutição: muitos idosos, durante o envelhecimento, passam a ter dificuldades em deglutir. Assim, aspiram com frequência o conteúdo que deveria ser engolido e muitas vezes, perdem a capacidade de deglutir comprimidos ou passam precisar fazer uso de sondas enterais. É necessário estar atento à forma farmacêutica, ou seja, será que aquele comprimido pode ser cortado ou triturado? Existe o mesmo medicamento na forma líquida para facilitar a sua administração? Essas questões precisam ser levadas em consideração ao invés de simplesmente interromper o uso do medicamento.
Mas nem tudo está perdido e é possível contornar a maioria dessas dificuldades com um pouco de organização e atenção.
Para minimizar as confusões entre medicamentos e horários, é possível elaborar uma tabela organizando os medicamentos por horário e fixá-la em local visível, como a porta da geladeira. Assim ficará mais fácil se lembrar de tomar os medicamentos e as confusões irão diminuir.
Para os idosos que moram sozinho, também é possível organizar a caixa de medicamentos por horários, identificar com cores ou colocar uma etiqueta com escritos maiores, para que o próprio idoso consiga identificar seus medicamentos e tomá-los de forma correta.
Converse com seu farmacêutico! Ele te ajudará nessa organização!
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Referências:
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