O sistema estomatognático (SE) é composto por algumas estruturas que se inter-relacionam, tais como: dentes, maxila, mandíbula, músculos da mastigação, e articulação temporomandibular (ATM). Além disso, este sistema possui intima relação com a coluna cervical, deste modo, sofre influência da musculatura tanto mastigatória quanto da região do pescoço (DUTRA et al., 2016).
A ATM por sua vez, é a única articulação móvel do sistema estomatognático. É ainda, considerada a mais complexa do corpo humano, uma vez que permite a realização de movimentos rotacionais e translacionais (bicondilar) que ocorrem durante o processo de fala e mastigação (SASSI et al., 2017).
Rodrigues et al. (2019) define ainda a ATM como uma articulação dependente, do tipo sinovial, ou seja, realizam a comunicação entre uma extremidade óssea e outra, o que lhe garante movimento, e, portanto pode ser considerada ginglimoidal, e também, ao mesmo tempo é considerada artroidal, uma vez que realiza movimentos de deslizamento; em suma, também denomina-se ginglimoartrodial. São ainda compostas de cartilagem que revestem as extremidades ósseas, ligamentos, líquido sinovial e cápsula articular, possui características funcionais que a diferem de qualquer outra articulação do corpo humano.
Ela é envolvida por uma cápsula articular que se estende do osso temporal ao processo condilar, sua cápsula é reforçada pelo ligamento lateral que vai do arco zigomático até o colo do côndilo mandibular. Na face interna da articulação está localizado o ligamento medial. Esses dois ligamentos participam da estabilidade da articulação e impedem movimentos excessivos.
Figura 1 – Representação esquemática da Articulação Temporomandibular (corte sagital)
O que são Disfunções Temporomandibulares (DTM)?
Por vezes, a articulação temporomandibular é acometida por condições desfavoráveis, o que ocorre devido a sua constante necessidade de suportar adaptações oclusais, musculares e cervicais, resultando em episódios de disfunções articulares e/ou musculares (ANDRADE; FRARE, 2008).
A American Academy of Orofacial Pain define a Disfunção Temporomandibular (DTM) como sendo um grupo de condições musculoesqueléticas e neuromusculares que englobam as ATMs, músculos mastigatórios, e estruturas associadas, como as da região cervical (FRARE; NICOLAU, 2008; DONNARUMMA, et al., 2010).
Já para Portero et al. (2009) as Desordens Temporomandibulares (DTM) podem ser classificadas em:
a) desordens dos músculos da mastigação;
b) desordens da ATM;
c) hipomobilidade mandibular crónica; e
d) desordens de crescimento, ressaltando ainda que existem as desordens inflamatórias da ATM que também estão incluídas nestas classificações, caracterizando-se de acordo com o local afetado, e podem-se denominar capsulite e sinovite quando os ligamentos capsulares ou o tecido sinovial, nesta ordem, são foco de inflamação; retrodiscite quando a desordem se gera nos tecidos retrodiscais; e artrite quando são afetadas as superfícies articulares.
Donnarumma et al. (2010) ainda classificam as Disfunções Temporomandibulares (DTM) em dois grandes subgrupos:
1) as de origem articular, ou seja, intrinsicamente ligados a ATM; e,
2) as de origem muscular, onde os sinais e sintomas são relacionados à musculatura da região estomatognática.
Okeson (2013) traz uma classificação mais didática para as Desordens Temporomandibulares conforme pode ser visualizado no quadro a seguir.
Qual a etiologia da DTM?
Sartoretto; Bello e Bona (2012), esclarecem que a etiologia das disfunções temporomandibulares não é de fato conhecida. Esta entidade patológica possui etiologia multifatorial, sendo muita das vezes encontrado a inter-relação de diversos fatores que podem levar à estas desordens.
Okeson (2013) relata que é de fato importante o conhecimento de uma ou mais causas envolvidas nos fatores etiológicos das DTMs para que se possa realizar um plano de tratamento efetivo, e, pode-se citar pelo menos cinco fatores causais mais comumente encontrados nos pacientes acometidos opor estas desordens, sendo elas: a) condição oclusal; b) trauma; c) estresse emocional; d) fontes de estímulo de dor profunda; e, e) atividades parafuncionais. Tudo isso, associado ainda à adaptabilidade do indivíduo como os fatores genéticos, biológicos e hormonais.
Os fatores psicossociais tais como ansiedade, estresse e depressão, são atualmente tidos como os principais fatores etiológicos das disfunções temporomandibulares. Pode-se observar ainda, que indivíduos cujo são expostos a diversos fatores estressantes tendem a desenvolver uma hiperatividade muscular. Ressaltando ainda, que o tipo de intensidade do estresse varia de indivíduo para indivíduo (FERREIRA; SILVA; FELÍCIO, 2015). Por outro lado, a participação dos fatores oclusais e hábitos parafuncionais não são muito bem esclarecidos na literatura.
Sartoretto; Bello e Bona (2012), mostram ainda que há uma possibilidade de as DTMs se estabelecerem no início do crescimento craniofacial, e também sua associação com fatores de ordem econômica.
Quais são os sintomas da DTM?
Estima-se que 86% da população apresente algum sintoma de disfunção temporomandibular, sendo estes, de acordo com os estudos, mais presente na população feminina e com faixa etária por volta dos 30 anos de idade (ANDRADE; FRARE, 2008; DUTRA et al., 2016)
As queixas de cefaléia são muito frequentes em pacientes com DTM, e, são resultadas principalmente de mecanismos de dor referida na ATM que se irradiam para outras regiões da cabeça. As DTMs e as cefaléias são duas entidades distintas, mas que por algum maquinismo muito complexo e pouco definido, atuam de forma recíproca (SASSI et al., 2017).
Já as manifestações de zumbido, otalgia, tonturas, limitação da amplitude mandibular, dor facial, crepitação, zumbidos, dor na região retroauricular, desvio mandibular, dificuldade de alimentação, entre outros, também são alguns sintomas relatados por quem sofre com estas disfunções (SARTORETTO; BELLO; BONA, 2012).
Além disso, alterações no complexo temporomandibular, acarretam em adaptações em todo o sistema muscular do paciente, levando a alterações na posição da cabeça e da cintura escapular, o que no pior das hipóteses, leva à uma alteração em todo a biomecânica do corpo (FERREIRA; SILVA; FELÍCIO, 2015).
Como diagnosticar Disfunções Temporomandibulares?
Ferreira, et al. (2016) relatam alguns critérios definidos para o diagnóstico e quadro da DTM são baseados no Research Diagnostic Criteria (RDC) para DTM, onde a anamnese é sem sombra de dúvidas a etapa mais importante na formulação do diagnóstico. Deste modo, é necessário realizar algumas perguntas básicas ligadas aos sinais e sintomas da disfunção.
Frare e Nicolau (2008) a fim de facilitar o diagnóstico, bem como a aferição da intensidade da dor relatada pelo paciente, mostram a utilização da Escala Numérica de Dor (END), com uma pontuação que varia de 0 a 10, onde: 0 representa a ausência de sintomatologia dolorosa; de 1 a 4 dor leve; de 4 a 5 dor moderada e de 7 a 10 dor intensa. Relatos de dor acima de cinco remetem a uma sintomatologia que limita atividades essenciais como as de abrir e fechar a boca.
Deve-se ainda averiguar os fatores de risco para o desenvolvimento de disfunções temporomandibulares, como alterações oclusais, registros de traumas na região estomatognática, e, principalmente a existência de fatores de estresse relacionados ao paciente (ANDRADE; FRARE, 2008).
O profissional deve ainda realizar a palpação de toda a região anatômica corresponde à articulação temporomandibular (região pré-auricular e têmporas) a fim de se avaliar a existência de dor (PORTERO et al., 2009).
Outros meios utilizados para o diagnostico a avaliação das condições das DTMs são o Índice Anamnésico de Fonseca, Escala Visual Analógica de Dor, Índice de Limitação Funcional Mandibular, dentre outros, cada um com suas vantagens e desvantagens, devendo o profissional reconhecer qual utilizar em sua avaliação (SASSI et al., 2017).
Como tratar as Disfunções Temporomandibulares?
O ideal é que qualquer patologia, e não somente as disfunções temporomandibulares, tenham uma adequada avaliação do caso, para que seja planejado um tratamento completo e eficiente. Nos casos das DTMs, a prática da odontologia baseada em evidencias não ampara a utiliação de técnicas que promovam mudanças oclusais muito complexas como ajustes oclusais, ortodontia, cirurgia ortognática, e afins (SARTORETTO; BELLO; BONA, 2012).
O tratamento da DTM é basicamente sintomatológico, e tem como objetivo a redução dos níveis de dor, melhora na qualidade de vida, além do restabelecimento da função mastigatória exercida pela articulação. Desta maneira, é certeiro iniciar o tratamento com terapias mais conservadoras, devendo as opções mais radicais serem deixadas para os casos mais complexos (OKESON, 2013; SASSI et al., 2017).
São relatados na literatura algumas opções de tratamento para as DTMs, sendo as principais listadas a seguir:
- Termoterapia: aplicação de calor ou frio no local para estimular a vasoconstrição ou vasodilatação dos tecidos da região, aliviando dores musculares e articulares;
- Terapia Medicamentosa: auxiliar no tratamento da DTM, antes de seu uso deve ser feito o diagnóstico da dor. Os anti-inflamatórios esteroidais tem mostrado resultados satisfatórios nestes casos, mas, tudo dentro das recomendações de doses recomendadas;
- Exercícios Terapêuticos: ajudam a restaurar a amplitude dos movimentos mandibulares;
- Laserterapia de Baixa Potência: o uso de lasers de baixa potência isolados ou combinados com outra modalidade de tratamento tem se mostrado satisfatório na redução da dor, da inflamação e do aumento da amplitude mandibular, devido ao seu efeito analgésico, anti-inflamatório e de reparação tecidual.
Já as cirurgias da ATM como a artrocentese, artroscopia, discopexia e outras, são deixadas para os casos mais graves onde nenhuma das opções anteriormente citadas se mostrou eficiente na remissão dos sintomas da DTM (SARTORETTO; BELLO; BONA, 2012).
Autor: Eduardo Kailan Unfried Chuengue
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Referências:
ANDRADE, T. N. C; FRARE, J. C. Estudo comparativo entre os efeitos de técnicas de terapia manual isoladas e associadas à laserterapia de baixa potência sobre a dor em pacientes com disfunção temporomandibular. Rev. G. O. Porto Alegre, v. 56, n. 3, p. 287-295, jul./set. 2008.
DONNARUMMA, M. D. C. et al. Disfunções temporomandibulares: sinais, sintomas e abordagem multidisciplinar. Rev. CEFAC., v.12, n. 5, p. 788-794, 2010.
DUTRA, L. C. et al. Métodos de tratamento da disfunção temporomandibular: revisão sistemática. Rev. Aten. Saúde, São Caetano do Sul, v. 14, n. 50, p. 85-95, out./dez., 2016.
FERREIRA, C. L. P. SILVA, M. A. M. R. FELÍCIO, C. M. Signs and symptoms of
temporomandibular disorders in women and men. codas, v. 28, n. 1, p. 17-21, 2016.
FERREIRA, L. A. et al. Diagnosis of temporomandibular joint disorders: indication of imaging exams. Braz. Jorn. Otorhinolaryngol., v 82, n 3, p. 341-452, 2016.
FRARE, J. C. NICOLAU, R. A. Análise clínica do efeito da fotobiomodulação laser (GaAs – 904 nm) sobre a disfunção temporomandibular. Rev. Bras. Fisioter. São Carlos, v. 12, n. 1, p. 37- 42,jan./fev. 2008.
NETTER, F. H. Atlas de Cabeça e Pescoço. Editora Mundial, 2ª edição, 688p. Rio de Janeiro, 2012.
OKESON, J. Tratamento das Desordens Temporomandibulares e Oclusão. Editora Elsevier, 7ª edição, 512 p. Rio de Janeiro, 2013.
PORTERO, P. P. et al. Placas oclusais no tratamento da disfunção temporomandibular (dtm) Revista Gestão e Saúde. Disponível em: http://www.foxitsoftware.com. Acesso em 6 de Junho de 2020.
RODRIGUES, F. C. N. et al. Fotobiomodulação no tratamento de desordens temporomandibulares: relato de caso. Clin. Lab. Res. Den. p. 1-5, 2019.
SARTORETTO, S. C. BELLO, Y. D. BONA, A. D. Evidências científicas para o
diagnóstico e tratamento da DTM e a relação com a oclusão e ortodontia. RFO, Passo Fundo, v. 17, n. 3, p. 352-359, set./dez. 2012.
SASSI, F. C. et al. Oral motor rehabilitation for temporomandibular joint disorders: a systematic review. Audiol. Commun. Res. v. 23,p. 1871, 2018.