Pacientes oncológicos: qual o papel do cirurgião-dentista?

PALAVRAS-CHAVE: Oncologia; atendimento odontológico; câncer.

Você sabia que é importante a avaliação odontológica antes, durante e depois do tratamento para câncer? E não só para câncer de boca!
.
O dentista é o responsável pelo diagnóstico, encaminhamento e reabilitação nesses casos, mas nos outros tantos tipos de cânceres que atingem a população a avaliação odontológica deve ser feita antes, durante e depois do tratamento oncológico.

Principalmente naqueles envolvendo radioterapia em cabeça e pescoço, qualquer tipo de intervenção deve ser realizada antes do início do tratamento radioterápico, como tratamentos periodontais, endodontias, tratamentos cariológicos e, principalmente exodontias, sendo essa avaliação prévia crucial, evitando complicações tardias.

A radioterapia acaba causando uma alteração nas células que dificulta muito a cicatrização, podendo gerar casos de OSTEORADIONECROSE (ORN) DOS MAXILARES.

A ORN é causada por um processo chamado arterite por radiação, que leva ao desenvolvimento de um ambiente hipocelular, hipovascularizado e hipóxico, resultando assim numa patologia que acaba por necrosar o tecido ósseo da região irradiada. Vocês imaginam as complicações de uma exodontia feita em um tecido nessas condições? Conseguem imaginar como será o processo de cicatrização desse tecido? Quando o câncer for em outras regiões do corpo, que não em cabeça e pescoço, entende-se que a radioterapia não terá efeitos na mucosa oral, uma vez que a radioterapia é um procedimento localizado.

No entanto, quando falamos em quimioterapia, estamos nos referindo a um tratamento sistêmico, e uma vez dentro do corpo, inúmeras células em diferentes regiões podem ser atingidas pelos fármacos e, portanto, também deve ser feita essa avaliação odontológica prévia e durante o tratamento.

O acompanhamento odontológico é importante para auxiliar no controle da higiene bucal, prevenção de infecções odontológicas e infecções que se estabelecem com a diminuição da imunidade, para o diagnóstico precoce das complicações bucais que podem ocorrer devido ao tratamento antineoplásico, como:

  • alterações na salivação
  • hemorragias
  • lesões ulceradas que se apresentam na boca e em todo o trato gastrointestinal causando muita dor e dificuldade para engolir, chamadas de mucosites.

A literatura nos traz que até 100% dos pacientes submetidos a quimioterapia em altas doses e transplantes de células-tronco hematopoiéticas, 80% dos pacientes com lesões malignas em cabeça e pescoço recebendo quimio ou radioterapia e uma grande porcentagem de pacientes fazendo tratamento quimioterápico para lesões malignas em outras regiões, vão desenvolver quadros de mucosite oral e gastrointestinal.

A mucosite é uma consequência comum dos efeitos citorredutores dos tratamentos oncológicos e é de responsabilidade do cirurgião-dentista saber reconhecer essas alterações.

Para o tratamento das mucosites temos diversas opções descritas pela literatura, mas falaremos mais sobre mucosites em um próximo artigo…

Após o tratamento oncológico o dentista deve manter o cuidado, acompanhando e tratando aqueles problemas tardios que possam aparecer, como necroses ósseas, dificuldade para abrir a boca, diminuição da salivação e cáries de radiação que destroem os dentes além daqueles sintomas relacionados a quimioterapia. Também é importante para aqueles casos onde será necessária uma reabilitação oral desse paciente.

O acompanhamento do dentista durante o tratamento oncológico tem o papel de evitar ou minimizar as manifestações bucais que são decorrentes desse tratamento, prevenindo e identificando precocemente essas manifestações.

Além disso, o mais importante é que com esse acompanhamento seja possível diminuir os impactos negativos na saúde dos pacientes e melhorando assim a qualidade de vida dessas pessoas.

Lembrando sempre que mesmo que você não se sinta apto a realizar o tratamento ou acompanhamento desses pacientes, é de sua responsabilidade alertá-los sobre a importância do acompanhamento multidisciplinar nesse momento e encaminhá-lo a um profissional habilitado a realizar tal acompanhamento.

Nosso papel como profissionais da saúde é o da “promoção e prevenção”, e é esse nosso papel também em uma etapa tão difícil da vida de muitas pessoas como é o caso de uma neoplasia, onde a atenção e cuidado de um profissional é de grande importância para o paciente e para a família.

Nunca se esqueçam, odontologia é, antes de qualquer coisa, SAÚDE!

REFERENCIAS:

Chronopoulos A, Zarra T, Ehrenfeld M, Otto S. Osteoradionecrosis of the jaws: definition, epidemiology, staging and clinical and radiological findings. A concise review. Int Dent J. 2018 Feb;68(1):22-30.

Rivero JA, Shamji O, Kolokythas A. Osteoradionecrosis: a review of pathophysiology, prevention and pharmacologic management using pentoxifylline, α-tocopherol, and clodronate. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol. 2017 Nov;124(5):464-471.

Sonis ST. Oral mucositis in head and neck cancer: risk, biology, and management. Am Soc Clin Oncol Educ Book. 2013.

Rubenstein EB, Peterson DE, Schubert M, Keefe D, McGuire D, Epstein J, Elting LS, Fox PC, Cooksley C, Sonis ST. Clinical practice guidelines for the prevention and treatment of cancer therapy-induced oral and gastrointestinal mucositis. Mucositis Study Section of the Multinational Association for Supportive Care in Cancer; International Society for Oral Oncology. Cancer. 2004 May 1;100(9 Suppl):2026-46