A síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) é uma forma progressiva de insuficiência respiratória hipoxêmica, caraterizada por início súbito, dispneia severa, sintomas difusos, infiltrados bilaterais em imagens pulmonares ( Tomografia computadorizada e Radiografia) e hipoxemia refrataria que não responde à suplementação de oxigênio.
Definição de Berlin da SDRA
Gravidade:
Leve | 200 mmHg < PaO2/FIO2 ≤ 300 mmHg* com PEEP ou CPAP ≥ 5 cm H2O |
Moderada | 100 mmHg < PaO2/FIO2 ≤ 200 mmHg com PEEP ≥ 5 cm H2O |
Grave | PaO2/FIO2 ≤ 100 mmHg com PEEP ≥ 5 cm H2O |
Critérios clínicos:
Momento | Início em 1 semana a partir de lesão conhecida ou de sintomas respiratórios novos ou que se agravam |
Exames de imagem (radiografia ou TC do tórax) | Opacidades bilaterais não totalmente explicadas por efusões, colapso lobar ou pulmonar, ou nódulos |
Origem do edema | Insuficiência respiratória não totalmente explicada por insuficiência cardíaca ou sobrecarga hídrica |
Uma revisão de literatura conduzida por Pelosi e colaboradores, discutiu protocolos para uma Ventilação Mecânica segura e personalizada na SDRA, baseada nos diferentes objetivos, exames de imagem, fenótipo e fisiologia individualizada. Esse estudo preconiza os seguintes parâmetros:
Volume corrente (VC)
Ventilação protetora com VC de 4 a 6 ml/kg de peso predito, a fim de manter uma pressão de Platô < 30 cm H2O. A relação entre VC e mortalidade é grande em pacientes com baixa complacência , sugerindo a importância de definir o VC de acordo com o Volume Pulmonar Expiratório Final ou a capacidade inspiratória.
Driving Pressure (∆P) e Pressão de Platô:
A Driving Pressure é definida como a relação entre o Volume corrente e a complacência estática do sistema respiratório (VC/ Cst) e está relacionada com a mortalidade. Estudos demonstram a importância da ∆P na regulação do VC e/ou da PEEP (Pressão Positiva Expiratória Final) na SDRA.
No pulmão com baixa complacência um VC menor é necessário para manter a ∆P na zona de segurança (< 13 cm H2O). Um estudo analisando dois ensaios randomizados de SDRA chegou a conclusão de que a redução da DP estava associada com menos mortalidade comparada ao aumento da relação PaO2/FIO2.
Várias questões estão envolvidas quanto à titulação da PEEP de acordo com a ∆P, incluindo:
- Dependendo do VC usado, a menor ∆P pode ser encontrada em diferentes níveis de PEEP.
- Nas situações de complacência aumentada, em comparação a menores complacências, níveis maiores de PEEP podem alcançar uma menor ∆P.
- A redução na ∆P com a PEEP, deve estar associada com maior recrutamento intra alveolar.
- Mudanças na complacência da parede torácica podem alterar a medida da ∆P.
- A presença de obstrução nas Vias Aéreas certamente pode confundir a relação entre ∆P e PEEP.
Em relação à Pressão de Platô, o estudo demonstra que esta deve estar preferencialmente <27 cm H2O. Além disso um Platô > 29 cm H2O e ∆P >19 cm H2O estão associados a aumento da mortalidade hospitalar na SDRA moderada e grave.
Pressão Transpulmonar (Ptp)
É a força de distensão do pulmão e consiste na diferença entre a Pressão alveolar (P. alv) e a Pressão Pleural (Ppl), sendo a Ppl estimada pela pressão esofágica (PEs). A Ptp absoluta na posição supino depende do peso pulmonar, assim como sua forma e propriedades mecânicas pulmonares e da parede torácica.
A pressão esofágica é uma estimativa razoável da Ppl nas zonas entre as regiões dependente e não dependente do pulmão. Na SDRA a pressão imposta da região não dependente para a região dependente do pulmão é de 10 cmH2O, em média, sendo assim a Ppl é aproximadamente PEs +5 cm H2O nas regiões dependentes do pulmão e PEs – 5 com H2O nas regiões não dependentes do pulmão.
Os seguintes parâmetros alvo têm sido sugeridos para alcançar uma Ventilação Mecânica individualizada, quando utilizada a Ptp:
- Ptp ao final da Inspiração (região não dependente) abaixo de 15 a 20 cm H2O;
- Delta da Ptp abaixo de 10 a 15 cm H2O.
- PEEP ajustada ao final da fase expiratória (região dependente) de 0 – 6 cm H2O;
- Ptp durante manobras de recrutamento não exceder 25 cm H2O.
Mechanical Power
Definição: Quantidade de energia por unidade de tempo. Ou seja, é a energia dinâmica do sistema respiratório, baseado na equação do movimento da mecânica respiratória, proposto por Gattinoni. É utilizada como preditor de VILI (Lesão Pulmonar Induzida pelo Ventilador).
Equação Resumida: Estudos recentes vêm propondo formas resumidas da equação, a fim de facilitar o acesso das informações necessárias à beira do leito.
- 0,098 x VT x (Ppeak – ∆P /2) x RR, onde:
0,098 = Fator de conversão de l/cmH2O para Joule; VT= Volume corrente; Ppeak = Pressão de Pico; ∆P = Driving Pressure; RR = Frequência Respiratória.
Manobras de Recrutamento Alveolar (MRA)
Estratégias de ventilação para o recrutamento alveolar são baseadas na premissa de que uma proporção significante do volume perdido na SDRA, efeito conhecido como “baby lung” é devido ao edema e/ou colapso alveolar, que pode ser recrutados para participar nas trocas gasosas.
Um estudo recente de metanálise demonstrou que em baixos VC, o uso de altos valores de PEEP e/ou MRA não reduziu a mortalidade em pacientes com SDRA. Nos pacientes com colapso pulmonar significativo, o recrutamento dessas unidades pode reduzir significativamente a pressão necessária para acomodar o VC ofertado e a energia transmitida para as unidades alveolares.
Entretanto, se essas abordagens não recrutarem significativamente alvéolos colapsados, o aumento da pressão nas vias aéreas pode causar hiperdistensão de unidades pulmonares já abertas, com repercussões cardiovasculares negativas.
SDRA E COVID 19
A Organização Mundial de Saúde recomenda o reconhecimento precoce, proteção individual durante a intubação, baixos volumes correntes, Platô < 30, posição prona, valores mais altos de PEEP e evitar rotina de bloqueador neuromuscular. Outros guidelines internacionais como a campanha Sobrevivendo à Sepse faz recomendações similares:
O uso de catéter nasal de alto fluxo ao invés de Ventilação não Invasiva em pacientes com insuficiência respiratória aguda hipoxêmica, baixos volumes correntes, platô abaixo de 30 cm H2O , estratégia conservadora de fluidos, posição prona, bloqueio neuromuscular para pacientes com SDRA moderada a grave e considerar vasodilatadores inalatórios e recrutamento alveolar. ECMO ( Oxigenação por membrana extra corpórea) é recomendada para pacientes com hipoxemia refratária.
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Referências:
- Personalized mechanical ventilation in acute respiratory distress syndrome. Pelosi et al. Crit Care (2021) 25:250. https://doi.org/10.1186/s13054-021-03686-3
- https://www.msdmanuals.com/pt/profissional/multimedia/table/defini%C3%A7%C3%A3o-de-berlin-da-sdra
- Current situation in ARDS in the light of recent studies: Classification, epidemiology and pharmacotherapeutics. Yildirim, F. et al. Tuberk Toraks 2021;69(4):535-546. doi • 10.5578/tt.20219611
- Acute Respiratory Distress Syndrome: Diagnosis and Management. Saguil. A, Fargo MV, American Family Physician. June 15, 2020 ◆ Volume 101, Number 12.
- Acute respiratory distress syndrome. Confaloniere, M. et al. Eur Respir. Rev 2017; 26: 160116 [https://doi.org/10.1183/16000617.0116-2016].