A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é considerada um dos maiores problemas de saúde pública no mundo. De acordo com a Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (Gold), a DPOC é a quarta principal causa mundial de morte, ocupando a quinta posição em causa de morte no Brasil.
Mais de 75% dos diagnósticos de DPOC nos Estados Unidos estão relacionados ao fumo do tabaco, outras partículas ocupacionais ou ambientais, ou exposições de gás, como exaustão de diesel e fumaça do interior de cozinha, que contribuem para o desenvolvimento da DPOC. O parto prematuro, infecções respiratórias graves na infância e asma mal controlada estão associadas com menor função do pulmão adulto, o que aumenta as chances de DPOC.
É definida como uma doença caracterizada pela limitação do fluxo aéreo, não totalmente reversível, geralmente progressiva e associada a uma resposta inflamatória anormal dos pulmões, a partículas ou gases nocivos. Manifestada por sinais e sintomas persistentes como dispneia, tosse e expectoração. A DPOC se dá pela combinação da bronquite crônica e enfisema pulmonar.
Quando o processo inflamatório crônico produz alterações brônquicas temos a bronquite crônica, que é definida em bases clínicas pela presença constante ou por aumentos recorrentes das secreções brônquicas, suficientes para causar expectoração. Já a alteração encontrada no parênquima pulmonar é denominada enfisema pulmonar, definido anatomicamente como um alargamento anormal, permanente, dos espaços aéreos distais do bronquíolo terminal, acompanhado de destruição dos alvéolos.
As alterações patológicas características da DPOC encontram-se nas vias aéreas centrais e periféricas, no parênquima pulmonar e na vascularização pulmonar. Nas vias centrais (traqueia, brônquios e bronquíolos maiores que 2 a 4 mm de diâmetro interno), as células inflamatórias penetram a superfície epitelial, levando a expansão das glândulas mucosas secretoras e ao aumento no número de células caliciformes gerando a hipersecreção mucosa.
Nas vias periféricas (brônquios e bronquíolos menores que 2 mm), a inflamação crônica leva a repetidos ciclos de lesão e recuperação da parede da via aérea. Essa recuperação resulta da remodelação estrutural da parede da via aérea, com aumento do conteúdo de colágeno e da formação de tecido cicatricial, levando ao estreitamento do lúmen e gerando obstrução fixa das vias aéreas.
O tabagismo leva a DPOC pelo desequilíbrio dos sistemas enzimáticos e pela limitação ao fluxo aéreo. Surgem a deficiência do transporte mucociliar, o aumento da produção de secreção e o estreitamento da luz brônquica. Ocorre também o desequilíbrio dos sistemas de proteases e antiproteases, produzindo a destruição do parênquima pulmonar e promovendo o surgimento do enfisema.
O cigarro aumenta a quantidade de elastase no pulmão, por ativar a elaboração de fator quimiotático nos macrófagos alveolares, atraindo os neutrófilos, que se acumulam nos bronquíolos. Além, do aumento da elastase, o fumo ainda estimula os macrófagos a produzirem protease.
Uma das mais importantes manifestações extrapulmonares da DPOC é a disfunção muscular esquelética, com perda de massa muscular, principalmente em coxas e braços, culminando com a diminuição da capacidade de exercício e queixas de fadiga e dispneia ao mínimo esforço. Esses sintomas levam à diminuição crescente do nível de atividade física diária, redução da capacidade de realizar exercícios e da função cardíaca e limitação da tolerância ao exercício, criando um círculo vicioso decrescente que pode, eventualmente, levar à debilidade e imobilidade generalizada.
As exacerbações agudas da DPOC são definidas como episódios de aumento sintomas respiratórios, particularmente dispneia, tosse e aumento produção de escarro e purulência. As exacerbações afetam negativamente qualidade de vida, promovem declínio na função pulmonar e podem resultar em hospitalização e morte. As exacerbações leves geralmente desaparecem com o aumento da frequência de broncodilatadores de curta duração. Exacerbações moderadas requerem esteroides sistêmicos ou antibióticos e pode ser necessário atendimento em ambulatório.
A infecção respiratória constitui a principal causa de exacerbação da DPOC. Além das infecções respiratórias, o tromboembolismo pulmonar, o pneumotórax e a deterioração da própria doença são os principais fatores para a exacerbação. As alterações patológicas nos pulmões levam a alterações fisiológicas que caracterizam a doença, incluindo: hipersecreção, disfunção ciliar, limitação do fluxo aéreo, hiperinsuflação pulmonar, anormalidades nas trocas gasosas, hipertensão pulmonar e cor pulmonale.
Pacientes com DPOC apresentam sua capacidade residual funcional (CRF) e volume residual (VR) aumentados, isso é decorrente da perda de tração radial do tecido pulmonar. Esse fato leva a hiperinsuflação pulmonar significativa, proporcionando uma desvantagem na mecânica respiratória com retificação das cúpulas diafragmáticas e retificação das costelas, levando o indivíduo a usar excessivamente os músculos acessórios da respiração. A capacidade vital forçada (CVF) está diminuída porque as vias aéreas fecham-se prematuramente em um volume pulmonar anormalmente alto.
A hiperinsuflação dinâmica está associada a um aumento da pressão expiratória final positiva intrínseca (PEEPi) e no trabalho elástico de respiração (WOB). Esta por sua vez leva à dispneia que é diretamente responsável por uma série de manifestações no paciente com DPOC. A dispneia é definida como uma sensação de incomodo ou cansaço na respiração.
As características dos músculos ventilatórios se modificam em pacientes com DPOC grave, apresentam maior proporção em fibras tipo I e menor proporção de fibras tipo IIa e praticamente ausência de fibras tipo IIb. Além disso, a área de secção transversa das fibras diminui na DPOC, resultando em atrofia.
O diagnóstico da DPOC é baseado em achados clínicos e confirmado pelo teste de função pulmonar. Para melhor diagnosticar e acompanhar a evolução da doença é importante estar sempre realizando uma espirometria. Os melhores preditores de mortalidade para a DPOC são fatores compostos, como o índice de BODE (B: índice de massa corpórea; O: VEF¹ pós-Broncodilatador; D: escala modificada de dispneia; E: capacidade de exercício no teste de caminhada dos 6 minutos). A espirometria é o padrão de referência para diagnosticar e avaliar a gravidade da DPOC.
A espirometria permite a avaliação de uma multiplicidade de parâmetros, porém os mais importantes do ponto de vista de aplicação clínica são a CVF (capacidade vital forçada), o VEF1 (volume expiratório forçado no primeiro segundo), e a relação VEF1/CVF, pois mostram menor variabilidade inter e intra-individual. A existência de limitação do fluxo aéreo é definida pela presença da relação VEF1/CVF abaixo de 0,70 pós-broncodilatador (BD).
O estadiamento da doença pode ser diagnosticado com base na espirometria:
- I – Doença leve – Pacientes com VEF1/CVF < 0,7 e VEF1 ≥ 80% do previsto pós BD, compreende a grande maioria dos pacientes com DPOC;
- II – Doença moderada – Paciente com VEF1/CVF < 0,7; 50 ≤ VEF1 < 80% do previsto, a redução da capacidade física e a dispneia passam a ser percebidas;
- III – Doença grave – VEF1/CVF < 0,7; 30 ≤ VEF1 < 50% ; Dispneia (MRC* = 2/3).
- IV – Muito Grave – VEF1/CVF < 0,7 VEF1 < 30%; Sinais de insuficiência respiratória (Pa02<60 mmHg e/ou PacO2>50 mmHg), cor Pumonale, Dispneia MRC ≥ 4.
* MRC – Índice de dispneia modificado do Medical Research Council (MRC) e adaptado para uso no Brasil:
Segundo o Consenso Brasileiro sobre Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (2004) são recomendadas as seguintes vacinas:
- Antiinfluenza: A sua proteção é de aproximadamente 70%, se aplicada em pessoas com sistema imunológico preservado. Uma infecção prévia não previne infecção por uma nova cepa mutante. Está recomendado seu uso em portadores de DPOC, especialmente nas formas com maior limitação respiratória, e deve ser repetida anualmente no outono.
- Antipneumocócica: A confirmação de sua eficácia em portador de DPOC não está tão bem estabelecida quanto a da vacina antigripal. Porém, em função da inexistência de efeitos colaterais significativos e de uma série de trabalhos mostrando a sua eficácia em pacientes idosos, achamos válida a sua utilização. Não deve ser repetida antes de cinco anos.
A reabilitação pulmonar (RP) tem sido sugerida em DPOC devido aos seus efeitos benéficos conhecidos na capacidade de exercício, qualidade de vida e sobrecarga de sintomas. Os programas de reabilitação pulmonar incorporam treinamento de força e resistência e apoio educacional, nutricional e psicossocial e podem melhorar a aptidão cardiovascular, os níveis de atividade física e sintomas em pacientes com DPOC.
O treinamento muscular inspiratório (TMI) tem sido extensivamente estudado nas últimas décadas em pacientes com DPOC. A TMI demonstrou melhorar a função muscular inspiratória, reduzir a dispneia e melhorar a capacidade de exercício quando aplicada como uma intervenção autônoma com cargas de treinamento controladas. Em pacientes com DPOC, a TMI tem o potencial de reduzir o desequilíbrio de demanda, capacidade imposta aos músculos respiratórios comprometidos durante o exercício.
O TMI pode ser usado como parte do tratamento durante a reabilitação pulmonar. A abordagem mais comum, o treinamento dos músculos respiratórios usa dispositivos respiratórios resistivos ou limiares, como Threshold e o PowerBreathe. Treinamento inspiratório resistido e carga limiar são consideradas uma mistura de treinamento de força e resistência.
A ventilação não invasiva (VNI) é cada vez mais utilizada, além do treinamento físico em pacientes com doença pulmonar obstrutiva, com a finalidade de permitir que eles treinem em intensidades mais altas. Diferentes modalidades de ventilação assistida têm sido utilizadas com benefícios para alívio da dispneia e aumento da capacidade ao exercício.
A DPOC não deve ser interpretada como uma doença apenas pulmonar, sendo considerada uma doença sistêmica, que leva a significativa incapacidade, perda de produtividade e piora da qualidade de vida, as quais se agravam com a progressão da doença.
A sobrevida desses pacientes é curta, devido ao declínio progressivo da função pulmonar. Quando o volume expiratório no primeiro segundo (VEF¹) atinge valores inferiores a 0,75L, a mortalidade em um ano é de 30%. Ocorre frequentemente a presença de depressão e ansiedade (74 e 96% respectivamente), atestando, portanto, a existência de problemas físicos, psicológicos e sociais.
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Referências:
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