Mindfulness, saúde mental e efeitos na infância | Colunista

Porque é importante falar sobre Mindfulness?

São muitos os autores que têm discutido formas de intervenção nos crescentes casos de problemas de saúde mental, como por exemplo, a depressão. De acordo com a Organização Pan-Americana de saúde – OPAS (2017) dados da Organização Mundial de Saúde – OMS revelam um novo problema mundial, as alarmantes taxas de transtornos psicológicos que cresceram em 18% nos últimos anos. Entre eles, está a ansiedade, depressão e tentativa de suicídio.

Embora, o que mais surpreenda, seja o fato desse crescimento do número de pessoas diagnosticados com esses transtornos ocorrerem na infância e adolescência também. Segundo o mesmo site, esse tem sido uma das principais causas de morte em menores de idade.

Papalia, Feldman e Martorell (2013) falam sobre como a ansiedade infantil cresceu nos últimos anos e que ela se relaciona a um maior número de comportamentos agressivos e à violência nos lugares. Segundo o site da World health organization WHO (2018) a depressão tem sido a doença mental com maior predominância nessa faixa etária, revelando também que o suicídio tem sido a segunda maior causa de morte entre eles.

Assim, a Organização revela a necessidade de pensar em alternativas como tentativa de minimizar essas taxas e ajudar a promover a saúde mental. A Organização destaca também a importância das intervenções precoces, no período da infância e adolescência, como forma de ir na contramão dessa tendência, tanto nessas idades quanto na fases seguintes.

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É possível compreender como alguns hábitos, aprendizados e vivências na infância podem se estender para idades posteriores e assim ajudam a criar indivíduos mais saudáveis emocionalmente. O site finaliza ainda discorrendo sobre como a adolescência é um período crítico para desenvolver costumes sociais e emocionais de bem-estar.

Assim, parece ser importante pensar em formas diferentes que possam ajudar na promoção da saúde mental. Papalia, Feldman e Martorell (2013) discutem a necessidade de promover um desenvolvimento positivo para uma vida mais saudável na infância e consequentemente, nas idades seguintes.

Dentro desse contexto, os autores destacam a importância de um relacionamento familiar positivo, questões cognitivas e o aprendizado da resiliência na infância. A terapia é essencial nesse aspecto para contribuir com essa construção de indivíduos mais saudáveis emocionalmente e Mindfulness é uma ferramenta utilizada na Terapia para esse fim. 


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O que é Mindfulness? Uma técnica da psicologia ou da religião?

Santos, Gouveia e Oliveira (2015) explicam que Mindfulness, ou Atenção Plena é um estado de consciência plena da mente, corpo e emoções, diferente da técnica de Mindfulness que é a ferramenta usada para se alcançar esse estado consciente. Menezes e Dell’Agilo (2009) traduzem essa prática como uma abertura à percepções do que você está vivenciando no momento presente, uma observação sem julgamento, nem análise.

Já Kabat-Zinn (2017) descreve a prática como uma forma de sair do estado automático e atuante, com a mente inquieta, para um modo Existente, mais lúcido e com mais nitidez de suas vivências. Assim, a intenção é alcançar um estado de clareza no aqui e agora e do que acontece internamente e ao seu redor, observando pensamentos ao invés de tentar suprimi-los.

A prática de Meditação tinha um significado mais religioso e místico, principalmente por ficar conhecida pelos costumes das religiões asiáticas e budistas. Porém, Segundo Moraes (2019), no século XXI, cientistas começaram a investigar os efeitos dessa prática no funcionamento cerebral e foi a partir de então que essa técnica despertou o interesse da área da saúde.

De acordo com o autor, essa ferramenta ficou conhecida após o reconhecimento científico e se tornou objeto de estudo da Ciência Moderna. Passando a ser interesse também da Psicologia. Assim, Santos, Gouveia e Oliveira (2015) explicam que a técnica de Mindfulness ficou conhecida na Psicologia através das Terapias Cognitivas e Comportamentais de Terceira Geração e depois ficou conhecida em outras linhas também.

Essa Terceira Geração questionava a forma de realizar a reestruturação cognitiva, através da supressão de pensamentos negativos, percebendo que essa estratégia gerava mais pensamentos indesejados, propunham a observação deles ao invés de somente reprimí-los.

Santos, Gouveia e Oliveira (2015) mostram pesquisa que apontam que estratégias para retirar pensamentos desconfortáveis aumentava a frequência dos mesmos, por isso a Mindfulness mostrou-se tão bem aceita, por permitir uma nova ferramenta para conhecer os eventos privados, em uma atitude de atenção e aceitação das experiências, para dessa forma, reestruturá-las.

Sendo assim, um breve histórico é que segundo Goleman e Davidson (2017), o Doutor Aron Beck foi o primeiro a usar a técnica em psicoterapia na década de oitenta, dando origem a Terapia Cognitiva baseada em Mindfulness (MBCT).

Porém, o início dos estudos foi marcado por Kabat-Zinn e sua pesquisa a respeito do enfrentamento e redução do estresse, o autor começou então a tratar pacientes com dores crônicas desta forma, ganhando aderência depois em diversos estudos. Dessa maneira, o foco passou a ser estratégias para regulação emocional que não fujam das experiências internas.

Menezes e Dell’Agilo (2009) explicam dois tipos diferentes de técnica e que cada uma desenvolve tipos de habilidades diferentes e produzem efeitos distintos também. Elas seriam a Mindfulness Concentrativa e a Contemplativa, essa última observa algo e a primeira se concentra em um ponto. Assim, as autoras afirmam que qualquer uma das técnicas é relevante para a autorregulação emocional, atenção e aceitação do momento presente.

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Porque a Mindfulness?

Essa prática parece ter encontrado alternativas para reduzir alguns transtornos psicológicos por ajudar na regulação emocional, aceitação das vivências e desenvolver a resiliência. Moraes (2019) afirma que altos índices de depressão e ansiedade e a preocupação desses fatores para a economia mundial acelerou e estimulou pesquisas sobre a Mindfulness como forma de autocuidado e prevenção das doenças mentais. Assim, a autora segue contando a respeito de dados que mostram como essa técnica ajuda no relaxamento e ampliação de certas capacidades cerebrais desejáveis.

Dessa maneira, essa ferramenta apresenta algumas explicações fisiológicas para conseguir tais efeitos. Máximo-Filho (2011) aponta estudos que mostram como a prática ajuda a reduzir o consumo de oxigênio e reações psicofisiológicas, e por consequência, reestabelecia a homeostase (equilíbrio) da mente e corpo.

Já Goleman e Davidson (2017) revelam estudos com Monges que revelavam um índice incomparável de flexibilidade e agilidade emocional, não ativando circuitos emocionais responsáveis pela ansiedade, pânico aumento da dor. Os Monges não antecipavam respostas emocionais, viviam-nas de forma equânime.

Mocaiber et al (2008) também esclarecem pesquisas sobre como a Midnfulness mostra uma ativação na área pré-frontal, que é um grande centro responsável pela regulação emocional, análise, controle, compreensão e cognição, contendo circuitos que impedem a reação de respostas emocionais causadas pela amígdala. Assim, a amígdala desencadeia conexões curtas que disparam reações detectando ameaças e perigos, segundo o autor.  Mas, o que se percebe é que a ativação do córtex pré-frontal causa diminuição do funcionamento da amígdala e, portanto, diminuição das respostas emocionais. 

Outras pesquisas mostram também eficácia do uso de Mindfulness que se assemelham aos resultados anteriores mas se referem à diminuição de produção do hormônio de cortisol (gerador de estresse). Calabrese (2006) fala sobre a redução do nível de estresse no corpo devido à diminuição da ativação da amígdala.

Segundo o autor, a amígdala produz o hormônio do estresse, chamado Cortisol, então não é difícil entender a relação de ambos. O autor explica que algum índice desse hormônio é importante para motivação, mas o excesso dele pode afetar inclusive o sistema imunológico por roubar energia deste para respostas emocionais de emergências.

Vale ressaltar que na ansiedade, qualquer acontecimento pode soar este alarme de perigo, mesmo não o sendo. Portanto, já que a ativação do córtex pré-frontal controla a ativação da amígdala e suas reações emocionais, o nível de Cortisol presente no corpo seria diminuído e equilibrado e assim o estresse poderia ser reduzido.

Além disso, Aftanas e Golocheikine (2001) contam que exames de Eeletroencefalograma (EEG) mostram que a Mindfulness aumentam as ondas Alfas das regiões frontais, responsáveis pelo repouso do cérebro, por momentos de calma e relaxamento profundo. Essa seria outra explicação do porquê dessa ferramenta mostrar-se eficaz para combater momentos de estresse e ansiedade.

Dessa forma, além das explicações fisiológicas que mostram a importância desta técnica para o funcionamento equilibrado do corpo, temos a noção de que ao trazer as vivências para a consciência é possível ampliar a qualidade de vida e um estado de atenção ao presente, ao invés de um viver automático. Kabbat-Zinn (1982) define que a consciência surge ao prestarmos atenção com intenção e propósito às vivências internas e externas e sem julgamento do que acontece.


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E qual a relação dessa técnica com o desenvolvimento infantil?

Durante a segunda e terceira infância (aproximadamente dos três aos onze anos) existe o desenvolvimento de certas habilidades, que quando exercitadas e aprimoradas nesta fase, podem criar hábitos que perduram nas idades seguintes, é o que afirma Papalia, Feldman e Martorell (2013). Por isso, aprendizados nessa idade precoce podem ajudar a construir adultos mais saudáveis mais tarde, pois eles já desenvolveram capacidades adequadas para lhes auxiliarem nas adversidades que surgem nas fases posteriores da vida.

Os autores esclarecem que a infância é o período de maior Neuroplasticidade, ou seja, de grande capacidade do cérebro em aprender e desenvolver certos hábitos. Dentro desse aspecto do desenvolvimento infantil, existe um conceito chamado de Maturação cerebral, no qual, segundo os mesmos autores, existe uma fase específica para o desenvolvimento de certas capacidades.

Assim, é preciso saber o que a criança está pronta para aprender em determinado momento, ou seja, não é possível ensinar uma criança de três anos a fazer contas de multiplicar, pois sua maturação cerebral ainda não esta apta a compreender tal ensinamento.

Porém, de acordo com os mesmos autores, as crianças nesse período da segunda e terceira infância desenvolvem habilidades como: reconhecimento das emoções, regulação delas, resiliência, metacognição, autoconsciência, autorregulação e outras. Ou seja, as capacidades que elas estão aptas a aprenderem, parecem ser exatamente as habilidades que essa técnica promove.

Assim, de acordo com Meppelink, Bruin e Bogels (2016), a Mindfulness auxilia no desenvolvimento da resiliência e controle emocional, mas também ajuda a reduzir o uso de medicamento psiquiátrico infantil.

Siebelink et al. (2018) diz que a capacidade de autocontrole e a relação desta com funções executivas é um ponto crítico para o tratamento do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e outros, como o descontrole da raiva, de respostas emocionais e ansiedade infantil. Ou seja, por auxiliar no desenvolvimento dessas características, ela ajuda também a reduzir os medicamentos que produzem os mesmos efeitos.

Portanto, essa seria uma boa explicação para o motivo pelo qual a Mindfulness tem se destacado como forma auxiliar de tratamento psicológico para reduzir as taxas de transtornos não só no período da infância, como nos seguintes. Essa técnica parece que vem sendo eficaz no tratamento de diversos problemas psicológicos e também no aprendizado de hábitos mais saudáveis que contribuem para o bem-estar e produção da saúde mental.

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REFERÊNCIAS:

AFTANAS, LI; GOLOCHEIKINE, SA. Teta humana da linha média anterior e frontal e alfa inferior refletem um estado emocionalmente positivo e atenção internalizada: investigação EEG de alta resolução da meditação. 2001. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/11524157/. Acessado em 20/04/2021.

CALABRESE, Edward. Biologia do estresse e hormese: a lei de Yerkes-Dodson em psicologia – um caso especial de resposta à dose de hormese. 2006. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/18568865/. Acessado em 20/04/2021.

GOLEMAN, Daniel; DAVIDSON, Richard. Ciência Da Meditação. Rio de Janeiro. Objetiva. 2017

KABAT-ZINN, Jon. Atenção Plena para inicantes. Rio de Janeiro. Editora Sextante. 2017.

KABAT-ZINN, Jon. Um programa ambulatorial em medicina comportamental para pacientes com dor crônica baseado na prática da meditação mindfulness: considerações teóricas e resultados preliminares. 1982. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/7042457/. Acessado em 25/04/2021.

MÁXIMO-FILHO, Eliceu. Meditação Transcendental e Saúde: uma revisão eletrônica da produção científica multidisciplinar em bancos de dados, de 1970 a 2006. São Paulo: Dissertação de Mestrado em Saúde Pública, USP. 2011.

MENEZES, Carolina Baptista; DELL’AGLIO, Débora Dalbosco. Os efeitos da meditação à luz da investigação científica em Psicologia: revisão de literatura. 2009. Disponível em https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932009000200006 . Acessado em 23/04/2021.

MEPPELINK, Renée; BRUIN, Esther I de.; BÖGELS, Susan M. Meditation or Medication? Mindfulness Training Versus Medication in the Treatment of Childhood ADHD: A Randomized Controlled Trial. 2016. Disponível em: https://bmcpsychiatry.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12888-016-0978-3. Acessado em 20/04/2021

MOCAIBER, Izabela; OLIVEIRA, Letícia de; PEREIRA, Mirtes Garcia; PINHEIRO, Walter Machado, VENTURA, Paula Rui; FIGUEIRA, Ivan Vasconcellos; VOLCHAN, Eliane. NEUROBIOLOGIA DA REGULAÇÃO EMOCIONAL: IMPLICAÇÕES PARA A TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL. 2008. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/pe/v13n3/v13n3a14.pdf. Acessado em 21/04/2021.

MORAES, Maria Regina Cariello. O desencantamento da meditação: da união mística ao fitness cerebral. 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-85872019000100224&script=sci_arttext. Acesso em 24/04/2021

OPAS. Organização Pan-Americana de saúde. Aumenta o número de pessoas com depressão no mundo. 2017. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=5354:aumenta-o-numero-de-pessoas-com-depressao-no-mundo&Itemid=839. Acessado em 20/04/2021.

PAPALIA, Diane E.; FELDMAN, Ruth Duskin. Desenvolvimento Humano. Porto Alegre. AMGH. 2013.

SANTOS, Paola Lucena; GOUVEIA, José Pinto; OLIVEIRA, Margareth da Silva. Terapias comportamentais de terceira geração. Novo Hamburgo. Ed. Sinopsys. 2015.

SIEBELINK, Nienke M.; BÖGELS, Susan M.; BOERBOOM, Lisanne M.; WAAL, Noor ; BUITELAAR, Jan K.; SPECKENS, Anne E.; GREVEN, Corina.. Mindfulness para crianças com TDAH e Mindful Parenting (MindChamp): protocolo de um ensaio clínico randomizado que compara uma intervenção familiar baseada em Mindfulness como um complemento para o cuidado usual apenas com o cuidado usual. 2018.  Disponível em:  https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6060473/. Acessado em 25/04/2021.

WHO – World health organization. Adolescentes: riscos e soluções para a saúde. 2018. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/adolescents-health-risks-and-solutions. Acessado em 23/04/2021.


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