Residência em psicologia hospitalar: conhece as atribuições do psicólogo? | Colunista

Atuar no âmbito da Psicologia Hospitalar pode ser o objetivo de muitos profissionais psis que se encantaram com a área durante a graduação ou ainda, depois dela.

A Residência Multiprofissional pode ser uma excelente porta de entrada. Se apresenta como uma oportunidade para se aprofundar teoricamente e praticar o cuidado aos pacientes em diversas situações de saúde neste contexto, afinal os programas constituem-se em ensino de pós-graduação lato sensu, sob a forma de curso de especialização caracterizado por ensino em serviço.. (Portaria nº 45/2007).

Para contribuir com a compreensão da atuação do profissional da psicologia nesse contexto, se faz necessário um passeio pela história da inserção neste campo, destacando datas que se tornaram marcos na profissão. Também, elucidar teoricamente os fazeres do (a) psicólogo (a) nos seus possíveis cenários de atuação e seus processos de trabalho e atribuições.

Histórico do campo no Brasil:

Pensemos em uma linha do tempo, do início da inserção profissional até os dias de hoje, com as especializações (ASSIS; FIGUEIREDO, 2019; AZEVÊDO; CREPALDI, 2016):

  • 1954: início com Matilde Neder. Foi pioneira no trabalho com crianças na clínica ortopédica e traumatológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (HC-FMUSP), auxiliando na adesão ao tratamento e consulta psicológica aos pais.
  • A partir da década de 1970: psicologia nos hospitais de especialidades.
  • 1977: o primeiro curso de Psicologia Hospitalar realizado no país, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, produzido e ministrado por Bellkiss Romano.
  • 1983:  ocorreu o I Encontro de Psicólogos na Área Hospitalar, promovido pelo CRP/06 (da região de São Paulo.
  • 1997:  estabelecida a Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar.
  • Resolução CFP nº 13/2007, versa sobre as especialidades em Psicologia. No que tange ao Psicólogo especialista em Psicologia Hospitalar: delimita-se um público de atendimento e as atividades com foco na relação ao processo do adoecer, hospitalização e repercussões emocionais que emergem neste processo.

    São elas: atendimento psicoterapêutico; grupos psicoterapêuticos; grupos de psicoprofilaxia; atendimentos em ambulatório e Unidade de Terapia Intensiva; pronto atendimento; enfermarias em geral; psicomotricidade no contexto hospitalar; avaliação diagnóstica; psicodiagnóstico; consultoria e interconsultoria.
  • Lei nº 11.129 de 2005 e Portaria Interministerial nº 45/2007: inclui a Psicologia no rol das profissões contempladas ao curso das Residências Multiprofissionais.
  • Resolução CFP nº 03/2016: acrescenta à Resolução 13/2007 o título de especialização Psicologia em Saúde: em síntese, o profissional que atua na Saúde Coletiva e seus desdobramentos.
  • 2019: lançamento do documento Referências Técnicas para atuação de psicólogas(os) em serviços hospitalares do SUS”, pelo Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP).

Esses marcos temporais constituem prova viva da evolução e expansão do campo. Seja em âmbito teórico, com as produções de livros e artigos, cursos e especializações, quanto jurídico/legal em termos de delimitação e reconhecimento profissional. Cada vez mais se reconhece a importância do saber psicológico dentro destas instituições de saúde.

A atuação no hospital

Pensar a prática hoje, requer uma compreensão do passado. A inserção da psicologia, até então predominantemente clínica, no ambiente hospitalar tem suas particularidades.

Nos EUA, a partir da década de 70 com a criação da Divisão 38 pela American Psychological Association, ficou oficializado o surgimento da Psicologia da Saúde como campo.

No Brasil se compreende a prática Hospitalar como uma sub-especialidade dentro da grande área da Psicologia da Saúde, como uma delimitação de local – embora não se restrinja a ele (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016)

A Psicologia da Saúde no Brasil se fundamenta no princípio da integralidade (podemos revisitar esse conceito na Lei Orgânica de Saúde), compreendendo a dinamicidade do processo de saúde-doença.  (Mattos, 2003).

Desde os reflexos psicológicos em militares no pós II Guerra Mundial se observa a necessidade do tratamento psicológico no ambiente hospitalar. A hospitalização e o adoecimento se mostram complexos e carecem de um olhar integralizado.

A integração do profissional de psicologia nas equipes multiprofissionais não é repentina. Decorre da constatação de alterações de ordem psicológica em pacientes submetidos aos procedimentos e tratamentos invasivos, carecendo de uma compreensão integral da experiência do sujeito. (AZEVÊDO; CREPALDI, 2016).

Assim, conforme Lazzaretti (2007) são objetivos da Psicologia Hospitalar: acolher e trabalhar com pacientes de todas as faixas etárias, bem como suas famílias, em sofrimento psíquico decorrente de suas patologias, internações e tratamentos. Em consonância, para Angerami-Camon (2003) a Psicologia Hospitalar tem como objetivo principal a minimização do sofrimento provocado pela hospitalização.

De acordo com Romano (1999) algumas relações carecem da atenção do psicólogo hospitalar: de pessoa com pessoa (quem é o paciente e quem é o cuidador), paciente com grupos (família, equipe, grupo de outros pacientes), paciente com o processo do adoecer e com a situação de hospitalização e paciente consigo mesmo.

O atendimento busca olhar para as repercussões psíquicas do indivíduo referentes à situação de doença e hospitalização, investigar a capacidade de adaptação do paciente, os problemas vivenciados nesse ambiente, o nível de adesão ao tratamento e o relacionamento estabelecido entre paciente, acompanhante e equipe de saúde (Romano, 1999).

A tríade paciente, acompanhante, equipe de saúde é um ponto central da atuação de todo psicólogo hospitalar, independentemente de sua abordagem teórica, pois nesse contato se constrói o vínculo terapêutico, mostra-se disponível para a escuta das queixas e demandas, identificando, de forma colaborativa, as situações que provocam sofrimento, visando reorganizar a tensão emocional. (CAMPOS, 1995 apud AZEVÊDO; CREPALDI, 2016).

Os processos de trabalho da(o) psicóloga(o) hospitalar

O documento intitulado Referências Técnicas para atuação de psicólogas(os) em serviços hospitalares do SUS” produzido pelo CREPOP, demarca a posição da Psicologia neste contexto.

Apresenta o referencial teórico e prático da atuação levando em conta as especificidades do local e que a dimensão subjetiva e de saúde mental das pessoas assistidas em hospitais é um aspecto imprescindível durante o tratamento, levantando também discussões acerca do processo de adoecimento, luto e assistência aos familiares (CREPOP, 2019).

Dos diversos processos de trabalho possíveis atribuídos ao psicólogo hospitalar, destaca-se os assistenciais: 

  • Processos de Acolhimento (de indivíduos ou grupos);
  • Processos de Acompanhamento (acompanhamento terapêutico e outras formas de acompanhamento): uma das possibilidades se dá na clínica cirúrgica;
  • Processos de Avaliação (avaliação psicológica de indivíduos; avaliação para diagnósticos institucionais e sociais; avaliação educacional; avaliação de aprendizagem; avaliação de competências): em transtorno alimentares, puerperais, para cirurgia bariátrica, entre diversos outros;
  • Processos grupais: grupos para mulheres/casais com perdas gestacionais. Grupos de portadores de HIV, de diabéticos, grupos de jovens, de hipertensos e outros tantos. O grupo, como processualidade, dispara uma força de variar que provoca mudanças no território da saúde, abrindo a possibilidade para a invenção de novos saberes..
  • Processos Terapêuticos (práticas terapêuticas envolvendo indivíduos ou grupos): o profissional lança mão da Psicoterapia Breve para atuar com pacientes com doenças crônicas como, por exemplo, na Nefrologia e Oncologia; nestes setores é possível um acompanhamento longitudinal e as respostas psicológicas são positivas.

Assim, de maneira sistematizada, o alcance da atuação está calcado em três pilares. O da Assistência: cabendo ao psicólogo assistir o paciente, sua família e a equipe de saúde; triar; realizar avaliação diagnóstica em Psicologia; realizar psicodiagnóstico; formular e aplicar protocolos durante hospitalização e/ou em ambulatórios; realizar interconsultas; intervir de modo psicoterapêutico individualmente ou em grupo; orientar psicologicamente a família e a equipe de saúde; realizar grupos operativos com equipe de enfermagem; registrar dados.

Do Ensino: devendo realizar supervisão e leitura técnica com estagiários; realizar cursos de formação, de pós-graduação; Capacitação, orientação e supervisão de estágios para acadêmicos e profissionais. Da Pesquisa: realizar pesquisas científicas na área de saúde; realizar publicações científicas (LAZZARETTI, 2007).

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Referências

ANGERAMI-CAMON, Valdemar Augusto (org).  Psicologia hospitalar: teoria e prática. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003.

ASSIS, Fabiane Espindola de; FIGUEIREDO, Sue Ellen Ferreira Modesto Rey de. A atuação da psicologia hospitalar, breve histórico e seu processo de formação no Brasil. PsicolArgum. out./dez., 37(98), 501-512, 2019.

AZEVÊDO, A. V. dos S.; CREPALDI, M. A. A Psicologia no hospital geral: aspectos históricos, conceituais e práticos. Estud. psicol. (Campinas), v. 33, n. 4, p. 573-585, 2016.

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução CFP nº 013/2007. Institui a Consolidação das Resoluções relativas ao Título Profissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seu registro. Brasília: CFP, 2007.

____. Resolução CFP nº 03/2016. Altera a Resolução CFP nº 013/2007, que institui a Consolidação das Resoluções relativas ao Título Profissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seu registro. Brasília: CFP, 2016.

____. Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) nos serviços hospitalares do SUS / Conselho Federal de Psicologia, Conselhos Regionais de Psicologia e Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas. —— 1. ed. —— Brasília: CFP, 2019.

Gabinete do Ministro. Portaria nº 45, de 12 de janeiro de 2007. Brasília, 2007.

LAZARETTI, C. et al. Manual de Psicologia Hospitalar. CRP-PR. Coletânea ConexãoPsi. Curitiba: Unificado, 2007.

MATTOS, R. A. (2003). Integralidade e a formulação de políticas específicas de saúde. In R. Pinheiro & R. A. Mattos (Orgs.), Construção da integralidade: cotidiano, saberes e práticas em saúde (pp.45-99). Rio de Janeiro: Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

ROMANO, Bellkiss Wilma. Princípios para a prática da psicologia clínica em hospitais. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999.


Por Sanar

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