Questionando a neutralidade | Colunista

Enquanto estudante de psicologia fui atravessada por diversas implicações sobre a universalização das experiências como instrumentalização de uma clínica longe de compromissos éticos e políticos e a não dialeticidade neste fazer, tornando-a hegemônica.

Compreendi em desenvolvimento, a importância do olhar atento às relações raciais sobre perspectiva interseccional considerando ações visadas a garantias de direitos. Inclusive, entendendo a teoria como prática pessoal pensada também através do meu estar no mundo.

O questionamento mencionado na temática proposta tem me acompanhado tanto no meu processo de autoconhecimento quanto capacitação, no que se refere ao exercício.

As desigualdades raciais tem demonstrado cada vez mais e mais a necessidade de reformulações hermenêuticas no campo da educação, em específico da Psicologia. Do trazer arcabouços condizentes com as realidades sociais, ainda que agregue outras demográficas. Em que as representações sociais devem conduzir à desnaturalização do silenciamento de identidades através, por exemplo, do dito “somos todos iguais” “somos todos humanos”.

A eugenização vinculada historicamente ao fazer da psicologia ainda tem sido parte de tentativas que utilizam do mito da democracia racial para a continuidade de apagamentos.

Que nada mais retrata a colonialidade de poder, na […] classificação social da população mundial […] que expressa a experiência básica da dominação colonial e que desde então permeia as dimensões mais importantes do poder mundial […]” (QUIJANO, 2005, p.117). Isto é, através da marginalização pela subalternidade.

Estudos que debruçaram-se em particular sobre o constituir da sociedade brasileira e afora a partir do papel da população negra, de Neusa Souza Santos, de Franz Fanon, Maria Jesus Moura, Maria Aparecida Silva Bento, Isildinha Baptista Nogueira, exemplificativamente não são abordados efetivamente, tendo como referência a manutenção da ordem e poder através da exclusão.   Neste   sentido,   percebo   o   quanto o “[…] expor como o racismo constrói as identidades raciais brancas a partir de privilégios simbólicos e materiais demonstrou que estes privilégios, intencionalmente ou não, têm um papel importante na manutenção e legitimação das desigualdades raciais […]” (SCHUCMAN, 2012 apud SCHUCMAN; MARTINS, 2017, p.181) que atravessa a academia e as demais práticas. Levando em conta, que majoritariamente as/os educadores eram brancos/brancas e as/os alunas/os também, apesar das políticas públicas de inserção (prouni, fies etc).

O movimento negro que também é psi tem possibilitado a partir de discussões contra hegemonicas “[…] a compreender a raça como categoria social, que constitui, diferencia, hierarquiza e localiza os sujeitos em nossa sociedade” (SCHUCMAN et al 2017, p. 178). Passo este, que inclusive em vinculação a posicionamentos críticos sobre a e COM parte a branquitude trouxe para a Psicologia Social cruciais apontamentos, que

[…] denunciam os usos ideológicos da Psicologia Social (de orientação norte-americana), essencialmente de base experimental, e que foi reproduzida no Brasil como uma ciência alinhada com os interesses adaptativos, alinhados ao modelo liberal e capitalista, uma ciência individualizante e sem compromisso social com a realidade brasileira e latino-americana […] (SCHUCMAN et al 2017, p. 178).

Sendo “[…] convocada a pensar nas desigualdades sociais, políticas e raciais de nosso país […]” (p.179). Que envolve o exercício de que, se enquanto terapeuta acompanho uma/um paciente/cliente devo tanto me considerar enquanto uma mulher negra, deficiente dos membros superiores, moradora de um bairro periférico na cidade de Salvador, no estado da Bahia que vem registrando significativa quantidade de mortes por violências (homicídio, feminicídio etc), filha de professora da rede estadual e municipal etc, quanto às avenidas identitárias das/dos mesmas/os. Isto é, por intersecção raça, gênero, classe, sexismo etc.

Ressaltando a efetividade do que tange o código de ética da profissão em que “[…] trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão“ (CFP, 2005, p.7), e mais, “[…] atuará com responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política, econômica, social e cultural” (p.7) entendo que ainda há muito a se fazer e questionar. De que, não há neutralidade. E sim, entre minhas experiências o intenso desejo e aprimoramento de uma psicologia antirracista e antifascista compartilhada em visão racializada.

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REFERÊNCIAS:

Código de Ética Profissional do Psicólogo. Conselho Federal de Psicologia, Brasília, ago de 2005.

QUIJANO, Anibal. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. 2005. Disponível em:https://bit.ly/2QAR1d3. Acesso em: 22 dez. 2020.

SCHUCMAN, Lia Vainer; MARTINS, Hildeberto Vieira. A Psicologia e o Discurso Racial sobre o Negro: faça “Objeto da Ciência” ao Sujeito Político. Psicol. cienc. prof. , Brasília, v. 37,                 n.            spe,            p.            172-185,             2017.                 Disponível                  em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932017000500172&lng=en &nrm=iso. Acesso em: 20 mai. 2021.

Por Sanar

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