Manejo nutricional no pós-operatório de cirurgia cardíaca na UTI | Colunista

A cirurgia cardíaca possui um conjunto de características fisiopatológicas que elevam a importância do estado nutricional no pré-operatório (PE) e, principalmente, na evolução do pós-operatório (PO).

Em primeiro lugar, a intensidade resposta inflamatória desenvolvida pelo trauma cirúrgico e a duração da Circulação Extracorpórea (CEC) pode ser agravada pela desnutrição preexistente devido pré-operatório precário, aumentando a gravidade da disfunção orgânica.

E, em segundo lugar, condições preexistentes, como a Insuficiência Cardíaca (IC), podem ocasionar uma absorção prejudicada e insuficiência intestinal devido o surgimento de edema da parede intestinal antes ou após a cirurgia. Dessa forma, pacientes cirúrgicos que possuem IC necessitam de suporte nutricional mais longo e mais especializado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) devido elevado risco de desnutrição (HILL et al., 2018; LOPEZ-DELGADO, et al. 2019).

A maioria dos pacientes submetidos a cirurgia cardíaca apresentam complicações no PO, como síndrome de baixo débito cardíaco e complicações respiratórias (como atelectasia), tornando inapropriada a alimentação por via oral e sendo necessário a nutrição enteral.

Geralmente, indivíduos que necessitam de cuidados intensivos por mais de 3 dias já são considerados em risco e apresentam alterações importantes da ingesta alimentar. Logo, o monitoramento nutricional deve ser rigoroso, buscando atender demanda nutricional do paciente o mais rápido possível (RAHMAN et al., 2017; LOPEZ-DELGADO, et al. 2019).

Nesse sentido, a complexidade do manejo no perioperatório da cirurgia cardíaca envolve a identificação precoce do risco nutricional e quais instrumentos serão utilizados no percurso de preparação para o procedimento.

Vale salientar que o trauma cirúrgico (inclusive aquele em que a CEC é utilizada) desencadeia uma série de reações inflamatórias, as quais geram estresse oxidativo e estimulação do sistema imune.

Portanto, a utilização de imunonutrientes, tais como ômega-3, selênio, glutamina, vitamina, zinco, vitaminas A, C, D e E, pode diminuir os efeitos deletérios da resposta pró-oxidante e promover melhores desfechos clínicos (STOPPE et al., 2017). Considerando esse contexto, a Figura 1 a seguir demonstra os pontos fundamentais de acompanhamento do paciente crítico em pós-operatório de cirurgia cardíaca.

Figura 1. Pontos de importância no acompanhamento nutricional do pós-operatório de cirurgia cardíaca na UTI.

 Como descrito anteriormente, a triagem nutricional do paciente de cirurgia cardíaca em cuidados intensivos é o passo fundamental para a definição da conduta dietoterápica. Inicialmente é importante ver o estado clínico geral em que o paciente foi recebido na UTI e avaliar a utilização de drogas vasoativas (DVAs), bem como analisar suas concentrações.

Em caso de drogas vasoativas em doses moderadas é interessante diminuir a oferta de fibras insolúveis, considerando que pode ocorrer diminuição do fluxo sanguíneo intestinal, com objetivo de prevenir acometimentos isquêmicos. A dieta geralmente é iniciada com consistência branda e a suplementação deve ser começada precocemente, especialmente para os indivíduos de alto risco nutricional.

Vale salientar que os suplementos com imunonutrientes deve ser priorizada para pacientes sem instabilidade hemodinâmica. Além disso, é importante implementar medidas laxantes para evitar o esforço evacuatório (STOPPE et al., 2017).

O controle glicêmico é outro fator de importância para o acompanhamento do paciente cirúrgico e tem sido associado a melhora no desfecho clínico. O tratamento da hiperglicemia (>160-180mg/dL) em infusão de insulina mostra-se benéfico, porém as hipoglicemias devem ser igualmente evitadas, principalmente em indivíduos em faixa-alvo de glicose mais restrita (80-110mg/dL). Além disso, a avaliação da ingestão de fluidos deve ser monitorada durante todo perioperatório.

No que diz respeito ao pós-operatório, a recomendação é a de que o paciente faça ingestão de líquidos assim que estiverem em boas condições físicas e, em casos de boa tolerância a líquidos, a terapia endovenosa deve ser descontinuada ou reduzida. Quando necessária, a terapia de fluidos endovenosos deve ficar em torno de 25-30mL/kg/dia, visando evitar desajustes de balanço hídrico (LOBO et al., 2020; ENGELMAN et al., 2019)

O correto manejo nutricional do indivíduo em pós-operatório de cirurgia cardíaca pode ser fator fundamental para diminuir a estadia no ambiente da UTI e favorecer a sua recuperação clínica. Nesse sentido, é importante observar todos os pontos descritos anteriormente e junto disso considerar a individualidade do paciente para assim decidir a melhor forma de realizar o acompanhamento. 

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REFERÊNCIAS

  1. ENGELMAN, D. T. et al. Guidelines for Perioperative Care in Cardiac Surgery: Enhanced Recovery After Surgery Society Recommendations. JAMA Surg. v. 154, n. 8, p. 755-766, 2019.
  2. HILL, A. et al. Current Evidence about Nutrition Support in Cardiac Surgery Patients-What Do We Know?.Nutrients. V.10, n. 5, 2018.
  3. LOBO, D. N. Perioperative nutrition: Recommendations from the ESPEN expert group. Clin. Nutr. 2020.
  4. LOPEZ-DELGADO, J. C. et al. Nutrition in Adult Cardiac Surgery: Preoperative Evaluation, Management in the Postoperative Period, and Clinical Implications for Outcomes. J Cardiothorac Vasc Anesth. V. 33, n. 11, p. 3143-3162, 2019. 
  5. RAHMAN, A. et al. Nutrition Therapy in Critically Ill Patients Following Cardiac Surgery: Defining and Improving Practice. JPEN J Parenter Enteral Nutr. V. 41, n. 7, p.1188-1194, 2017.
  6. STOPPE, C. et al. Role of nutrition support in adult cardiac surgery: a consensus statement from an International Multidisciplinary Expert Group on Nutrition in Cardiac Surgery. Crit Care. V. 21, n. 1, 2017.  
  7. WEIMANN, A. et al. ESPEN guideline: Clinical nutrition in surgery. Clin Nutr. V. 36, n. 3, p. 623-650, 2017.
  8. WISCHMEYER P. E. et al. American Society for Enhanced Recovery and Perioperative Quality Initiative Joint Consensus Statement on Nutrition Screening and Therapy Within a Surgical Enhanced Recovery Pathway. Anesth Analg. V. 126, n. 6, p. 1883-1895, 2018.

Por Sanar

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