Os pacientes internados nas unidades de terapia intensiva (UTI) necessitam de cuidados especiais e podem ser considerados pacientes em situação crítica. Os pacientes críticos são aqueles que apresentam uma doença aguda ou uma condição clínica descompensada de forma aguda e, por isso, maior dificuldade em retornar à homeostasia e risco iminente de morte.
A permanência do paciente no leito ocasiona falta de movimentação, ou imobilismo, com efeitos deletérios aos diversos órgãos e sistemas, que podem perdurar por até cinco anos após a alta hospitalar até que o paciente retorne às funções metabólicas anteriores à internação.
Para minimizar as consequências do imobilismo, a fisioterapia tem atuação fundamental como protagonista na tentativa de promover a mobilização precoce. A realização de cinesioterapia tem caráter progressivo, com o objetivo final de conseguir que o paciente realize deambulação independente e segura.
A partir de 24 horas de permanência no leito, o paciente já começa a sofrer os efeitos do imobilismo, o que é mais expressivo a partir do 10º dia, e terá maior acometimento quanto maior o tempo de confinamento no leito. A retirada do paciente no leito deve ser realizada o mais cedo possível, desde que o paciente tenha condições clínicas para tal.
As consequências do imobilismo atingem diversos órgãos e sistemas. No sistema musculoesquelético, acarreta contratura muscular, hipotrofia, sarcopenia e fraqueza muscular generalizada. As fibras musculares do tipo I, que apresentam metabolismo tipicamente oxidativo, são as que apresentam maior susceptibilidade à hipotrofia.
Os principais acometimentos nas articulações estão relacionados a redução da nutrição articular e proliferação de tecido fibroso com consequente aderência na região intra-articular e redução da amplitude de movimento.
Já no sistema ósseo, a impossibilidade da descarga de peso também predispõe o paciente acamado a aumento da reabsorção óssea e a redução da deposição de minerais, predispondo o paciente a osteopenia e osteoporose.
Além disso, a pressão das estruturas óssea sobre o colchão do leito proporciona a compressão das estruturas e interrompe a circulação local da pele, acarretando isquemia e necrose dessa região.
Essa situação ocorre com aproximadamente três a quatro horas da permanência do paciente no leito na mesma posição e pode levar à formação de lesões cutâneas e úlceras por pressão, que podem ser colonizadas por bactérias e causar escaras, ulceras infeccionadas, além de expor o paciente ao risco de desenvolver osteomielite.
Há redução do volume sanguíneo, no sistema cardiovascular, que ocorre proporcionalmente à redução das necessidades metabólicas. Além disso, redução da contração dos músculos das pernas, principalmente o músculo gastrocnêmio, acarretando estase venosa, que inclui aumento considerável do risco de desenvolvimento de trombose venosa profunda. Nos piores casos, o trombo formado se desloca até se alojar no sistema vascular pulmonar, que é o tromboembolismo pulmonar (TEP).
Pode-se observar na função respiratória que, por compressão das estruturas pulmonares, a região dependente (as áreas que estão encostadas no leito) terá redução da capacidade pulmonar total (CPT) decorrente do fechamento das pequenas vias aéreas.
Essa redução da CPT pode acarretar alterações diferentes de ventilação e expansibilidade e culminar com o colapso de áreas pulmonares, chamadas de atelectasias.
Essa também fica reduzida pela redução da capacidade contrátil do diafragma, que, como os demais músculos esqueléticos, sofre as consequências do desuso, agravada pela ventilação mecânica controlada.
Com essa deficiência há diminuição dos mecanismos de defesa pulmonar, como o movimento ciliar e o reflexo efetivo de tosse, haverá acúmulo de secreção brônquica, o que predispõe o paciente a infecções respiratórias, fundamentalmente as pneumonias.
Fisioterapia
Deve-se sempre questionar:
- Qual é o cálculo da frequência cardíaca máxima ajustada pela idade desse paciente para iniciar a fisioterapia com segurança?
Na mobilização precoce devem ser medidos em repouso e estar menores que 50% da frequência cardíaca máxima (220 – Idade). Durante a manipulação do paciente, a monitorização da frequência cardíaca é indispensável e segura enquanto os valores estiverem entre 40 e 130 bpm.
A pressão arterial sistólica devem estar entre 90 e 180 mmHg e os de pressão arterial média, entre 60 e 110 mmHg. Durante a manipulação, a pressão arterial pode variar, mas essa variabilidade máxima aceitável deve ser de 20% do valor obtido em repouso.
- Esse paciente apresenta condições seguras para a realização de cinesioterapia?
É necessário realizar previamente uma avaliação dos sinais vitais, sobretudo os parâmetros relacionados aos sistemas respiratórios e cardiovasculares ou hemodinâmicos, e comprovar as condições de estabilidade clínica do paciente.
Além disso, é fundamental que o paciente seja monitorizado e reavaliado durante a realização da mobilização precoce para que se compreenda os sinais clínicos de eventual descompensação e a necessidade de interrupção da terapia.
Necessidades de maiores demandas de oxigênio (fração inspirada de oxigênio – FiO2, devem ser inferiores a 60%) indicam que a intensidade de fisioterapia para esses pacientes deve ser mais leve. A saturação periférica de oxigênio (SpO2) deve ser mantidos acima de 88%.
Um índice bastante utilizado e confiável para verificar a condição do paciente é o índice de oxigenação, (PaO2 /FiO2), cujo valor de normalidade é maior que 300.
A frequência respiratória é um parâmetro importante por ser um reflexo indireto de trabalho respiratório. Dessa forma, inicialmente, o paciente deverá ter seus valores inferiores a 25 irpm e, durante a terapia, valores inferiores a 35 irpm.
A pressão expiratória final positiva (PEEP) representa a pressão de manutenção da via aérea ao final de expiração; valores elevados de pressão interferem diretamente na pressão intratorácica e condições hemodinâmicas. Por essa razão, é seguro realizar mobilização precoce em pacientes com valores de PEEP máximos de 10 cmH2O.
Quando a temperatura está elevada, o organismo está produzindo mais calor, ou seja, está com as atividades metabólicas aumentadas. As atividades de fisioterapia aumentam as atividades metabólicas. Portanto, só podem ser iniciadas e mantidas caso a temperatura esteja em nível inferior a 38,5°C.
- Qual seria a proposta terapêutica centrada na cinesioterapia?
Inicialmente, pode-se fazer mudanças de decúbito e posicionamentos, acompanhados de exercício passivo, alongamento e mobilização articular. A progressão dos exercícios deve seguir a ordem de exercícios ativo-assistidos, ativos e resistidos e, por fim, aeróbicos.
Preconiza-se a mobilização passiva de 10 a 20 movimentos para cada articulação, mas vale ressaltar que esse tipo de atividade não promove aumento da força muscular ou resistência à fadiga.
O exercício aeróbico é o melhor tipo de exercício para aumentar o condicionamento cardiovascular e a resistência à fadiga. É indicado para ser realizado em pacientes internados em UTI e preferencialmente com cicloergômetro.
O alongamento é fundamental para aumentar a distensibilidade dos músculos e tendões, a flexibilidade e evitar contraturas ocasionadas pela permanência no leito.
A partir da mobilização no leito, a evolução será com sedestação assistida à beira do leito com os membros inferiores pendentes, elevação dos membros superiores, transferência para poltrona, ortostatismo, treino de equilíbrio e deambulação, que pode ser avaliada conforme o índice de Barthel modificado e deve ser quantificada pela escala subjetiva de dispneia de Borg. Todas as atividades devem ser realizadas com auxílio e supervisão do fisioterapeuta.
Outro recurso útil para evitar a hipotrofia ou atrofia muscular em pacientes que apresentam contraindicação para a realização de exercícios ativos ou resistidos é a utilização da estimulação elétrica neuromuscular.
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REFERÊNCIAS
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