Psicologia perinatal: o que é e qual a sua importância para mães e bebês? | Colunista

Você sabia que o psicólogo(a) pode ajudar a combater atrasos no desenvolvimento infantil ao atender gestantes? Pois é, essa é apenas uma de tantas outras ações interessantes que o psicólogo(a) perinatal pode ajudar a alcançar em sua atuação.

Se você é psicólogo(a), estudante de Psicologia ou apenas deseja saber mais sobre este assunto, e também quer descobrir a resposta para a pergunta acima, quero te apresentar a uma área muito interessante da psicologia e que aos poucos vem sendo cada vez mais conhecida; a Psicologia Perinatal!

A mesma coisa, porém com outro nome

Também chamada de Psicologia Obstétrica, Psicologia da Maternidade, e Psicologia da Gravidez, parto e puerpério, a Psicologia Perinatal deu seus primeiros passos no Brasil a partir do final da década de 70, com a publicação da dissertação de mestrado da autora Maria Tereza Maldonado, intitulada Psicologia da Gravidez (2017).

Antes de darmos continuidade, é importante compreender o que significa o “período perinatal”. Perinatal é o período que compreende a gravidez, o parto e o puerpério (que se inicia após o parto e que dura até o organismo da mulher voltar a como era antes da gestação). Logo, Psicologia Perinatal é justamente a área de pesquisa e profissão do psicólogo(a) que busca compreender e atuar com mulheres e familiares que estão passando por algumas destas etapas.

Mas por que a Psicologia Perinatal é tão importante?

Vou te apresentar alguns dados que irão ajudar a compreender o porquê da Psicologia Perinatal estar se tornando cada vez mais relevante dentro das diversas áreas da psicologia.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), dentre todas as fases consideradas críticas em que a mulher pode passar durante seu ciclo vital, que são: a puberdade, o período perinatal e o climatério, é precisamente no período perinatal que essa mulher estará mais propensa a desenvolver alterações emocionais significativas, podendo resultar até mesmo em adoecimentos mentais

Este também é compreendido como o período onde há o maior número de internações psiquiátricas de mulheres. Um estudo longitudinal realizado com 340 gestantes que pertenciam ao grupo de baixo risco e que tinham entre 18 a 39 anos, assistidas na atenção básica da região Metropolitana de São Paulo, constatou que 26,6% apresentavam sintomas referentes a transtornos mentais (COSTA et al., 2018).

Os comerciais de fraldas mentiram para você!

Por décadas a mídia tem nos vendido a ideia de que a gestação é um período de plenitude, onde a mulher acaba atingindo seu maior papel na vida e que se sente completa e feliz por estar gerando um indivíduo dentro de si. Não podemos negar a grande beleza que esse período possui e o quanto muitas mulheres realmente podem se sentir felizes e completas durante a gestação, entretanto há aquelas que enfrentam diversas dificuldades e inseguranças durante esta fase.

O período gestacional, diferente do que é postulado pelo senso comum, costuma ser um período de turbulência para a mulher. Enquanto seu bebê está sendo gerado em seu ventre, diversas alterações hormonais no corpo desta mulher acompanham esse desenvolvimento, suscitando em diversas perturbações emocionais. Não bastando isso, a mulher também sofre alterações físicas que podem comprometer a relação que ela tem com o seu próprio corpo, podendo gerar uma rejeição da própria imagem. As limitações de algumas atividades que a gestação pode acarretar também podem contribuir para a ideia de ser alguém incapaz e dependente, tornando-se assim mais um potencial gerador de angústias

Podemos somar a esse período a dificuldade que as pessoas em geral costumam ter em dissociar gestação de felicidade plena, não conseguindo compreender que é possível uma gestante estar infeliz. Isso torna o fardo ainda mais pesado para essas mulheres, pois acabam sendo incompreendidas e muitas vezes tendo sua dor censurada, chegando até mesmo a se culparem por se sentirem assim, gerando um ciclo de angústias que pode acabar desencadeando em diversas formas de adoecimento.

A psicologia do parto

Diversas pesquisas realizadas no campo psiquiátrico já demonstraram que os transtornos psiquiátricos subdiagnosticados e/ou não tratados adequadamente durante o período gestacional, podem levar a graves consequências maternofetais, até mesmo impactando no momento do parto (JABLENSKY et al., 2005; SENG et al., 2001, apud CAMACHO et al., p. 93, 2006).

O parto provavelmente é o evento mais aguardado pelas gestantes e por aqueles que estão ao seu redor. E não é para menos, afinal é neste momento que ocorre o ponto mais alto de todo a gestação; a chegada do novo integrante à família. Todavia, a expectativa pelo nascimento do bebê pode acabar se tornando mais um incômodo para essa gestante, caso a mesma já tenha tido experiências ruins em outros partos, tenha conhecimento de pessoas que tiveram experiências desagradáveis ou, até mesmo, já possua algum medo quanto ao tipo de parto que será realizado – natural ou cesárea. 

A angústia e a ansiedade exarcebada para esse evento, se não for acompanhada por um profissional de saúde mental, pode acabar tornando este momento muito tortuoso para a mulher e para o bebê. E é aí que o Psicólogo(a) Perinatal pode intervir, pois sua base teórica o prepara para identificar tais sintomas e tratá-los de maneira mais eficaz possível.

Transtornos mentais mais comuns em gestantes

Um estudo realizado no Brasil apontou uma prevalência de transtornos mentais comuns em 41,4% em gestantes. Como o especificado pelo próprio estudo, os transtornos mentais comuns incluem sintomas depressivos não-psicóticos, ansiedade e queixas somáticas que afetam o desempenho das atividades diárias. Dentre os sintomas descritos estão: dificuldade de concentração e de esquecimento, insônia, fadiga, irritabilidade, sensação de inutilidade e queixas somáticas (GOLDBERG & HUXLEY, 1992).

Os riscos emocionais ao qual a mulher está exposta durante a gestação envolvem alteração na autoestima e a presença de ansiedade, além de riscos de desenvolverem patologias, como a depressão pós-parto (COELHO, 2015).

E esse adoecimento mental não se limita a atingir apenas a mãe, mas também pode impactar negativamente no desenvolvimento da própria criança. Uma mãe com depressão pós-parto muito provavelmente não terá energia o suficiente para exercer a maternagem. Maternagem refere-se aos recursos psíquicos que uma mãe utiliza para contribuir para a construção do filho como sujeito, e é estabelecida através do vínculo afetivo do cuidado e acolhimento que este filho recebe de sua mãe (STELLIN et al.,2011).

A importância do vínculo entre mãe e bebê

Spitz (1998) teorizou que a mãe é o ambiente do bebê, pois é através da mãe que ele, um indivíduo ainda incapaz de suprir até mesmo suas necessidades mais básicas, tem contato com o mundo. É claro que o pai e os irmãos também exercem influência emocional sobre o bebê e ajudam a mãe na configuração deste ambiente, mas ainda assim é difícil substituir o valor da mãe nesse desenvolvimento, pois ainda hoje é o membro da família que comumente está durante a maior parte do tempo com a criança. E é justamente este ambiente, criado no início da vida desse bebê, que servirá como modelo para que ele construa sua visão de mundo, de si mesmo e do futuro. 

Um ambiente disfuncional irá atuar de forma desfavorável no pleno desenvolvimento da criança, podendo resultar em atrasos neste desenvolvimento. Segundo Bolwby (2006), a vivência de uma relação satisfatória e prazerosa que envolva amor e que gere um laço afetivo sólido entre mãe e bebê é tida pelos psiquiatras infantis como o alicerce do desenvolvimento da personalidade e da saúde mental deste indivíduo no futuro. 

A atuação de um psicólogo especializado na área perinatal proporciona auxílio para mulheres e seus filhos recém-nascidos. Ao compreender as especificidades deste momento e a importância que a qualidade da vinculação tem para a díade mãe-bebê, o profissional se mostra como um importante e indispensável aliado para esse período tão especial quanto conturbado.

O Futuro da Psicologia Perinatal

Como é possível perceber com o texto, o acompanhamento psicológico durante a gestação se torna imprescindível diante dos dados científicos que apontam o risco do adoecimento mental de mulheres durante a gestação. Esses dados acendem um alerta e mostram que o cuidado materno-fetal precisa ir muito além do acompanhamento médico.

Antes pouco conhecida, a psicologia perinatal tem ganhado cada vez mais espaço, já é possível encontrar cursos de pós-graduação na área, assim como diversos outros cursos livres para estudantes, profissionais da saúde e aqueles apenas interessados no tema.  Isso demonstra que há um interesse por parte dos profissionais em se especializar neste assunto e que esta é uma área em ascensão. 

Tudo leva a crer que daqui a alguns anos esta será mais uma área bastante conhecida dentro da psicologia. E isso se deve a importância das descobertas científicas acerca dos adoecimentos no período perinatal, a procura de mulheres por auxílios que vão além do típico pré-natal médico, assim como dos esforços de grandes pesquisadores, psicólogos e professores que buscam divulgar esse importante campo. 

Quero deixar aqui a homenagem e o exemplo da Dra. Profª. Rafaela Schiavo, que, através da sua instituição MaterOnline, tem formado diversos psicólogos perinatais pelo Brasil, e seu esforço e amor por esse campo tem colaborado muito para a disseminação de conteúdos acerca deste tema, chamando cada vez mais a atenção de profissionais dentro e fora da psicologia. 

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Referências bibliográficas: 

BOWLBY, J. Cuidados maternos e saúde mental. São Paulo: Martins Fontes, 2006

CAMACHO, R.S.; CANTINELLI, F.S.; RIBEIRO; C.S. et al. Transtornos psiquiátricos na gestação e no puerpério: classificação, diagnóstico e tratamento. Rev. Psiq. Clín., v.33, n.2, p. 92-102, 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=
sci_arttext&pid=S0101-60832006000200009>. Acesso em: 02 jun. 2021.

COELHO, C. A. T. Determinantes das alterações psicoemocionais do puerpério: efeitos da autoestima. [Dissertação]. Instituto Politécnico de Viseu/Mestrado em Enfermagem de Saúde Materna, Obstetrícia e Ginecologia; 2015. Disponível em: <https://repositorio.ipv.pt/handle/10400.19/2839>. Acesso em: 02 jun. 2021.

COSTA, D. O. et al.Transtornos mentais na gravidez e condições do recém-nascido: estudo longitudinal com gestantes assistidas na atenção básica. Ciência & Saúde Coletiva, v. 23, n. 3, p. 691-700, 2018. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1413-81232018233.27772015>. Acesso em: 02 jun. 2021.

Goldberg D, Huxley P. Common mental disorders: a bio-social model. London: Tavistock; 1992.

Maldonado, M. T. 2017. Psicologia da gravidez: gestando pessoas para uma sociedade melhor. São Paulo: Ideias & Letras.

SILVA, R. A. et al. Transtornos mentais comuns e auto-estima na gestação: prevalência e fatores associados. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 9, p. 1832-1838, 2010. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102- 311X2010000900016&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 02 jun. 2021.

SPITZ R. A. O primeiro ano de vida. São Paulo: Martins Fontes, 1998

Stellin, R. M. R., Monteiro, C. F. d’A., Albuquerque, R. A., & Marques, C. M. X. C. (2011). Processos de construção de maternagem. Feminilidade e maternagem: recursos psíquicos para o exercício da maternagem em suas singularidades. Estilos da Clínica, 16(1), 170-185. Disponivel em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/estic/v16n1/a10v16n1.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2021.

Por Sanar

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