Nanotecnologia: uma nova abordagem no desenvolvimento de vacinas | Colunista

Vacinas são métodos eficazes de prevenção contra doenças infecciosas e representam um dos sucessos mais relevantes da medicina. O desenvolvimento de novas vacinas é constante, mas a maioria das novas vacinas em potencial tem como característica a baixa imunogenicidade, não sendo capazes de estimular respostas imunológicas de longa duração. 

Nanotecnologia no desenvolvimento de vacinas

O uso da nanotecnologia no desenvolvimento de vacinas é capaz de aumentar a resposta imunológica do hospedeiro devido à sua capacidade de atingir células específicas do sistema imune, além de proteger o antígeno de degradação. Partículas semelhantes a vírus, proteínas auto-montadas, micelas, lipossomas e nanopartículas inorgânicas são os sistemas mais estudados para o desenvolvimento de novos tipos de vacinas. 

Os principais fatores para o sucesso de uma vacina são: um bom antígeno para ativar a imunidade, um adjuvante imunológico inato e um sistema de entrega (portador) que permita que o antígeno seja apresentado às células específicas do sistema imune. 

Para atingir esses objetivos é necessário que o design da nanopartícula seja pensado de forma a facilitar a entrega e ligação do antígeno, especialmente quanto à sua composição, tamanho, propriedades de superfície, biodistribuição e capacidade de imunoestimulação. Outros fatores a serem considerados são a forma e a dose das nanopartículas, dependendo dos requisitos a serem atendidos. 

Partículas semelhantes a vírus (VLP’s)

São nanopartículas não infecciosas, de tamanho entre 20 e 800 nm, formadas por um capsídeo proteico estruturado sem material genético viral, já utilizado para o desenvolvimento de vacinas virais. 

As VLP’s são equipadas com um invólucro viral externo (que pode ser derivado de uma série de diferentes vírus), caracterizado por epítopos repetitivos que são imediatamente reconhecidos pelo sistema imune. Esse tipo de nanopartícula compartilha com os vírus a capacidade de estimular fortemente respostas imunológicas, mas não tem a capacidade de induzir uma infecção. 

A primeira vacina à base de partículas semelhante a vírus produzida e comercializada para uso humano foi contra Hepatite B, em 1986, contendo o antígeno de superfície HBsAg produzido via tecnologia de DNA recombinante, com tamanho de 22 nm. Já foi demonstrado que essa vacina tem capacidade de estimular a ativação de células CD4+ e de células TCD8+. 

A segunda vacina baseada em VLP’s para uso humano foi aprovada em 2006, contra o Papilomavírus Humano (HPV), um grupo numeroso de vírus oncogênicos associados a lesões benignas e malignas de pele e mucosas. 

Nanopartículas de peptídeos automontadas (SAPN’s)

A principal diferença entre esse tipo de nanopartícula e as VLP’s é que elas não são formadas por componentes virais. SAPN’s consistem em duas bobinas helicoidais conectadas por uma região ligante curta, em uma única cadeia de peptídeo. Essas nanoestruras tem uma tendência de automontagem em meio aquoso devido às suas características físico-químicas. 

Apesar de evidências de toxicidade demostradas em alguns estudos, as SAPN’s demonstraram capacidade de apresentar epítopos de antígenos de forma mais eficaz, quando comparados a antígenos nus. 

Há estudos utilizando esse tipo de nanopartículas para apresentação de epítopos de HIV induzindo respostas potentes contra esses vírus. Outra frente de estudos utilizando SAPN’s utiliza o vírus influenza, e mostrou uma resposta imunológica superior à vacina contra gripe já existente. 

Micelas

Graças às suas características químicas, as micelas apresentam uma via dupla de transporte: os antígenos podem estar associados à sua coroa hidrofílica, ou a peptídeos anfifílicos. 

Devido ao seu tamanho pequeno, geralmente menor que 100 nm, as micelas são capazes de facilitar a entrega de antígenos para o sistema imune, especialmente para as células dendrídicas, presentes em grande quantidade nos linfonodos, em comparação à periferia. 

Essas nanopartículas são capazes não só de interagir com as células dendrídicas no local da injeção, mas de viajar através do sistema linfático até os linfonodos, promovendo a formação de centros germinativos. 

Outra propriedade muito interessante a ser explorada é a facilidade de modificações estruturais que podem ser feitas nesse tipo de nanopartícula, através da escolha certa dos seus componentes e suas proporções, além da possibilidade de integração de moléculas imunoestimuladoras induzindo respostas imunológicas mais intensas. 

Lipossomas

Lipossomas são nanopartículas esféricas formados por uma bicamada lipídica envolvendo um núcleo aquoso, bastante explorados no desenvolvimento de vacinas por seu poder imunogênico. 

Em um lipossoma, o antígeno pode ser transportado tanto no núcleo aquoso, incorporado na bicamada lipídica ou adsorvido na superfície da partícula. O lipossoma age como adjuvante, fortalecendo as respostas imunológicas e aumentando a eficácia das vacinas. Além disso, vacinas lipossomais são caracterizadas por baixa reatogenicidade, são biodegradáveis e flexíveis. 

Várias vacinas baseadas em lipossomas estão em estudo contra doenças virais, bacterianas, fungicas e parasitárias. Um tipo particular de estrutura tem sido estudado extensivamente, principalmente contra vírus que atacam o trato respiratório humano: os virossomas – são lipossomas que exibem em sua superfície proteínas virais, que permitem que eles se fundam efetivamente com a membrana celular. 

Nanopartículas inorgânicas

Nanopartículas inorgânicas são carreadores de núcleo sólido inorgânico, que podem ser utilizadas como adjuvantes ou como portadores de antígenos, aumentando a resposta imunológica. 

Os aspectos positivos das nanopartículas inorgânicas são sua estrutura rígida e síntese controlada, e o aspecto negativo é sua frequente não degradabilidade. 

As nanopartículas inorgânicas mais estudadas como possíveis candidatas no desenvolvimento de vacinas são as baseadas em carbono, ouro, sílica e cálcio. 

Conclusões

O desenvolvimento de vacinas com base em nanotecnologia tem um futuro promissor, uma vez que as nanopartículas podem ser utilizadas tanto como veículo de entrega e/ou como potencializadores imunológicos. 

Uma grande variedade dessas partículas variando em tamanho, composição e carga de superfície estão disponíveis e são capazes de modular a biodistribuição de antígenos e respostas imunológicas gerais. 

As nanopartículas são capazes de melhorar não só a captação de antígenos mas também sua liberação lenta e imunogenicidade, além de serem biodegradáveis, biocompatíveis e de baixa toxicidade, oferencendo uma boa alternativa às vacinas tradicionais, e no desenvolvimento de novas vacinas. 

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Bibliografia

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