Você está preparado para o cuidado paliativo? | Colunista

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Antes de discorrer sobre o tema, é necessário primeiramente responder à pergunta: afinal, o que é cuidado paliativo?

Em 2002 a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2012) redefiniu o cuidado paliativo como uma abordagem que promove qualidade de vida aos pacientes e seus familiares, no enfrentamento de doenças que ameaçam a sobrevivência, por meio da prevenção e alívio de sofrimento. Para tanto, é necessária a identificação precoce, bem como avaliação e tratamento da dor e outros problemas de ordem biopsicossocial.

O cuidado paliativo transcende os protocolos, baseando-se em princípios onde o termo terminalidade dá espaço ao termo doença que ameaça a vida. Não se deve falar em impossibilidade de cura, mas sim na impossibilidade de tratamento modificador da doença, afastando assim a ideia do “não se pode fazer mais nada” (OMS, 2012).

Para compreendermos o surgimento dos cuidados paliativos e a inserção da enfermagem nesse contexto, recorreremos às narrativas da Academia Nacional de Cuidados Paliativos – ANCP (2020) que associa a origem do conceito paliativista ao termo cuidar, com origem na Idade Média quando os hospices presentes nos monastérios abrigavam doentes e moribundos para ofertar-lhes cuidados buscando alívio do sofrimento.

Uma das figuras mais imponente no contexto do cuidado paliativo é Cicely Saunders (1918-2005), que além de enfermeira, era graduada como assistente social e médica. Saunders dedicou sua vida ao alívio do sofrimento humano, publicou inúmeras obras nesse campo e inspirou um olhar mais humanizador para o cuidado paliativo. Além disso, fortaleceu o protagonismo da enfermagem nessa modalidade de cuidado.

No contexto brasileiro a inserção dos cuidados paliativos como ferramenta de cuidado ocorreu mais tardiamente,  anos 90. Inicialmente atribuía-se esse cuidado aos pacientes oncológicos, quando o Instituto Nacional do Câncer (INCA) institui um centro exclusivo para essa modalidade de cuidado aos paciente em estágio terminal de câncer.

Em 2005, com a criação da ANCP os cuidados paliativos ganharam destaque no cenário brasileiro e possibilitou a regularização do profissional paliativista, bem como determinação de critérios de qualidade para os serviços de cuidados paliativos. Em 2009, o Conselho Federal de Medicina incorporou essa modalidade como princípio
fundamental do código de ética da medicina.

Apesar dessa expansão do entendimento acerca dessa “nova” modalidade de cuidado, ainda é comum que se confunda cuidado paliativo com eutanásia. É frequente os pré-conceitos que surgem quando se fala em paliativo, e ainda se tem uma forte associação com a morte.

A única certeza que temos da vida é a morte, esse é o fim certo de todos, sem exceções. E apesar da morte fazer parte da vida, encontramos ainda hoje, muita resistência em falar sobre morte-morrer. A vida é feita de ciclos, que devem ser vivenciados da melhor maneira possível, respeitando cada momento e experiências.

A enfermagem é em sua essência, a profissão do cuidado em todas as suas dimensões. Realizamos o cuidado ao ser humano desde sua concepção até depois da morte. E para tal, precisamos estar preparados para o enfrentamento desse cuidado em todas as suas faces.

Muitas vezes o cuidado de enfermagem confunde-se com a mera execução de procedimentos. Entretanto, o cuidado transcende o mecanicismo da execução de técnicas, pois envolve o contato humano e humanizador. Afinal, somos humanos cuidando de humanos, e como tal, devemos adotar um cuidado humanizador.

O cuidado paliativo prevê alívio de sofrimento. Mas será que sofrimento é apenas a dor física? E a dor emocional? E a dor espiritual? E a dor social? Precisamos estar preparados para enfrentar todas as modalidades de sofrimento. Para isso, primeiramente precisamos compreender a essência do cuidado paliativo para que possamos exercê-lo em sua plenitude. Ademais, é necessário que eu esteja bem comigo mesmo para que eu possa ofertar ao outro o meu melhor. Pois é isso que o paciente em cuidado paliativo necessita: o melhor cuidado que se pode oferecer!

Muitas vezes um simples sorriso no rosto, um olhar acolhedor, uma escuta atenciosa, um simples apertar de mãos, um abraço, um bom dia/tarde/noite ou a simples pergunta “como você está hoje?” já promove muito mais alívio de sofrimento do que uma morfina.

Precisamos fortalecer as relações humanas no processo de cuidado, robotizar menos e humanizar mais. Essa é a essência dessa modalidade de cuidado. Precisamos compreender quais são as necessidades de quem cuidamos. Já ouviu falar em empatia? A empatia prevê a compreensão das necessidades do outro, pela simples pergunta: como eu posso lhe ajudar?

Com o propósito de garantir maior visibilidade a esse tema, foi estabelecido pela Worldwide Hospice Palliative Care Alliance (WHPCA), o Dia Mundial de Cuidados Paliativos, a ser comemorado em todo o mundo no segundo sábado de outubro a cada ano. E nesse ano de 2020 comemora-se em 10 de outubro.

Para que estejamos preparados, enquanto profissionais, para o cuidado paliativo, precisamos reverberar a verdadeira essência dessa modalidade de cuidar paliativista, acolhendo não apenas o paciente em terminalidade, mas também toda a sua rede familiar de apoio. Precisamos fortalecer o entendimento desse olhar paliativista, conforme recomenda a ANCP (2012), garantindo:

  • Acesso ao melhor padrão de atendimento e mais alto nível de conforto ao paciente em todo seu período de terminalidade de vida. E lembre-se, esse período pode perdurar por meses ou até mesmo anos;
  • Apoio, conforto e cuidados aos familiares e cuidadores que enfrentam junto ao paciente esse processo de terminalidade;
  • Cuidados psicológicos, sociais, espirituais e emocionais aos profissionais que exercem o cuidado paliativo. É necessário cuidar de quem cuida!
  • Integração dos cuidados paliativos aos sistemas de saúde vigentes, independentemente de ser rede pública ou privada.

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REFERÊNCIA

ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS – ANCP. Cuidados Paliativos. Homepage, São Paulo, SP, 2020. Disponível em: <https://paliativo.org.br/#>. Acesso em 04 de out., 2020.

ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS – ANCP. Manual de Cuidados Paliativos. 2ª ed. São Paulo: ANCP, 2012. Disponível em: < http://biblioteca.cofen.gov.br/wp-content/uploads/2017/05/Manual-de-cuidados-paliativos- ANCP.pdf <Acesso em 04 de out., 2020.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE – OMS. National câncer control programmes: policies and managerial guidelines. 2 ed. Geneva: OMS, 2002. Disponível em:<https://www.who.int/cancer/publications/nccp2002/en/>. Acesso em 01 de out., 2020.