Diagnóstico e farmacoterapia do diabetes | Colunista

O diabetes mellitus (DM) pode ser conceituado como sendo um distúrbio de caráter metabólico que resulta em hiperglicemia persistente, decorrente de deficiência na produção de insulina ou na sua ação, ou por ambos os mecanismos.  Epidemiologicamente estima-se que cerca de 425 milhões de pessoas no mundo apresentam DM, sendo sua presença associada com aumento da morbimortalidade, complicação cardiovascular e redução da qualidade de vida do indivíduo. Há diferentes tipos de diabetes, cuja classificação se baseia conforme a sua etiologia e tem como principais fatores causais os genéticos, biológicos e o estilo de vida do indivíduo. A Tabela 1 traz especificando os tipos de diabetes existentes e suas principais características.

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Diagnóstico

            Para o diagnóstico de DM, é necessário avaliar em qual condição esse paciente se encontra. Seguindo as recomendações das Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes, este pode apresentar um quadro de pré-diabetes, que ocorre quando os valores glicêmicos estão acima dos valores de referência, mas ainda abaixo dos valores diagnósticos de DM ou, pode ter diabetes que acontece quando a resistência à insulina já está presente (DM2) ou em quadros onde há deficiência de insulina (DM1). O diagnóstico é feito com base em exames laboratoriais, estes incluem:

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Conforme a sociedade brasileira de diabetes, os critérios empregados para o diagnóstico para DM1 são semelhantes aos utilizados no DM2. Contudo, no primeiro caso, comumente a sintomatologia já chama muito mais a atenção do clínico do que no segundo.

Após o diagnóstico de DM, a tomada de decisão farmacoterapia que será implementada se baseará no tipo de DM que o paciente apresenta. A fim de facilitar o seu estudo, vamos abordar de forma separada os tipos de diabetes, e quais os fármacos que podem ser empregados para o manejo dessa comorbidade.

Diabetes tipo 1

O DM tipo 1, se caracteriza por ser uma doença autoimune,  com início abrupto e cuja produção insuficiente de insulina pode se manifestar através da cetoacidose diabética, que geralmente é a primeira característica da doença. De forma geral acontece durante a infância e adolescência, acometendo em sua maioria pacientes com peso normal.  O tratamento se baseia na administração exógena de insulina empregando esquemas e preparações diferentes a fim de se alcançar os alvos glicêmicos pré e pós-prandiais. A tabela 2 traz os valores de referências desejados para os pacientes que utilizam insulina, sendo necessário ressaltar que, o emprego da insulioterapia deve vislumbrar atingir o perfil mais próximo do fisiológico.

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A fim de manter os níveis glicêmicos dentro dos padrões, diferentes tipos de insulina podem ser empregadas. A imagem 1 traz os diferentes tipos de insulina mais utilizadas para a terapia do DM1, bem como suas principais características.

Imagem 1:  Principais características dos tipos de insulina.

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Um dos principais problemas associados à insulinoterapia é a hipoglicemia que tem como sintomas hiperatividade autonômica, taquicardia, palpitações, sudorese, tremor, náuseas e fome. A fim de evitá-la recomenda-se que o paciente tenha uma alimentação regular. Contudo, em casos de hipoglicemia a principal forma de tratamento envolve a administração de glicose ou de glucagon. Outra informação relevante ao paciente diz respeito à necessidade de modificar os locais de administração da insulina, a fim de evitar lesões ao longo do tempo, desta forma, a Imagem 2 traz diferentes locais em que é possível administrá-la.

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Diabetes tipo 2

O diabetes mellitus do tipo 2, ocorre com maior prevalência, sendo atualmente responsável por  90 a 95% de todos os casos de DM. Sua etiologia está associada a múltiplos fatores que incluem genéticos e ambientais. De forma geral ela ocorre em indivíduos adultos. Há diferentes fatores de riscos, dentre os quais se destacam a alimentação, sedentarismo, avançar da idade, história familiar da doença, e obesidade. Na maioria das vezes, a doença é assintomática, sendo o diagnóstico realizado por dosagens laboratoriais de rotina ou manifestações das complicações crônicas. Com menor frequência, indivíduos com DM2 apresentam sintomas clássicos de hiperglicemia (poliúria, polidipsia, polifagia e emagrecimento inexplicado) e, raramente a cetoacidose diabética é a manifestação inicial do DM2.

O seu tratamento consiste na utilização de hipoglicemiantes, fármacos que tem por finalidade reduzir a glicemia, e mantê-la dentro dos parâmetros de normalidade (em jejum < 100 mg/dL e pós-prandial < 140 mg/dL).  Para isso há diferentes medicamentos disponíveis com distintos mecanismos de ação que são importantes para normalizar a glicemia dos pacientes. Desta forma esses fármacos podem ser divididos em:

Sulfonilureias

Representada por Clorpropamida, Glibenclamida, Glipizida, Gliclazida, Gliclazida e Glimepirida, agem aumentando a secreção de insulina. São contraindicados para gestantes e para pacientes com insuficiência renal ou hepática e tem como principais vantagens a redução do risco de complicações microvasculares bem como a maior redução da HbA1C. Em contra partida, pacientes que os utilizam apresentam maior propensão a hipoglicemia e aumento de peso.

Metiglinidas

São pertencentes a esta classe Repaglinida e  Nateglinida. Estes atuam de modo a aumentar a secreção de insulina. Também contraindicadas durante a gestação, trazem como principais benefícios a redução do espessamento médio intimal carotídeo e a redução da variabilidade da glicose pós-prandial. Como pontos negativos, esses medicamentos estão associados a quadros de hipoglicemia e ganho de peso discreto.

Biguanidas

Representada pela Metformina, age reduzindo a produção hepática de glicose a aumentando sua captação em tecidos periféricos.  A Metformina constitui-se como fármaco de primeira escolha para uso contínuo por via oral em pacientes com diabetes tipo II, e apresenta como principais vantagens a redução da HbA1c e de eventos cardiovasculares, prevenção de DM2, melhora do perfil lipídico do paciente, bem como redução do peso. Os principais efeitos colaterais com o uso desse medicamento se manifestam por meio do desconforto gastrointestinal que resultam em diarréia e náuseas.

Inibidores da α-glicosidase

Tem como representante a Acarbose, que atua retardando a absorção de carboidratos. Sua utilização está associada com prevenção de DM2, melhora do perfil lipídico, redução da glicose pós-prandial e diminuição de complicações cardiovasculares. Como desvantagens, pacientes com uso da Acarbose apresenta quadros de flatulência e diarréia além de redução discreta da HbA1c.

Glitazonas

Classe a qual pertence a Pioglitazona. Atua aumentando a sensibilidade à insulina nos músculos, adipócitos e hepatócitos. Tem como principais vantagens a prevenção a DM2, melhora do perfil lipídico, e redução tanto da gordura hepática, e da HbA1c quanto dos triglicérides. Em contrapartida, este fármaco traz como principais desvantagens retenção hídrica, anemia, ganho de peso, insuficiência cardíaca e aumento da propensão a fraturas

Gliptinas (inibidores da DPP-4)

Representado por Sitagliptina, Vildagliptina, Saxagliptina, Linagliptina, e Alogliptina. Aumentam o nível de GLP-1, com aumento da síntese e da secreção de insulina, além da redução de glucagon. São fármacos que trazem como vantagens a sua segurança e tolerabilidade, não ganho de peso, e rara hipoglicemia. As principais complicações associadas à utilização desses medicamentos são a alta probabilidade de complicações hepáticas e cardíacas.

Mimético e análogo do GLP-1

Inclui Exenatida, que é injetada por via subcutânea (SC) antes do desjejum e após o jantar; Liraglutida, injetada via SC, independentemente do horário da refeição; Lixisenatida injetada uma vez ao dia no mesmo horário via SC; Dulaglutida, utilizada uma vez por semana, via SC e, Semaglutida administrada uma vez por semana. Estes atuam aumentando o nível de GLP-1, que resulta no aumento da síntese e secreção de insulina, além da redução de glucagon. Como principais vantagens se têm a redução do peso, da glicose pós prandial, dos riscos cardiovasculares e da pressão arterial sistólica, além de rara hipoglicemia. Como principais efeitos colaterais há náusea, vômitos, diarréia e aumento da frequência cardíaca.

Inibidores do SGLT2

Inclui Dapagliflozina, Empagliflozina e Canagliflozina. Atuam inibindo o receptor SGLT2 Como resultado observa-se a prevenção da reabsorção de glicose no túbulo proximal renal e promoção de glicosúria. Tem como importantes benefícios a rara hipoglicemia e a redução do peso, redução da pressão arterial bem como de eventos cardiovasculares e mortalidade. Todavia, a utilização desses fármacos está associada com reações adversas acentuadas, que incluem o aumento da propensão do indivíduo a quadros infecciosos.

Diante do elucidado, nota-se que atualmente há uma gama de medicamentos que podem ser empregados para o tratamento do diabetes. Todavia, é válido ressaltar que indivíduos portadores desta patologia além da adesão medicamentosa ou da utilização da insulina exógena, devem adotar hábitos de vida saudáveis e realizar um monitoramento constante dos valores glicêmicos. Como forma de monitorar a glicemia, o teste de glicemia capilar surge como uma importante ferramenta além da HbA1C.

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REFERÊNCIAS:

ALVES DA CONCEIÇÃO, R. NOGUEIRA DA SILVA, P. BARBOSA, M. L. C. Fármacos para o tratamento do diabetes tipo II: Uma visita ao passado e um olhar para o futuro. Rev Virtual Quim, v. 9, n. 2, p. 514-34, 2017.

AMERICAN DIABETES ASSOCIATION. Standards of medical care in diabetes. Diabetes Care. V 42, n1, p. 193-248, 2019

GOLBERT, Airton. VASQUES, Ana Carolina Junqueira et al. Diretrizes Da Sociedade Brasileira De Diabetes 2019-2020. Clannad editora científica. 2019.

KATZUNG, Bertram G. Basic and Clinical Pharmacology 14th Edition. McGraw Hill Professional, 2017.