Diagnóstico de câncer na cavidade oral: você precisa saber fazer | Colunista

De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA) câncer é o nome dado a um conjunto de doenças que possuem em comum o crescimento desordenado das células que se tornam agressivas e incontroláveis, determinando a formação de tumores malignos com consequente invasão de tecidos e órgãos. Atualmente pode ser considerado um problema de saúde pública tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento como o Brasil e vem sendo o responsável por 13% de todas as causas de óbito no mundo (INCA, 2013).

NEVILLE et al.(2004) relata que os homens de cor branca e com idade superior a 65 anos possuem maiores chances de desenvolver a doença, sendo que a proporção entre homens e mulheres afetados é de 3:1. Ainda segundo esse autor, o carcinoma de células escamosas é o mais comumente encontrado na cavidade oral, correspondendo a 94% de todos os tumores e sua origem é multifatorial. Dentre os agentes causadores estão o consumo das diversas formas de tabaco, especialmente quando associadas ao uso de álcool, além dos fenóis, radiação, alimentação carente de vitaminas e nutrientes, infecção porcândida e vírus oncogênicos como o HPV.

Torna-se fundamental no diagnóstico da neoplasia, o exame cuidadoso das mucosas da cavidade oral, permitindo a determinação de lesões. A confirmação diagnóstica somente é possível através da biópsia prévia ao tratamento, devendo-se evitar investigações diagnósticas demoradas e onerosas que apenas retardam o início do tratamento (RAPOPORT, 2001).

Antes de iniciar o tratamento contra o câncer, é necessário tempo para realização da análise histológica e imuno-histoquímica, realização de exames de imagem e laboratoriais, visando ao estadiamento e pré-tratamento, planejamento cirúrgico e/ou radioterápico e agendamentos. Essas são as principais causas do atraso do sistema de saúde. A Lei nº 12.732/201225 dispõe que o paciente deve iniciar o seu primeiro tratamento oncológico em até 60 dias após o diagnóstico.

Pode ser possível a redução dos atrasos do paciente e do profissional, respectivamente, por meio da educação acerca do câncer de boca/orofaringe e pela melhora na sua habilidade diagnóstica. Tudo o que foi evidenciado reforça a necessidade do diagnóstico precoce. Mas, tão importante quanto este, é a garantia do acesso ao tratamento, por intermédio de um fluxo estabelecido entre os serviços e adequados sistemas de referência e contrarreferência, diminuindo-se, assim, morbidade e mortalidade desses pacientes, bem como os custos do SUS. (LE CAMPION, 2016).

PRADO E PASSARELLI (2009), em um trabalho de revisão de literatura, citam itens que seriam de fundamental importância para o cirurgião-dentista (CD) no aconselhamento de pacientes e para o diagnóstico do câncer bucal. A partir desses itens, o CD teria condições de orientar seus pacientes, além de reconhecer e consequentemente diagnosticar precocemente o câncer bucal com o encaminhamento responsável ao médico oncologista, favorecendo o prognóstico.

Citam os fatores de risco que deveriam ser identificados e eliminados como o tabaco -por causar ressecamento da mucosa oral, aumento da camada de queratina e por produzir trauma térmico-mecânico -e o álcool, cujo contato de forma crônica com a mucosa bucal agiria como um solvente, diminuindo a velocidade de reação do organismo e produzindo injúria celular.

Relatam a importância da manutenção de uma dieta rica em nutrientes, especialmente em vitamina A, aconselham sobre o uso de proteção contra exposição solar, cuja radiação ultravioleta (UV) é capaz de causar danos celulares ao epitélio e tecido conjuntivo subjacente, e sobre a imunodeficiência, em especial pela presença do vírus HPV. Alertam sobre a importância do acompanhamento e biópsia de lesões pré-cancerizáveis que aliadas aos fatores de risco aumentam as chances de se transformarem em Carcinoma in situe outros tipos de carcinomas malignos.

Relatam ainda a importância da adequação do meio bucal, removendo agentes irritantes e infecciosos à mucosa oral e orientam sobre a realização do autoexame bucal. Esse deve ser realizado em frente ao espelho e em local bem iluminado, após remoção de próteses. O paciente deve observar os lábios inferiores e os superiores, mucosa jugal, dorso, ventre e bordas laterais da língua, assoalho bucal, palato e tonsilas a procura de manchas brancas ou avermelhadas, feridas que não cicatrizam úlceras e outros.

Os autores puderam concluir que os fatores de risco associados podem aumentar as possibilidades de desenvolvimento do câncer bucal e que por ter maior contato com os pacientes, o CD deve estar apto para diagnosticar e preveni-lo.

FREITAS et al.(2011) relataram, à partir de uma revisão de literatura, questões pertinentes às sequelas bucais da radioterapia de cabeça e pescoço e a importância desse conhecimento pelo cirurgião-dentista como forma de proporcionar melhores condições de vida ao paciente com câncer.

Um tipo comum de tratamento é a radioterapia, que consiste na aplicação de doses terapêuticas de radiação ionizante que atuando sobre o DNA células leva a incapacidade de proliferação ou sua morte. Esse tipo de tratamento pode apresentar efeitos indesejáveis como a xerostomia que leva o paciente a queixar-se de desconforto bucal, perda do paladar e dificuldades na fala e deglutição.

Outro efeito indesejado trata-se do favorecimento da ocorrência de osteorradionecrose sendo importante a realização de uma avaliação odontológica pré-radioterápica, com o levantamento das necessidades do paciente e tratamento prévio. A complicação oral mais comumente encontrada em pacientes em tratamento radioterápico trata-se da mucosite oral levando a sinais e sintomas como dor, desconforto e queimação da mucosa que podem ser exacerbados em contato com alimentos duros e muito temperados, interferindo nas condições nutricionais dos pacientes.

Outra consequência do tratamento radioterápico trata-se da candidose que é causada por patógeno oportunista e que pode ser exacerbada pela redução do fluxo salivar. Os autores concluíram que o tratamento radioterápico de pacientes com câncer pode provocar efeitos indesejáveis no organismo e que o CD tem papel fundamental na detecção e abordagem dessas sequelas.

O estadiamento clínico do tumor e a disseminação de sua extensão são os melhores indicadores do prognóstico do paciente (NEVILLE et al.,2004) De acordo com TEIXEIRA et al.(2009) a maioria dos pacientes portadores de câncer bucal chegam aos centros de tratamento já com o estadiamento avançado e precisam ser submetidos a tratamentos mais agressivos como a cirurgia e radioterapia que podem levar a um comprometimento da sobrevida e qualidade de suas vidas.

Esse estadiamento avançado pode ser resultado tanto da dificuldade de acesso aos serviços de saúde por parte da população como a falta de efetividade da rede de atenção básica e inabilidade dos profissionais que nela trabalham em diagnosticar precocemente e realizar os encaminhamentos necessários (TEIXEIRA et al.,2009; MELO et al.,2010). Nenhuma outra área da saúde possui tanto foco na cavidade oral como a Odontologia, o que torna o cirurgião-dentista (CD) o principal responsável pela diminuição da incidência, morbidade e mortalidade do câncer bucal, bem como o diagnóstico precoce e repasse de informações para os pacientes (MELO et al., 2008).

O câncer bucal possui implicações de grande alcance social, econômico e de direitos humanos por afetar pessoas de todas as idades e muitas delas em fase produtiva. Constitui-se assim, um grande desafio ao desenvolvimento cuja prevenção é a forma mais econômica e sustentável de reduzir o seu ônus em longo prazo. Por isso, torna-se essencial a criação de programas que promovam a adoção de estilos de vida saudáveis pela população, com a redução no consumo de tabaco, álcool, dieta pouco saudável e falta de exercício físico.

Também se faz importante a tomada de consciência e educação da população quanto aos demais fatores de risco e ao reconhecimento dos sinais e sintomas, possibilitando um diagnóstico em tempo hábil, aumentando as chances de cura (INCA, 2013).

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Referências :

  • RAPOPORT A, KOWALSKI LP, HERTER NT, BRANDÃO LG,WALDER F. Rastreamento, Diagnóstico e Tratamento do Câncer de Boca. Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço. 2011
  • FREITAS, D. A. et al.Sequelas bucais da radioterapia de cabeça e pescoço. Rev CEFAC.,13(6), p. 1103-08, 2011.
  • INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER. Disponível em: http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home+/boca/definicao. Acesso em 09 mar. 2013.
  • NEVILLE, B. W. et al.Patologia Oral e Maxilofacial.2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.
  • PRADO, N. F.; PASSARELLI, D. H. C. Uma nova visão sobre prevenção do câncer bucal no consultório odontológico. Revista de Odontologia da Universidade Cidade de São Paulo., 21(1), p. 79-85, 2009
  • MELO, A. U. C. et al.Informação e comportamento de cirurgiões- dentistas do Programa Saúde da Família de Aracaju a respeito de câncer bucal. Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço., 2(37), p. 114-9, 2008.
  • TEIXEIRA, A. K. M. et al.Carcinoma Espinocelular da Cavidade Bucal: um Estudo Epidemiológico na Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza. Revista Brasileira de Cancerologia., 55(3), p. 229-236, 2009
  • LE CAMPION, et al. Diagnóstico de Câncer de boca e orofaringe. Cad. Saúde Colet., 2016, Rio de Janeiro, 24 (2): 178-184