Em tempos de Covid-19, houve um grande aumento da ocupação de leitos em UTI no mundo todo e do uso de respiradores artificiais, sendo o mais utilizado o respirador mecânico com pressão expiratória final (PEEP). Diante de tal problemática mundial da saúde, existe um fator extremamente importante a se considerar em se tratando nesse perfil de paciente que é justamente a Pneumonia Nosocomial (PN). Por quê que estou abordando isso?
É coerente afirmar que em ambiente hospitalar, o paciente está exposto a adquirir infecções oportunistas/secundárias devido sua condição sistêmica comprometida e também aos tipos de procedimentos e exames realizados durante esse período de internação como: uso prolongado de medicamentos, equipamentos de auxílio para respiração por ventilação mecânica e, principalmente, a higiene bucal insuficiente podem provocar alterações na microbiota oral de um paciente internado, com destaque nos que passam por períodos maiores de internação.
Todos esses fatores podem levar a complicações orais, corroborando para um agravamento do quadro sistêmico (ou clínico). A PN pode ser responsável por até 50% de mortes de pacientes internados em UTI. Levando-se em conta ao nosso atual cenário da saúde mundial, a PN merece um cuidado mais do que especial para evitar o agravamento da saúde de um paciente internado devido ao Covid-19.
Primeiramente: do que se trata a Pneumonia Nosocomial?
É uma infecção debilitante principalmente em pacientes idosos ou que estão em quadro de imunossupressão. Ela pode produzir vários sinais e sintomas como: respiração curta e rápida, tosse, produção de secreção, febre, fadiga e dores no peito. Para que esse tipo de infecção ocorra, sua principal porta de entrada é o trato respiratório superior, onde o paciente acaba que aspirando esses microrganismos por meio da secreção da orofaringe.
A impossibilidade de manter uma higiene bucal adequada e dos aparelhos que auxiliam na respiração artificial, acaba que tornando – se um sítio propenso ao acúmulo de bactérias; a aspiração desses microrganismos induz ao agravamento do quadro respiratório do paciente internado. Mas aí, caro leitor, você pode levantar a seguinte indagação: ‘’ Indivíduos que não estão internados podem aspirar secreções contendo microrganismos, não?’’ Corretíssimo. A aspiração de pequenas quantidades é comum no nosso dia a dia, sobretudo durante o sono.
Entretanto, a presença desses microrganismos associados a outros fatores importantes característico de um paciente em UTI como: imunidade baixa, alteração do fluxo salivar, desordem endócrina, higiene bucal deficiente, uso prolongado de antibióticos, corticoides e lesões em mucosa oral irão intensificar o estabelecimento dessas infecções.
Trazendo para a odontologia, devemos nos atentar em algumas questões. A impossibilidade do autocuidado da cavidade oral e a presença do tubo endotraqueal – barreira física para uma adequada higienização bucal- irão favorecer ao desequilíbrio da microbiota residente ou nativa. Agora você soma esses fatores com a possibilidade de adquirir diversos tipos de doenças infecciosas que irão comprometer a saúde geral do paciente.
E, por fim, a vulnerabilidade de um paciente que está internado na UTI, no qual salientei anteriormente, e a todos aqueles fatores que estão propensos a um paciente internado em leito de UTI. Você pode ver que uma situação liga à outra e se não vermos o indivíduo de uma forma multifatorial, o prognóstico torna-se bastante desfavorável.
A higienização bucal torna-se imprescindível para o combate do aumento microbiano nesse tipo de paciente. Evitando a formação de placa bacteriana e estabelecimento de infecções orais. Tudo isso irá atuar na prevenção de uma pneumonia nosocomial. Uma forma de atuar nessa higienização é o uso de Clorexidina. É um agente antisséptico bactericida de largo espectro, de atividade antimicrobiana e antifúngica, que irá atuar contra bactérias tanto Gram-negativas quanto Gram-positivas.
Na literatura atual, existem diversos protocolos em relação ao uso de clorexidina, nas mais diversas variações como de 0,12, 0,2% e 2%. Porém o uso de clorexidina a 0,12% segundo estudo de Vilela et al., mostrou-se ser o método mais eficaz, quando comparado à escovação dental, de higienização em pacientes internados na UTI.
Tal concentração não irá promover uma agressão à mucosa oral e não permite o deslocamento dessa microbiota para região de orofaringe posterior quando comparado à escovação mecânica. Você pode notar como é importante a presença de um cirurgião-dentista em âmbito hospitalar.
Falando nisso, vamos discutir um pouco sobre o papel do Cirurgião-Dentista na UTI:
Como foi salientado no início da coluna, o paciente que está internado no hospital requer cuidado intensivo sobre sua saúde de forma sistêmica. E, muitas vezes, o cuidado sobre a higiene oral passa despercebido, possivelmente por não possuir profissionais habilitados tratando-se da cavidade oral. Sendo assim, o indivíduo que está totalmente dependente desse profissional para a realização de higienização oral estará impossibilitado de manter um grau de higiene adequado durante o tempo em que estará internado. Logo, a aquisição de um cirurgião-dentista para que possa atuar junto à equipe clínica de profissionais em unidade hospitalar.
Com isso, abordarem o paciente de uma maneira completa, promovendo uma maior integração da Odontologia e Medicina. Visto que vimos a importância que os cuidados orais possuem para um melhor prognóstico na enfermidade que o pacientes se encontram.
Na tabela 1 de GOMES, Sabrina Fernandes & ESTEVES, Márcia Cristina Lourenço, podemos ver os procedimentos de higiene que podem ser realizados em pacientes internados.
Parece óbvio salientar para vocês sobre a importância que o profissional da odontologia no âmbito hospitalar e que sua presença deveria ser obrigatória. Porém, não é dessa forma que a nossa realidade se encontra. Estudos e levantamentos mostram que são poucos hospitais que possuem cirurgiões-dentistas como membros efetivos das equipes profissionais. Não vamos entrar no mérito da discussão do motivo desse cenário.
Com isso, é de extrema importância a presença do cirurgião-dentista no combate às infecções orais e, sobretudo, de casos específicos como a pneumonia nosocomial. Tais ações irão proporcionais melhores condições de saúde do paciente, podendo muitas vezes salvar até vidas.
Até a próxima!
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Referências Bibliográficas
1. GOMES, Sabrina Fernandes & ESTEVES, Márcia Cristina Lourenço. Atuação do cirurgião-dentista na UTI: um novo paradigma. Rev. bras. odontol., Rio de Janeiro, v. 69, n. 1, p. 67-70, jan./jun. 2012.
2. OLIVEIRA T. F. L. et al. Fatores associados à pneumonia nosocomial em indivíduos hospitalizados. Rev Assoc Med Bras 2011; 57(6):630-636.
3. SANTI S. S. A prevalência da pneumonia nosocomial e sua relação com a doença periodontal: revisão de literatura. RFO, Passo Fundo, v. 21, n. 2, p. 260-266, maio/ago. 2016.
4. Vilela MC, Ferreira GZ, Santos PS, Rezende NP. Cuidados bucais e pneumonia nosocomial: revisão sistemática. Einstein. 2014.