Palavras-chaves: Pandemia. Coronavírus. Profissionais da saúde. Emocional.
Como prever o início de uma pandemia? O diagnóstico clínico e os protocolos assistenciais podem inicialmente camuflar um perigo iminente? O início de um surto ou um aviso para os sistemas públicos de saúde e toda a população? Dezembro de 2019 será o marco inicial da maior crise vivida pela geração do século XXI?
Uma pandemia pode favorecer repercussões de ordem psicológica e psiquiátrica entre os indivíduos, observando-se níveis exacerbados de estresse, ansiedade, medo e raiva. Especificamente, o medo é considerado como um mecanismo natural de defesa, sendo importante para a sobrevivência por envolver processos biológicos que permitem a resposta rápida aos eventos potencialmente ameaçadores. Entretanto, quando crônico ou desproporcional, pode trazer prejuízos à qualidade de vida do indivíduo, desencadeando
vários transtornos psiquiátricos 1 .
O primeiro caso relatado de uma “nova pneumonia” foi reportado no dia 1° de dezembro de 2019 2 , mas foi apenas dia 31 do mesmo mês que a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou 27 casos dessa “nova pneumonia” com etiologia desconhecida, sendo todos identificados na cidade de Wuhan, província de Hubei, China. Os sintomas clínicos eram relacionados à tosse seca, dor de garganta, febre, dispneia e infiltrados pulmonares bilaterais em exame de tomografia computadorizada. Todos esses casos estavam ligados ao Mercado Atacadista de Frutos do Mar de Huanan, local comercial de espécies vivas de animais como aves, morcegos e cobras 3,4 .
Em 7 de janeiro de 2020, foi identificado o agente causador dessa nova pneumonia através de uma análise sequencial de amostras do trato respiratório dos casos surgidos, sendo nomeado de coronavírus da síndrome respiratória aguda grave 2 (SARS-CoV-2, do inglês, Severe acute respiratory syndrome coronavirus 2).
A SARS-CoV-2 é o sétimo coronavírus identificado por causar infecção humana, apresentando alta taxa de mortalidade entre idosos, principalmente aos que apresentam comorbidades de hipertensão, diabetes, insuficiência renal e doenças pulmonares. A doença do coronavírus de 2019 foi nomeada de COVID-19 (do inglês, Corona Virus Disease 2019) pela OMS e até o presente momento, não há registros sobre o paciente zero 2,4 .
Em 30 de janeiro de 2020, a doença respiratória aguda do COVID-19 foi declarada pela OMS como uma emergência de saúde pública de interesse internacional, apresentando-se de alto risco para países com sistemas de saúde frágeis 3,4 . O comitê de emergência destacou que os principais métodos para conter a disseminação estavam na detecção precoce, isolamento, tratamento imediato e implementação de sistema de rastreamento dos contatos 3 .
Em 11 de março de 2020, foi declarada pela OMS, a situação de pandemia do novo coronavírus SARS-CoV-2. A última vez que a organização decretou esse estado foi com o H1N1 em 2009 5 . A atual pandemia está se espalhando a uma taxa acelerada com um número básico de reprodução (R0) de 2–2,5, indicando que 2-3 pessoas são infectadas por um único indivíduo. Além disso, a carga viral em pacientes afetados permanece infecciosa por duas semanas após a cessação dos sintomas 6 .
As taxas de morbimortalidade e o impacto socioeconômico exigiram estratégias drásticas em todos os continentes, incluindo bloqueios em todo o país e fechamentos de fronteiras. Em 7 de junho de 2020, existem mais de 6 milhões de casos confirmados de COVID-19 em todo o mundo, com aproximadamente 400.000 mortes relacionadas 6,7 .
A COVID-19 é transmitida, especialmente, por gotículas respiratórias e pelo contato próximo entre humanos, potencializando ainda mais o risco de exposição dos profissionais da saúde ao novo vírus 8 . Nos primeiros dias do surto na província de Hubei, mais de 3.000 trabalhadores médicos foram infectados, correspondendo a 40% em hospitais e 60% em comunidades 9 .
Estudos demonstraram que a equipe assistencial, como médicos e enfermeiros, enfrentam situações de depressão e ansiedade diante deste novo surto, podendo estar relacionado ao aumento da demanda de pacientes, no qual os profissionais que não são especializados em doenças infecciosas, consequentemente, unem-se aos demais para oferecer um cuidado adequado aos infectados 8 , potencializando o estresse substancial em curto prazo e um esgotamento a longo prazo 10 .
Aspectos como excesso de responsabilidades e jornada de trabalho, conflitos de relação interpessoal, desgaste físico e emocional, já fazem parte do âmbito laboral dos profissionais da saúde 11 , entretanto, com o cenário pandêmico atual, a intensidade do impacto se tornou maior diante das interrupções no sono, fadiga física e mental constantes, e, o mais importante, a preocupação de ser o transmissor dessa nova doença no ambiente familiar 12 .
Os profissionais de enfermagem sempre desempenharam atuações frente à prevenção de infecções, controle de infecções, isolamento, contenção e saúde pública. O compromisso em estar na linha de frente, colocando suas vidas em risco, demonstra o amor não apenas a sua profissão, mas o de salvar vidas, independente de etnia, status social, gênero, idade ou ideologias 9 .
Recomenda-se, diante disso, o monitoramento das necessidades físicas e psicológicas dos profissionais da saúde envolvidos no atendimento com COVID-19, fornecendo apoio e recursos emocionais com o intuito de atenuar o impacto negativo do estresse causado pela situação de emergência do novo vírus. Outra importante estratégia é reconhecer a escassez de recursos humanos e materiais, nos quais levam ao aumento da jornada de trabalho e, consequentemente, potencializam os riscos ocupacionais 13 .
A implementação de políticas públicas de saúde mental juntamente com as estratégias de resposta para epidemia e pandemia, seja antes, durante ou após o evento, são extremamente necessárias. Visto que, as principais causas de morbimortalidade no mundo não são apenas pelo agente pandêmico, mas sim pelos fatores psicológicos que o potencializam 1 .
Uma pandemia dessa proporção, vivenciada atualmente, ocorre a cada 100 anos 11 . Gerações passadas estiveram diante de outros surtos pandêmicos, aprendendo a lidar com atitudes básicas de higienização e suporte assistencial público conforme a sua realidade temporal.
Atualmente, percebe-se que, mesmo após anos, a sociedade e os governantes ainda não estão preparados para lidar com uma pandemia. Será que nunca estarão? Aprendizados foram e estão sendo obtidos, mesmo que diante de muitas vidas.
Uma batalha para ser vencida com êxito, necessita-se de experiência e táticas estratégicas. Sabemos que esse é o momento para se dedicar o suficiente e planejar pró-ativamente na abordagem de próximos eventos como esse.
Enquanto isso, as batalhas pandêmicas continuarão sendo travadas pelos guerreiros de jaleco branco e, em seu momento mais individual, a batalha emocional terá apenas um vencedor: seu próprio “eu”.
Referências
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2. Lian J, Jin X, Hao S, Cai H, Zhang S, Zheng L, et al. Analysis of Epidemiological and Clinical Features in Older Patients With Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) Outside Wuhan. Clinical Infectious Diseases. Mar 2020; 1-8. Doi: 10.1093/cid/ciaa242.
3. Sohrabi C, Alsafi Z, O’Neill N, Khan M, Kerwan A, Al-Jabir A, et al. World Health Organization declares global emergency: A review of the 2019 novel coronavirus (COVID- 19). International Journal of Sugery. Apr 2020; 76, 71-76. Doi: 10.1016/j.ijsu.2020.02.034.
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8. Wu Y, Wang J, Luo C, Hu S, Lin X, Anderson AE, et al. A Comparison of Burnout Frequency Among Oncology Physicians and Nurses Working on the Frontline and Usual Wards During the COVID-19 Epidemic in Wuhan, China. Journal of Pain and Symptom Management. Apr 2020; 1-6. Doi: 10.1016/j.jpainsymman.2020.04.008.
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