Depressão e ansiedade entre estudantes universitários: precisamos falar sobre isso

A depressão, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), pode ser definida pela tristeza, perda de interesse e prazer, distúrbios do sono, distúrbios alimentares, sentimento de culpa, baixa autoestima, sensação de cansaço e dificuldade de concentração. Esta se apresenta de duas maneiras: duradoura e recorrente e afeta diretamente na capacidade de lidar com atividades do cotidiano. Em casos mais severos, a depressão pode levar também ao suicídio.

Os transtornos de ansiedade, por sua vez, apresentam sentimentos exacerbados de medo e ansiedade como sintomas em comum. Este grupo consiste em ansiedade generalizada, síndrome do pânico, fobias, ansiedade social, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e transtorno do estresse pós-traumático (TEPT).

Em 2015, estimou-se que 4,4% em média da população mundial foi acometida pela depressão, sendo mais prevalente no gênero feminino (5,9%). O fenômeno também ocorre com os transtornos de ansiedade, onde os níveis da população mundial e do gênero feminino são 3,6% e 4,6%, respectivamente. Neste mesmo ano, 1,5% das mortes teve como causa o suicídio, equivalendo ao número de 788.000 mortes. Ainda segundo a OMS, adolescentes e jovens adultos compuseram a principal faixa etária acometida (15-29 anos).

A vida acadêmica, especialmente de alunos ingressantes, requer habilidades cognitivas e controle emocional complexos. A deficiência destes elementos pode acarretar estresse, aumento excessivo dos níveis de ansiedade e impactar severamente a qualidade de vida dos estudantes, assim como seu desempenho acadêmico.

Para os universitários da área da saúde, esses transtornos ganham um novo panorama e podem impactar substancialmente na sua relação com os pacientes e consequentemente na qualidade do atendimento. Um estudo transversal analítico realizado numa instituição de ensino superior no nordeste brasileiro demonstrou que a prevalência de depressão e ansiedade nos estudantes da área de saúde foi superior à de estudantes das demais áreas do conhecimento. O adoecimento psíquico dos estudantes da saúde pode ser explicado pela exposição frequente às situações estressoras inerentes à área da saúde bem como a falta de informação acerca de saúde mental durante a graduação.

Uma pesquisa com 222 estudantes de Odontologia na Malásia ratifica que as altas prevalências de depressão e ansiedade se relacionam com o estresse relativo ao estudo e pelo somatório de fatores estressantes específicos do curso de Odontologia aos fatores do cotidiano dos estudantes. A insatisfação pela escolha do curso, quantidade insuficiente do sono, relacionamento familiar e com colegas e docentes foram citados como fatores associados ao risco de depressão.

Um questionário de pesquisa transversal realizado em um grupo de 600 estudantes dos cursos de Medicina, Odontologia e Farmácia de uma universidade americana evidenciou que o vício ao uso de Internet está intrinsicamente relacionado com estresse, depressão, baixa autoestima, transtornos de humor e distúrbios do sono. É possível inferir ainda que o uso excessivo de celulares smartphones possui um comportamento similar.

Os anos iniciais da graduação apresentam os maiores índices de depressão, estresse e ansiedade, possivelmente devido à ingressão no novo ambiente de aprendizado. Todavia, estes índices diminuem progressivamente uma vez que os alunos encontram métodos de enfrentamento mais eficazes durante a graduação.

Estudos demonstram que as mulheres estão mais susceptíveis ao estresse. O quadro é fortemente influenciado por ações hormonais como alterações no ciclo menstrual. Este comportamento abrange também as estudantes universitárias. Pesquisas realizadas com estudantes no Brasil, assim como em outros países, corroboram que a maioria dos estudantes acometidos pertence ao gênero feminino.

A literatura sugere que programas de intervenção psicológica ofertados pela própria instituição de ensino são eficazes para a identificação e manejo dos quadros clínicos de estresse e ansiedade através de terapia cognitivo- comportamental, bem como atividades extracurriculares, programas de redução de estresse e estímulo ao descanso e tempo adequado de sono.

Um estudo realizado numa faculdade de Odontologia na Arábia Saudita revela que estudantes dessa área podem apresentar níveis de depressão até três vezes maiores do que estudantes de medicina. O estresse advém da grande quantidade de informações e habilidades técnicas inerentes à formação que os alunos devem desenvolver neste período.

Estudantes com sintomas severos de depressão estão mais susceptíveis à automutilação e ideação suicida. Este quadro possui uma alta prevalência entre universitários e uma relação significante com estresse, irritabilidade, raiva e desespero. No entanto, apenas uma pequena parcela recebe tratamento psiquiátrico satisfatório. Uma vez que a graduação geralmente ocorre em um momento crítico de transição entre a adolescência e a vida adulta, os fatores estressantes oriundos desse período podem se apresentar como fatores de risco proeminentes para ideação suicida e tentativas de suicídio.

As universidades e alunos devem ser educados a respeito dos sinais e sintomas físicos e psicológicos da depressão e ansiedade e implementar estratégias de prevenção e manejo do estresse. O surgimento de transtornos de ordem psicológica durante a graduação pode implicar no comprometimento da futura atuação profissional e relacionamentos interpessoais.

Nesse contexto, muitas medidas têm sido adotadas para amenizar os prejuízos psíquicos, emocionais e cognitivos desencadeados pelos fatores estressantes provenientes da vida acadêmica. A psicologia positiva busca contribuir no processo de amadurecimento do aluno através de vivências de otimismo, engajamento, motivação, autodeterminação e autoestima que favorecem a regulação emocional, empatia, adaptação social e resiliência.

As práticas integrativas e complementares tornam-se aliadas no reestabelecimento do equilíbrio psicológico, físico e emocional de estudantes. Um estudo de intervenção com estudantes de Enfermagem no Espírito Santo permitiu inferir que o Reike auxilia na atenuação da intensidade do estresse, assim como de dores corporais. Essa terapia consiste numa prática de baixo custo e de fácil incorporação ao ambiente acadêmico.

A meditação e a prática da Atenção Plena (Mindfulness) pode ser utilizada como forma de oferecer estratégias de enfrentamento aos fatores estressores, redução da ansiedade e auxilia na concentração. Esta pode ser, igualmente, incorporada ao ambiente acadêmico em forma de breves sessões prévias às atividades didáticas.

A busca por acompanhamento psicológico profissional e prática regular de atividade física deve ser fomentada pelas instituições formadoras de profissionais da saúde, bem como de outras áreas, tendo em vista a humanização do processo de ensino e seu impacto no futuro exercício profissional. Cabe às essas escolas ofertar ações pedagógicas de caráter urgente que acolham e atendam às demandas psicológicas e emocionais dos estudantes e futuros profissionais da saúde a fim de promover resiliência e adequada capacitação para se lidar com a saúde humana.

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