Tratamento da Tuberculose | Tudo o que você precisa saber

As principais infecções micobacterianas que acometem os seres humanos são a tuberculose e hanseníase, também conhecida como lepra, são infecções crônicas causadas pelo Mycobacterium tuberculosis e M. leprae, respectivamente (RANG et al., 2016).

A tuberculose (TB) é uma enfermidade infecto-contagiosa, que se propaga pelo ar por meio de gotículas contendo bacilos excretados por um doente ao tossir, espirrar ou falar em voz alta e que, ao serem inalados por pessoas saudáveis, provocam a infecção tuberculosa localizada no pulmão que pode permanecer latente ou evoluir para o estado de doença e, inclusive, posteriormente disseminar para outras partes do corpo como meninges, rins, ossos e linfonodos (SOUZA et al., 2015; MENDES; Fensterseifer, 2004).

O principal sintoma dessa doença é a tosse com presença de secreção (tosse produtiva) ou sem presença (tosse seca) por três semanas ou mais. Sendo que a febre vespertina, sudorese noturna e dor torácica podem estar presentes, além de manifestações gerais como astenia, anorexia e também emagrecimento (BRASIL, 2011).

Os métodos de diagnósticos utilizados com mais frequência são a radiografia do tórax que geralmente revela lesões no lobo superior dos pulmões e a baciloscopia e a cultura do escarro que detectam a presença do bacilo. A procura de casos e a quimioterapia efetiva continuam sendo as principais condutas de controle da tuberculose (Smeltzer; Bare, 1999).

No Brasil, a problemática do tratamento da TB está na alta taxa de abandono. A grande preocupação com a efetividade do tratamento deve-se ao fato de que tratamentos irregulares, além de não curarem os doentes, podem transformá-los em casos resistentes às drogas usuais (Veronesi; Focaccia, 1997).

Neste artigo você vai entender melhor o esquema de tratamento utilizado para a  infecção tuberculose causada pelo microorganismo Mycobacterium tuberculosis aprendendo sobre cada medicamento incluso na sua farmacoterapia.
 
Mas antes, para você entender melhor falaremos sobre as micobactérias e suas particularidades que influenciam na escolha da faramcoterapia.

 
AS MICOBACTÉRIAS

São resistentes à maioria dos antibióticos, por crescerem mais devagar os fármacos que agem combatendo às celulas de crescimento rápido são relativamente ineficazes, por conta da sua parede rica em lipídios tornando-a impermeável, além disso são capazes de ficarem latentes fazendo com que morram mais lentamente ou se tornem totalmente resistentes. É por isso que torna-se necessária a combinação de fármacos (KATZUNG et al., 2014).

Outra característica das micobactérias é que possuem bombas de efluxo na membrana celular, cuja ação consiste em bombear para fora do citoplasma os agentes químicos possivelmente prejudiciais (BRUNTON et al., 2012).
 

FARMACOTERAPIA

O tratamento da tuberculose tem como objetivo a cura e a rápida redução da transmissão da doença. Para que isso ocorra, os fármacos utilizados devem ser capazes de reduzir rapidamente a população bacilar (interrompendo
a transmissão), prevenir a seleção de cepas naturalmente resistentes (impedindo o surgimento de resistência durante a terapia) e esterilizar a lesão (prevenindo a recidiva de doença) (RABAHI et al., 2017).

O fornecimento de medicamentos para o tratamento da tuberculose é realizado gratuitamente, garantido pelo Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT), e não estão disponíveis comercialmente. Esses medicamentos são largamente distribuídos na rede de saúde pública, mas são entregues ao paciente apenas se for apresentada a ficha de notifcação preenchida pelo profissional de saúde que firma o diagnóstico de tuberculose e prescreve os medicamentos (BRASIL, 2011).

Os fármacos de primeira linha utilizados no tratamento são: a isoniazida (INH), a rifampicina (ou outras rifamicinas), a pirazinamida, o etambutol e a estreptomicina. A combinação utilizada é isoniazida, rifampicina e pirazinamida na primeira fase que dura em torno de 2 meses, e caso haja suspeita de resistência é adicionado o etambutol. Já na segunda fase, que dura cerca de 4 meses, são utilizadas a isoniazida e rifampicina (RANG et al., 2016).

ISONIAZIDA

É o mais ativo e bastante solúvel em água. Ela tem ação bacteriostática para os bacilos que se multiplicam mais lentamente, e bactericida para os que se multiplicam rapidamente (SILVA, 2010).

Ela penetra nos macrófagos através da difusão passiva e é eficiente contra organismos extra e intracelulares. Seu mecanismo de ação se dá pela inibição da síntese de ácidos micólicos, componentes essenciais nas paredes celulares micobacterianas (KATZUNG et al., 2014).

Quando o M. tuberculosis é submetido a concentrações crescentes de INH, desenvolve-se resistência, devido a uma mutação dentro do gene bacteriano inhA, envolvido na biossíntese do ácido micólico (SILVA, 2010).

É um prófármaco que deve ser ativado pelas enzimas bacterianas antes de poder exercer sua atividade inibitória. É metabolizada pela enzima hepatica arilamina N-acetiltransferase do tipo 2, é rapidamente absorvida no trato gastrointestinal, sua distruibuição se dá através de fluidos corporais e tecidos, e é excretada na urina (RANG et al., 2016). Sua biodisponibilidade é de 100% para a dose máxima de 300mg, sendo a dose diária total normal de 5mg/kg (BRUNTON et al., 2012).

Reações de hipersensibilidade à INH são incomuns, mas podem ocorrer, tais como febre, erupções cutâneas, e um processo de vasculite acompanhado pela presença de anticorpos antinucleares, simulando um quadro de lúpus eritematoso. Reações hematológicas como eosinofilia, anemia, agranulocitose, trombocitopenia e manifestações articulares também podem ocorrer. A suspensão da droga faz desaparecer tais complicacões. As reações mais importantes se relacionam com o sistema nervoso central e periférico. A neurite periférica ocorre em cerca de 2% dos pacientes que usam 5 mglkg de peso/dia, esse efeito é mais frequente em pacientes acetiladores lentos, portadores de diabetes melittus, desnutridos e anêmicos e pode ser evitado adiministrando piridoxina. O uso de INH pode provocar lesão hepática, que é rara em pacientes com <20 anos, aumentando o risco com o passar do tempo (SILVA, 2010; BRUNTON et al., 2012).

Os antiácidos que contêm alumínio podem interferir na absorção da INH (SILVA, 2010). Além disso, devido a inibição das enzimas CYP2C9, CYP3A e CYP2D6 e indução de CYP2E1 há um efeito em fármacos metabolizados por essas enzimas como por exemplo, diazepam, carbamazepina, paracetamol, varfarina, entre outros (BRUNTON et al., 2012).

RIFAMPICINA

De acordo com Silva (2010) é solúvel em solventes orgânicos e na água com pH ácido, é ativa inibindo o crescimento contra a maioria das bactérias Gram-positivas, inclusive S. aureus e S. coagulase-negativo. Tem ação contra muitas bactérias Gram-negativas.

A rifampicina penetra nos bacilos, podendo eliminar micro-organismos intracelulares, de forma concentração dependente, chegando a concentrações de equilíbrio em 15min, então se liga à subunidade β da RNA polimerase dependende de DNA (rpoB) para formar um complexo fármacoenzima estável, essa ligação impede a formação da cadeia na síntese de RNA (BRUNTON et al., 2012).

É um fármaco administrado oralmente, distribuída nos tecidos e fluidos, parcialmente excretada na urina e bile, o que faz sofrer recirculação entero hepática que é posteriormente excretado nas fezes, e mal absorvido pelo trato gastrointestinal. Liga-se altamente a proteínas. (KATZUNG  et al., 2014; RANG et al., 2016).

Os efeitos adversos mais recorrentes são erupções cutâneas, febre, e distúrbios gastro intestinais, pode deixar lágrimas, suor e urina alaranjados, é necessária realização da avaliação da função hepática antes do início do tratamento, pois pode acarretar a danos no fígado. Efeitos como hemólise, hemoglobinúria, hematúria e insuficiência renal são raras, vem sendo documentada proteinúria de cadeia leve (SILVA, 2010; RANG et al., 2016).

Pelo efeito indutor de enzimas hepáticas como as CYP 1A2, 2C9, 2C19 e 3A4,  a rifampicina pode degradar alguns medicamentos metabolizados hepaticamente como estrógenos, varfarina, analgésicos narcóticos e glicocorticóides (BRUNTON et al., 2012; RANG et al., 2016).

ETAMBUTOL

Fármaco sintético, solúvel em água e termoestável sem atividade a outras bactérias.Utilizado de forma isolada pode criar resistência das bactérias (KATZUNG  et al., 2014).

Seu mecanismo de ação se dá através da inibição arabinosil transferase III, impedindo sua transferência para síntese de arabinogalactan, o que modifica prejudicialmente a parede celular das micobactérias (BRUNTON et al., 2012).

O etambutol é administrado oralmente na dose de 15 a 25 mg/kg de peso/dia, em tomada única, sendo a dose máxima para adultos de 1.200 mg/dia. 80% do fármaco é absorvido pelo trato gastrointestinal, meia vida de 3 a 4h, e a principal via de excreção é a renal (SILVA, 2010).

De acordo com Rang e colaboradores (2016) o efeito colateral mais significativo é a neurite ótica que faz com que haja distúrbios visuais por alteração de cores. Já Silva (2010) relata que podem ocorrer problemas de hipersensibilidade. Pode ser usado em crianças e gestantes: nenhum efeito teratogênico foi reportado até hoje.  

PIRAZINAMIDA

Segundo Katzung e colaboradores (2014) a pirazinamida é estável e um pouco hidrossolúvel, inativa em pH neutro exercendo sua atividade contra micobactérias que residem no ambiente ácido dos lisossomas, intracelulares.


A sua forma ativa é o ácido pirazinoico que rompe o metabolismo e as funções de transporte da membrana das micobactérias. A resistência a esse fármaco pode ser desenvolvida rapidamente. É administrado por via oral, na dose de 20 a 35 mg/kg de peso/dia, não devendo ultrapassar o máximo de 2 g/dia. Deve ser usado de preferência em dose única diária (KATZUNG et al., 2014).

Bem absorvidos pelo trato gastrointestinal e distribuído nos tecidos, até mesmo meninges inflamadas. Já a metabolização do composto original ocorre no fígado e a depuração dos metabólitos pelos rins (BRUNTON et al., 2012).

Os efeitos adversos mais comuns são desenvolvimento de gota iniciando com hiperuricemia, mal estar e transtornos gastrointestinais como náuseas e vômito, e até 5% dos pacientes podem ter problemas hepáticos, sendo o aumentos de transaminases alterações hepáticas mais precoces. A elevação dastransaminases acima de 3 vezes o normal ou icterícia implica que a droga deve ser interrompida (RANG et al., 2016; SILVA, 2010).

ESTREPTOMICINA

De acordo com Brunton e colaboradores (2012) a estreptomicina atua inibindo a síntese de proteínas se ligando a subunidade ribossômica 30S gerando erro durante a tradução do código genético, é ativa principalmente nos bacilos extracelulares. A sua resistência é atribuída a mutações genéticas.

É utilizado quando há resistência a outros fármacos e a dose é de 15mg/kg/dia  de forma intramuscular ou intravenosa. (KATZUNG et al., 2014).

Por ser um antibiótico macrolídeo suas reações adversas mais comuns são a ototóxicidade e a nefrotoxicidade, essa toxicidade é dependente da dose e mais comum em idosos (SILVA, 2010).

REFERÊNCIAS

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de vigilância em saúde. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Manual de recomendações para o controle da Tuberculose no Brasil. Brasília: 2011.

BRUNTON, L. L. (Org.); CHABNER, B. A.; KNOLLMANN, B. C. As Bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman & Gilman. 12. ed. Porto Alegre: AMGH, 2012.

CONDE, M. B. et al. III Diretrizes para Tuberculose da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. J Bras Pneumol, v. 35, n. 10, p. 1018-1048, Brasília, 2009.

KATZUNG, B. G.; MASTERS, S. B.; TREVOR, A. J. Farmacologia Básica e Clínica. 12. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014.

MENDES, A. M.; Fensterseifer, L. M. Bol Pneumol Sanit, v. 12, n. 1, p. 25-36, Porto Alegre, 2004.

Rabahi, M. F.; Silva-Júnior, J. L. R.; Ferreira, A. C. G.; Tannus-Silva, D. G. S.; Conde, M. B. Tratamento da tuberculose.  J Bras Pneumol.; v. 43, n.5, p. 472-486, Goiânia, 2017.

RANG, H.P; RITTER, J. M.; FLOWER, R. J.; HENDERSON, G. Farmacologia. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.

SILVA, P. Farmacologia. 8. ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010.

Smeltzer, S. C.; Bare, B. G. Tratado de Enfermagem Médico Cirúrgica. 8ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan SA; 1999.

Souza, E.; Barbosa, E.; Rodrigues, I.; Nogueira, L. Prevenção e controle da tuberculose: revisão integrativa da literatura. Rev Cuid, v. 6, n 2., p. 1093-1101, Pará, 2015.

Veronesi, R.; Focaccia, R. Tratado de Infectologia. São Paulo: Atheneu, 1997.