Inibidores da Bomba de Prótons | Tudo que você precisa saber

Os inibidores da bomba de Próton (IBP) são considerados pró-fármacos que necessitam de um ambiente ácido para serem ativados e exercerem o efeito desejado. A sua atuação se dá através de uma inibição irreversível da H+/K+- ATPase, que compõe a etapa final da via da secreção ácida.

São bastante adquiridos sem prescrição pelo fato de “protegerem o estômago” e seus efeitos adversos mais comuns serem passageiros e pouco danosos, sem o conhecimento de possíveis efeitos mais prejudiciais a longo prazo.

Fazem parte desta classe de medicamentos: o omeprazol, sendo o primeiro a ser introduzido na farmacoterapia gastrointestinal, o esomeprazol, o lansoprazol, o rabeprazol, o dexlansoprazol e o pantoprazol.
Todos os medicamentos inibidores da bomba de prótons atualmente aprovados são derivados do benzimidazol: moléculas orgânicas heterocíclicas que possuem tanto uma piridina quanto uma porção benzimidazol ligada por um grupo metilsulfinilo. O omeprazol, representante dessa estrutura, foi o primeiro IBP clinicamente útil (STRAND et al, 2017).

Neste artigo vamos abordar a farmacologia dos inibidores da bomba de prótons, tratando sobre seu mecanismo de ação, sua farmacocinética, seus efeitos adversos e suas interações medicamentosas.

Os fármacos IBP tem a capacidade de manter o pH intragástrico maior que 4,0 por 15 a 21 horas seguidas, sendo assim é possível serem administrados em dose única diária e modificarem a secreção ácida durante dois a três dias (ARAI; GALLERANI, 2011).

Após realização de inúmeros ensaios clínicos e metanálises foi possível chegar a conclusão de que os IBP são significativamente mais efetivos que antagonistas dos receptores H2, e antiácidos como hidróxido de alumínio, hidróxido de magnésio e misoprostol quando utilizados na prevenção ou cicatrização de úlcera causada por antiinflamatórios não esteroidais (AINEs) e outros distúrbios ácido-pépticos, que conforme Arai; Gallerani (2011), são os distúrbios nos quais há dois protagonistas, sendo eles o ácido gástrico e a pepsina, constituindo fatores patogênicos necessários, porém usualmente não suficientes.

Importante: Os IBP deverão ser administrados pelo menos 30min. antes da realização da alimentação, pois esta irá estimular a produção da gastrina, que ativará a bomba H+/K+ ATPase tornando o ambiente ácido (pH ~1) possibilitando a ativação da pró-droga (PAZ; RODRIGUEZ;  MORAES-FILHO, 2008).

Para entender um pouco melhor sobre como funcionam os inibidores da bomba de prótons é necessário saber como ocorre a secreção de ácido gástrico. Este é um processo contínuo e complexo, em que múltiplos fatores centrais e periféricos contribuem para uma meta comum: a secreção de H+ pelas células parietais. Os fatores neuronais (acetilcolina ACh), parácrinos (histamina) e endócrinos (gastrina) regulam a secreção de ácido. Seus receptores específicos localizam-se na membrana basolateral das células parietais no corpo e no fundo gástrico (BRUNTON et al., 2012). Segundo Lima e Neto-Filho (2013) as estruturas mais importantes para a estimulação da secreção de ácido gástrico no Sistema Nervoco Central (SNC) incluem o núcleo motor dorsal do nervo vago, o hipotálamo e o núcleo do trato solitário.

A concentração extremamente elevada de ácido no lúmen gástrico requer mecanismo eficaz de defesa para proteger o esôfago e o estômago, ocorrendo então a secreção de uma camada de muco.

Existem variações da forma farmacêutica disponível dos IBP, como por exemplo injetáveis, comprimidos com revestimento entérico de liberação prolongada, comprimidos de desintegração rápida, entre outros, com o intuito de  impossibilitar a degradação dos inibidores de bombas de prótons pelo ácido do lúmen gástrico, para isso eles são formulados com revestimento entérico que protege o fármaco do ambiente ácido:

  • Fármacos de revestimento entérico contidos em cápsulas de
    gelatina (omeprazol, esomeprazol e lansoprazol);
  • Grânulos de revestimento entérico fornecidos na forma de pó para suspensão (lansoprazol);
  • Comprimidos de revestimento entérico (pantoprazol, rabeprazol e omeprazol);
  • Fármaco em pó combinado com bicarbonato de sódio (omeprazol).

Os comprimidos de liberação retardada e de revestimento entérico só se dissolvem em pH alcalino, já o fármaco em pó de omeprazol combinado com bicarbonato de sódio apenas neutraliza o ácido do estômago; ambas as estratégias melhoram consideravelmente a biodisponibilidade oral desses fármacos ácido-lábeis.

Uma única injeção intravenosa de 80mg de pantoprazol inibe a produção de ácido em 80 a 90% dentro de 1h, e essa inibição persiste por um período de até 21 h, permitindo uma dose única ao dia para obter o grau desejado de de baixa acidez (BRAGA; SILVA; ADAMS, 2011; BRUNTON et al., 2012).

MECANISMO DE AÇÃO

Segundo Wannmacher (2004), os IBP atuam suprimindo a secreção de ácido gástrico através da inibição específica da enzima H+ /K+ -ATPase na superfície secretora da célula parietal gástrica, diminuindo em até 95% a produção diária de ácido gástrico.

O resultado é a inibição irreversível da secreção ácida da bomba de prótons. De acordo com Brunton e colaboradores (2012) e Penildon (2010), por possuírem liberação prolongada, essas drogas são liberadas dos grânulos no duodeno e após sua absorção na circulação sistêmica, o pró-fármaco difunde-se nas células parietais do estômago e acumulam-se nos canalículos secretores dos ácidos, onde são retiradas após ionizarem-se, e são ativadas pela formação de uma sulfenamida tetracíclica catalisada por prótons e um ácido sulfênico, que se ligam covalentemente a grupamentos sulfidrílicos localizados em pontos críticos do domínio extracelular (luminal) da bomba de prótons retendo o fármaco de modo que ele não pode difundir-se novamente através da membrana canalicular. A secreção ácida só retorna ao normal após síntese e inserção de novas moléculas da bomba de prótons na membrana apical das células parietais.

FARMACOCINÉTICA

No intestino delgado os inibidores da bomba de prótons sofrem rápida absorção, são metabolizadas pelas CYP hepáticas, CYP2C19 e CYP3A4, além de se ligarem fortemente a proteínas plasmáticas.

Apesar de pertencerem à mesma classe terapêutica, existem algumas diferenças em seus perfis farmacológicos. Ao contrário do omeprazol e do lansoprazol, o pantoprazol tem um perfil farmacocinético linear (e, portanto mais previsível), biodisponibilidade menos variável e um rápido início de ação (HARTMANN et al, 1996).

Mesmo que haja diferenças e/ou vantagens farmacocinéticas entre um  fármaco e outro da classe dos inibidores da bomba de prótons, todos eles  inibem fortemente a secreção de ácido gástrico, e não foram encontradas diferenças terapêuticas significativas entre eles.

INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS

Devido a sua metabolização pelo complexo enzimático do citocromo P450, CYP2C19 e CYP3A4, os IBP interagem com fármacos que possuem o mesmo mecanismo de metabolização através das mesmas enzimas, podendo aumentar ou diminuir a sua depuração.

Interações foram observadas com os fármacos varfarina, diazepam, que segundo Paz; Rodriguez e  MORAES-FILHO (2008) “a depuração do diazepam se reduz em 26% durante o tratamento com omeprazol, e ciclosporina, outrossim a diminuição da acidez gastrointestinal pode influenciar na biodisponibilidade de fármacos como cetoconazol, griseofulvina, ésteres de ampicilina e sais de ferro.

Quando usados em terapia conjunta, os inibidores da bomba de prótons causam uma redução na conversão de clopidogrel em sua forma ativa, reduzindo desse modo a eficácia do tratamento com esse medicamento, que é um importante agente antiagregante plaquetário.

EFEITOS ADVERSOS

São medicamentos com boa tolerância e os efeitos mais observados são cefaléia, diarréia (variável de acordo com idade e dose administrada) e distúrbios gastrintestinais, que são temporários. Alguns dos efeitos adversos pouco frequentes são a nefrite aguda intersticial, hiponatremia, hipopotassemia, hipomagnesemia, pancreatite e síndrome de Stevens-Johnson, síndrome de hipersecreção ácida de rebote, fraturas por fragilidade, nefrite intersticial, pneumonia, infecção entérica, sendo o mais preocupante os efeitos adversos a longo prazo por conta da acentuada supressão ácida que aumenta secreção da gastrina, causando hipergastrinemia (BRAGA; SILVA; ADAMS, 2011; HOEFLER; LEITE, 2009).

Acredita-se que o uso crônico de altas doses de fármacos inibidores da bomba de prótons afeta a absorção de cálcio, magnésio e vitamina B12, já que o ácido facilita a assimilação e a ionização de formas menos solúveis de dieta, e a liberação da vitamina B12 do seu estado ligado à proteína depende da acidez gástrica.

Um dos mecanismos de defesa contra microorganismos patogênicos colonizadores do estômago e intestino é  justamente sua inativação pela acidez gástrica, sendo assim há mudança na microflora quando há alteração do ácido gástrico, então com a sua  diminuição resultante da utilização destes medicamentos, há a possibilidade de que ocorra uma proliferação bacteriana aumentando a incidência de pneumonia tanto em pacientes internados como em pacientes ambulatoriais, de acordo com os estudos de Herzing et al (2009).

Importante: Seu uso requer acompanhamento de profissionais médico e farmacêutico, assim como estes devem orientar o paciente sobre os possíveis riscos do seu uso continuado;

Todos os medicamentos utilizados pelo paciente devem ser avaliados quanto a interação com os inibidores da bomba de prótons para evitar possíveis eventos adversos indesejados.

É necessária maior atenção de uso em pacientes com hipersensibilidade aos componentes da fórmula dos medicamentos, pacientes com doença hepática grave devido ao metabolismo hepático de primeira passagem do fármaco. 

REFERÊNCIAS

ARAI, A. E.; GALLERANI, S. M. C. Uso Crônico de Fármacos Inibidores da Bomba de Prótons: Eficácia Clínica e Efeitos Adversos. 2011. 61folhas. Monografia (Especialização em Farmacologia) – Centro Universitário
Filadélfia – Londrina

BRAGA, M. P.; SILVA, C. B.; ADAMS, A. I. H. Inibidores da Bomba de Prótons: Revisão e Análise Farmacoeconômica. Ahead of Print, Rio Grande do Sul, v. 37, n. 2, p. 19­-32, 2011.

BRUNTON, L. L. (Org.); CHABNER, B. A.; KNOLLMANN, B. C. As Bases

Farmacológicas da Terapêutica de Goodman & Gilman. 12. ed. Porto Alegre: AMGH, 2012.

Hartmann, M. et al. Twenty­four­hour intragastric pH profiles and pharmacokinetics following single and repeated oral administration of the próton pump inhibitor pantoprazole in comparison to omeprazole. Aliment Pharmacol Ther, v. 10, p. 359­-366, 1996.

HERZIG, S.J. et al. Acid-suppressive medication. Use and the risk for hospitalacquired pneumonia. The Journal of the American Medical Association, Boston, n. 301, p. 2120-2128, 2009.

HOEFLER, R.; LEITE, B. F. Segurança do uso contínuo de inibidores da bomba de prótons. Boletim Farmacoterapêutica, n. 1-2, jan./abr., 2009. 

LIMA, A. P. V.; NETO-FILHO, M. A. Efeitos em longo prazo de inibidores de bomba de prótons. Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research,  v. 5, n.3, p. 45-49, dez./ fev., 2013.

Malfertheiner, P.; Kandulski, A.; Venerito, M. Proton-pump inhibitors: understanding the complications and risks. Proton-pump inhibitors: understanding the complications and risks. Nature Reviews, set., 2017.

PAZ, K. D.; RODRIGUEZ, T. N.; MORAES-FILHO, J. P. Inibidores da Bomba Protõnica. Moreira Jr., São paulo, p. 46-51, 2008.

STRAND, D. S.; KIM, D.; PEURA, D. A. 25 Years of Proton Pump Inhibitors: A Comprehensive Review. Gut and Liver, v. 11, n.1, p. 27-37, jan. 2017.