Serie Casos Clínicos – Traumatismo Crânio Encefálico

Caso Clínico da Neuroliga UFJMV

HISTÓRIA CLÍNICA
Paciente de 72 anos e 8 meses de idade, sexo masculino, hipertenso, procedente do município de Sabinópolis, interior de Minas Gerais, é encaminhado para a unidade de pronto atendimento da cidade de Diamantina – MG, devido à queda que sofreu de escada, a uma altura de 2 metros. Acompanhantes relataram inconsciência de duração menor que 3 minutos no local e negaram a ocorrência de uma crise convulsiva. Paciente foi encaminhado para hospital local com alteração do nível de consciência, confusão mental e vômitos. Deu entrada neste serviço em regular estado geral, ainda com rebaixamento do nível de consciência e em Glasgow 11 (AO: 3 – RV: 2 – RM: 6). Nega alergias medicamentosas e não soube informar quais medicamentos faz uso contínuo.  

EXAME FÍSICO
ECTOSCOPIA: Hidratado, normocorado, anictérico, acianótico, afebril, eupneico e com boa perfusão tissular.
DADOS VITAIS: FC: 80 bpm, FR: 18 irpm, Temperatura: 37°C; PA: 120×70 mmHg (deitado, em membro superior direito).
CABEÇA: Sem achados dignos de nota em orelhas, olhos, nariz e cavidade oral. Ausência de linfonodomegalias palpáveis e sopro carotídeo.
SISTEMA NEUROLÓGICO: Sonolento, hipoativo, acamado. Pupilas isocóricas e fotorreativas. Hemiparesia braquiocrural a esquerda, densa, força grau 2+/5+ a esquerda, com predomínio em MIE.
APARELHO RESPIRATÓRIO: Ao ar ambiente, eupneico, sem esforço respiratório com expansibilidade preservada e murmúrio vesicular universalmente audível sem ruídos adventícios.
APARELHO CARDIOVASCULAR: Bulhas rítmicas e normofonéticas em 2 tempos, sem sopros.
APARELHO DIGESTÓRIO: flácido, normotenso, indolor à palpação e sem visceromegalias. Ruídos hidroaéreos presentes.
APARELHO GENITO-URINÁRIO: Sem alterações.

EXAMES COMPLEMENTARES
TCC de crânio: Sinusopatia maxilar esquerda (A), hiperdensidade intraparenquimatosa parietal direita (B), sem desvio de linha média. Cisternas de base livres. Também apresenta pequena hemorragia subaracnóidea traumática (HSAT) contralateral em região occipital esquerda (C). HSAT temporal direito (D) e presença de leve hemorragia extradural frontal esquerda (E).

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DISCUSSÃO
O traumatismo crânio encefálico (TCE) é um dos principais traumas que causam morbimortalidade no Brasil, e chega a ser considerado, por alguns autores, como problema de saúde pública, uma vez que afeta principalmente a população na faixa etária economicamente ativa (1) podendo deixar sequelas graves e incapacitantes ou até mesmo levar ao óbito.
            Compreende-se por TCE qualquer lesão que comprometa danos físicos ou funcionais ao couro cabeludo, ao crânio, as meninges ou ao encéfalo. Ao sofrer o trauma, o crânio e o seu conteúdo são submetidos a duas forças principais: a causada pelo golpe e a causada pelo contragolpe. Esta última é oriunda do efeito de inércia onde o encéfalo colide com o crânio no ponto diametralmente oposto ao local do golpe. Há ainda outros dois mecanismos que podem causar lesões a estrutura nervosa central: o que ocorre por impacto interno entre as estruturas intracranianas e o shearing que decorre do rompimento de fibras nervosas e vasos causados pela aceleração ou pela desaceleração das estruturas internas.
            Na abordagem de um paciente com TCE, é importante a descrição do evento que gerou o trauma, o que pode indicar para o médico o mecanismo de lesão neurológica que o paciente sofreu. Além disso também é necessário averiguar se o trauma esteve associado ao uso de drogas, medicamentos, ou a episódios de síncopes e vertigens. Durante o atendimento inicial deve-se priorizar a estabilização hemodinâmica e respiratória do paciente.
            Devido a história clínica do paciente apresentado neste caso clínico, podemos inferir que a lesão foi devida ao mecanismo de contragolpe, uma vez que o contato da queda foi na região frontal esquerda e o sintoma acarretado pela lesão (parestesia em membros superior e inferior), foi apresentado de forma homolateral. Então, se houve uma lesão no sistema nervoso central superior, essa lesão ocorreu contra-lateral ao dimidio sintomático, ou seja, ao lado direito.
            O exame neurológico deve ser feito cuidadosamente, para que oriente a correta topografia da lesão, além de avaliar o estado geral, neurológico e o nível de consciência do paciente, possibilitando assim uma conduta assertiva.
Uma ferramenta essencial para avaliar o nível de consciência de um indivíduo que sofreu TCE, é a Escala de Coma de Glasgow, onde serão avaliados a sua resposta motora, verbal e ocular, podendo o paciente pontuar de 3 a 15. Essa escala pode orientar a tomada de determinadas condutas e ainda permite a avaliação da gravidade do TCE: de 13 a 15 pontos o trauma é considerado como leve; de 9 a 12 como moderado; de 6 a 8 como severo e de 3 a 5, muito severo, sendo que a pontuação 3 é um indício de morte cerebral.
Outros aspectos importantes, é a avaliação das pupilas, da motricidade dos olhos e do padrão da respiração praticada pelo paciente (quando espontânea).
O grau de gravidade do paciente relatado no caso, portanto, é moderado, uma vez que marcou 11 pontos na escala de Glasgow, apresentando uma resposta motora, conseguindo obedecer a comandos, abrindo os olhos apenas a comando e apresentando uma resposta verbal reproduzindo sons incompreensíveis.
Os exames de imagem evidenciaram uma hiperdensidade intraparenquimatosa parietal direita causada possivelmente por uma hemorragia decorrente do trauma. A localidade da lesão (lobo parietal direito) é compatível com a disfasia do paciente e a ausência do desvio da linha média é um sinal que ameniza um pouco a gravidade do quadro.
 
REFERÊNCIAS:

  • NITRINI, Ricardo; BACHESCHI, Luiz Alberto. A neurologia que todo médico deve saber. Atheneu, 2003.
  • DE GOUVEIA, Paula Adriana Rodrigues et al. Reabilitação neuropsicológica em fase aguda e crônica após Traumatismo Crânio-Encefálico (TCE) grave: relato de caso. Contextos Clínicos, v. 2, n. 1, p. 18-26, 2009.
  • ANDRADE, Almir Ferreira de et al. Mecanismos de lesão cerebral no traumatismo cranioencefálico. Revista da Associação Médica Brasileira, v. 55, n. 1, p. 75-81, 2009.
     
   

Por Sanar

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