O Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP) autuou o laboratório da Universidade de São Paulo (USP), no campus de São Carlos (SP), pela ausência de farmacêuticos no local onde é produzida a fosfoetanolamina sintética.
O conselho registrou também precárias condições sanitárias para a produção do composto. A universidade está obrigada pela Justiça a produzir a substância. A fosfoetanolamina sintética tem sido utilizada por algumas pessoas como medicamento contra o câncer, mesmo sem ter sido comprovada a eficácia do composto.
“O produto é feito em condições precárias, sem nenhum controle e sem garantia de que o produto é feito adequadamente, com qualidade. Não tem nenhuma condição, não tem responsável técnico, não tem farmacêutico, nem na produção, nem na dispensação [distribuição]. O medicamento é manipulado em um local inapropriado”, disse o presidente do CRF-SP, Pedro Eduardo Menegasso.
“Medicamento só pode ser manipulado em farmácia, então, é um negócio absurdo. Não tem a mínima condição de se produzir qualquer produto para consumo humano em um lugar daquele. Pior, a suposta fórmula fica guardada a sete chaves, na mão de um técnico, e esse técnico atende às pessoas e avalia a dose. Isso não existe, nem um pajé faz isso”, disse.
Segundo o CRF, a USP terá até a próxima quinta-feira (5/11) para adequar o laboratório à produção da substância. Caso as modificações não sejam feitas, a universidade poderá ser multada. O conselho não tem o poder para fechar o laboratório. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que pode lacrar o local de produção, foi notificada pelo CRF.
“Diante do clamor público, o governo poderia liderar um esforço concentrado para fazer as pesquisas mínimas de segurança e liberar, com isso, a utilização da substância em casos específicos. Da forma como está, a população está exposta a riscos”, disse o CRF em nota.
Procurada pela reportagem da Agência Brasil, a USP não se manifestou até o fechamento desta reportagem. Em sua última nota sobre o assunto, a instituição disse que a substância não é remédio, foi estudada como um produto químico e não existe demonstração de que tenha ação efetiva contra a doença. A universidade informou que não desenvolveu estudos sobre a ação do produto nos seres vivos, muito menos estudos clínicos controlados em humanos.
“A USP não é uma indústria química ou farmacêutica. Não tem condições de produzir a substância em larga escala, para atender às centenas de liminares judiciais que recebeu nas últimas semanas. Mais ainda, a produção da substância em pauta, por ser artesanal, não atende aos requisitos nacionais e internacionais para a fabricação de medicamentos”.
Ordem da Justiça
De acordo com a universidade, que distribui a droga por força de uma decisão judicial, a substância fosfoetanolamina foi estudada de forma independente pelo professor Gilberto Orivaldo Chierice, que não é mais ligado ao Grupo de Química Analítica e Tecnologia de Polímeros. Hoje, Gilberto está aposentado. “Esses estudos independentes envolveram a metodologia de síntese da substância e contaram com a participação de outras pessoas, inclusive pessoas que não têm vínculo com a Universidade de São Paulo”, diz a nota.
“O Instituto de Química [da USP] de São Carlos lamenta quaisquer inconvenientes causados às pessoas que pretendiam fazer uso da fosfoetanolamina com finalidade medicamentosa. Porém, o instituto não pode se abster do cumprimento da legislação brasileira e de cuidar para que os frutos das pesquisas aqui realizadas cheguem à sociedade na forma de produtos comprovadamente seguros e eficazes”, disse na nota.
Decisão do desembargador José Renato Nalini, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, liberou, em 9 de outubro, a entrega da substância produzida no Instituto de Química de São Carlos para os pacientes que solicitaram judicialmente acesso à droga. A substância não tem registro na Anvisa.
Denúncia na OMS
O deputado estadual Rafael Silva (PDT) defende a produção e distribuição da fosfoetanolamina. Segundo o parlamentar, há previsão legal para uso da droga com base no Artigo 24 da Lei Federal 10.742 de 2003, que isenta de registro “os medicamentos novos, destinados exclusivamente a uso experimental, sob controle médico, podendo, inclusive, ser importados mediante expressa autorização do Ministério da Saúde”.
Para tentar garantir o acesso à droga, o deputado vai acionar órgãos públicos e organismos internacionais. Ele pretende encaminhar uma denúncia à Organização Mundial da Saúde e protocolar uma representação na Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo. Na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, Silva apresentou um pedido de abertura de comissão parlamentar de inquérito.
Na opinião do deputado, os resultados preliminares com o uso da substância justificam o esforço. “Quando nós falamos nesse medicamento, nós não excluímos outros tratamentos. Mas já ficou provado que muitas pessoas que tinham outros tipos de tratamento e não progrediam, com esse composto elas melhoraram”. As informações são da Agência Brasil.
Fonte: ConJur