ARS MEDICINA
Palavra que derivada do latim ars medicinas, significa a arte da cura. Misto de ciência, técnica, prática, que tanto despertou interesse da população ao longo dos tempos.
Hipócrates, na Grécia antiga, ainda antes de cristo, já tentava explicar os males da humanidade que segundo ele vinham do desequilíbrio entre os quatro fluidos do corpo: bílis amarela, bílis negra, a fleugma e o sangue. E tanto tempo se passou desde então… E a medicina foi além. Na Itália em 1543, um médico chamado Andrea Vesalius, conhecido pela habilidade de desenhar, e pelo hábito “sinistro” de roubar cadáveres, publica o livro De humanis copore fabrica que inaugura a anatomia moderna, decifrando alguns dos segredos do interior do corpo humano. Mas não bastava conhecer as peças do quebra cabeça, e sim como elas funcionavam. Então o Sir. William Harvey, vinte anos mais tarde, médico inglês, inspirado pelos estudos de Andrea, descreve com perfeição:
“As artérias e as veias são canos que carregavam nutrientes pelo corpo. E o coração é o centro de toda energia vital.” Mas se por um lado já se entendia o funcionamento das engrenagens complexas do corpo, nada ainda podia ser feito contra simples infecções. Mas a medicina foi além. No início do século XX, um sujeito incomum muda o curso dessa “arte da cura”.
Astuto, Alexander Fleming na desorganização do seu laboratório em Londres, notou que algumas das sua culturas de bactéria não estavam crescendo, e um certo tipo de fungo ocupava o lugar. Logo pensou: porque não usar o estrato desse fungo para matar as bactérias? Assim estava descoberta a penicilina e inaugurada a era dos antibióticos.
Mas a medicina precisava de muito mais: Precisava da insulina para tirar dos diabéticos a sentença de morte; Precisava da morfina para diminuir o sofrimento; Precisava dos contraceptivos para dar as mulheres o poder da escolha; Precisava desvendar os segredos do DNA, do que realmente somos feitos; Precisava combater os vilões do coração como o colesterol e a hipertensão; Precisava dos raios-x, para enxergar o corpo através da pele. É como disse Confúcio: Nada como “Pensar o passado, para compreender o presente e preparar o futuro”. Qual futuro…? A cura da AIDS, do câncer, o uso de órgãos artificiais, a terapia gênica. Quanta coisa está por vir…
É deste universo fascinante que estamos falando. É desse universo fascinante que hoje fazemos parte. De um exército de homens e mulheres que se dedicam: a aliviar o sofrimento, a confortar, a ouvir, a cuidar.
Mas será isso mesmo? Será que num passe de mágica nos tornamos médicos? Na verdade esta história começa muito antes… Para vencer a etapa do vestibular tão concorrido começamos a cultivar certas virtudes tão necessárias ao exercício da medicina. A resignação, o empenho, a dedicação, a responsabilidade, passavam a ser companheiros diários. Disse o próprio Einstein: “Deus não joga dados”. Algo parecia dizer: Conseguiríamos. E na cabeça destes então neófitos, inexperientes perante a vida, muitos vivendo longe da família, neste momento, o desejo de ser médico, era o sentimento comum. E a vovó na sua inocência já pedia para aferir a pressão, os vizinhos já pediam para receitar algum comprimido para febre, os amigos, a estes interessavam-se em saber se a cerveja fazia mal junto com o antibiótico. Parecia que de repente não havia um limite, já havíamos sido tocados pela mágica da medicina.
Há e o caminho foi longo, não foi fácil. Tivemos apostilas pela sala e fotocopias do caderno da colega mais aplicada. Tivemos olheiras ao acordar às cinco horas da manhã para fazer a famosa revisão antes daquela prova. Tivemos a paixão pela garrafa de café, a falta de tempo, o contato com a morte, a insegurança com os primeiros pacientes. Tivemos a corrida por boas notas, atividades extras, pesquisa, plantões. E se no o cansaço do dia – a – dia nos fez fraquejar? Pensamos em jogar a toalha. É isso mesmo? Tenho que enfrentar tudo isso? Disse o Sir Winston Churchill: “Enquanto um pessimista vê a dificuldade em cada oportunidade; um otimista vê uma oportunidade em cada dificuldade.” Não bastava ter vontade de caminhar,a pé não chegaríamos, mas o nosso sonho tinha um motor de possante. Calibrado com a vontade de vencer, de ir em frente, sem paradas, nessa jornada. Abastecidos de combustíveis nobres: O amor dos nossos pais, o apoio dos mestres, o sorriso dos enfermos, o milagre da recuperação, o fascínio pelo corpo humano em sua complexidade, o milagre do nascimento o milagre da vida. O bem educado: “Obrigado Doutor” do paciente do ambulatório, as peripécias dos guris da pediatria, o primeiro parto, o balé perfeito da cirurgia bem sucedida, e foram tantas as recompensas que já não precisávamos de mais nada, estávamos convencidos. Era isso que fazia a medicina tão desafiadora. Afinal se apoia na ciência e faz do conhecimento uma ferramenta essencial, porém sem deixar de ser arte, ao lidar com pessoas em sua complexidade e diversidade. Então caros colegas, hoje, relembramos a opção por uma vida na qual com certeza abdicamos de um dia-a-dia comum. Assumimos novas responsabilidades perante aos que sofrem, com o compromisso de estar em contato vitalício com o aprendizado, com a promessa de aliviar a dor dos que padecem. Vestimos o jaleco branco que nos empossa de um poder tão forte quanto à responsabilidade neste depositada. Para lidar com o maior patrimônio que cada ser humano pode ter: A saúde.
Sobretudo também é um dia de reflexão. Já que essa medicina, que abrevia sofrimentos, que salva, que cura, está doente. Sofremos com o mal da desvalorização, já que reféns dos planos de saúde com seus valores aviltantes. Sofremos do mal das más condições de trabalho, na qual os profissionais se tornam bode expiatório, de um estado que pouco se preocupa com a qualidade da assistência. Sofremos com a multiplicação descontrolada das escolas de médicas, com qualidade de formação cada vez mais duvidosa. Mas nada disso é motivo para desanimar, afinal aprendemos ao longo dos anos que todo mal tem um tratamento. Não abriremos mão da nossa dignidade. Ainda que sempre prontos a ajudar os que padecem, não seremos vítimas da tirania dos interesses políticos que sangra a nossa classe. Formaremos sim, um exército maior, em torno da valorização destes profissionais, que cuidam da saúde do nosso país, soldados do front em prol de uma medicina pública de qualidade, de uma remuneração médica digna, de tempos melhores e áureos para aqueles que decidem por cuidar daqueles que precisam.
Assim nos tornaremos mais médicos a cada dia, como se o senhor tempo nos presenteasse com a confiança, a experiência, o conhecimento e a sabedoria necessárias. Sem ferir a ética, a moral, hoje, com convicção, asseguramos manter vivas as promessas, desafiar as expectativas, sendo guardiões da ARS MEDICINA, ainda que recheada da frieza sábia da ciência, será sempre a arte da cura!
Parabéns a todos nós!
Feliz dia 18 de outubro, dia dos médicos.
Dr. Caio Nunes é médico pela Universidade Federal da Bahia e fez residência em Radiologia no Instituto de Radiologia da Universidade de São Paulo. Além disso serviu ao exército no Hospital Geral de Salvador. Vem se dedicando ao estudo do mercado médico e aos aspectos relacionados à escolha da residência e do planejamento da carreira. O resultado disso é seu livro “Como escolher a sua Residência Médica”